Agência France-Presse
postado em 10/11/2014 14:47
Paris - Em uma operação digna de roteiro de cinema, um robô científico pousará em um cometa na próxima quarta-feira (12/11), um feito inédito na história da corrida espacial, depois de mais de dez anos de viagem interplanetária a 450 milhões de quilômetros da Terra.
Se tudo sair conforme o previsto, o módulo de exploração Philae vai se separar da sonda espacial Rosetta e pousará no cometa 67P/Churyumov-Geramisenko. Desde 6 de agosto passado, a sonda não tripulada Rosetta se desloca a poucos quilômetros do corpo celeste, acompanhando-o em seu deslocamento à medida que se aproxima do Sol.
O módulo Philae permitirá explorar diretamente o núcleo do cometa, ou seja, a parte sólida que, pelo efeito da radiação solar, gera a "coma" ou cabeleira e deixa uma cauda visível de gases e poeira. O cometa se encontra atualmente viajando entre as órbitas de Júpiter e Marte. Tem quatro quilômetros de diâmetro, formato irregular, semelhante ao de um patinho de borracha.
Por causa de seu tamanho reduzido, o cometa só gera força gravitacional e, por isso, bastará um leve impulso mecânico a partir da sonda Rosetta para iniciar a operação de aproximação de Philae: sete horas de lenta queda livre, que chegará à velocidade de um metro por segundo no momento do impacto.
A descida começará às 08H35 GMT (06H35 de Brasília) de 12 de novembro e espera-se que por volta das 16H00 GMT (14H00 de Brasília) do mesmo dia se obtenham as primeiras informações do contato com o cometa.
Na velocidade da luz, os dados enviados à Terra mediante sinal de rádio levarão 28 minutos e 20 segundos para chegar ao centro de operações da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês) em Darmstadt, Alemanha.
Possíveis surpresas
Repleto de instrumentos de observação, o Philae carece de um sistema de deslocamento autônomo, tem tamanho similar ao de uma geladeira e pesa uns 100 quilos.
A superfície do cometa é coberta de poeira, sua temperatura é de 70; C negativos e nada garante que não ocorram imprevistos. Desconhece-se o que o robô vai encontrar exatamente e se a superfície do cometa será macia como as cinzas ou dura como a rocha ou o gelo.
O local na superfície do corpo celeste escolhido para pousar o módulo foi denominado Agilkia, um nome que faz alusão ao Egito antigo, assim como Philae, que remete à ilha do Nilo onde foram encontrados os hieróglifos que permitiram decifrar a pedra Rosetta.
Trata-se de uma zona não isenta de armadilhas, com centenas de rochas de 50 cm a 50 metros de diâmetro e declives superiores a 30;, razão pela qual o módulo tem 18% de probabilidades de acabar caindo em um local impróprio. Os instrumentos de observação de Philae começarão a operar durante a descida e o robô enviará imagens da missão antes mesmo de pousar.
À distância, a sonda Rosetta vigiará o comportamento de seu módulo de exploração e terá a capacidade de corrigir sutilmente a posição de queda. Para não quicar na superfície do cometa, Philae foi equipado com um sistema de arpões nas pernas, destinado a garantir seu amarre imediato. Mas nada garante que não acabe se afundando em uma superfície que se revele mole demais.
Semeando vida entre os planetas
O encontro espacial ocorrerá após uma odisseia de mais de uma década e 6,4 bilhões de quilômetros de percurso interplanetário, que custou 1,3 bilhão de euros. A jornada, iniciada em março de 2004, começou com a sonda sobrevoando várias vezes Marte e a Terra para pegar impulso, usando a força gravitacional dos planetas e, desta forma, ganhar velocidade.
Em seguida, passou por um período de hibernação, que lhe permitiu poupar energia, antes de ser "despertada" novamente da Terra, ao se aproximar de seu objetivo. Os cometas são aglomerados de poeira e gelo primordiais, escombros do processo de formação do Sistema Solar, ocorrido há 4,6 bilhões de anos.
Por isso, Philae tentará analisar diretamente com seus instrumentos esta "bola de neve suja" e decifrar as chaves para compreender como os planetas se formaram ao redor do Sol.
Uma das teorias, conhecida como a hipótese da "panspermia", é que os cometas, ao interagir com a Terra, ajudaram a semear a vida no nosso planeta, ao trazer para cá água e moléculas orgânicas.
Se tudo correr bem, Rosetta e seu robô continuarão enviando informações quando o cometa estiver no ponto de sua trajetória mais próxima do sol, em agosto de 2015. Depois disto, se prevê que, sob os efeitos da poeira e das projeções, deixe de perscrutar os segredos do corpo celeste e se dê por concluída a missão.