Agência France-Presse
postado em 25/11/2014 11:55
Estrasburgo - O papa Francisco comparou nesta terça-feira (25/11) o Parlamento Europeu "a uma avó" enfraquecida, instando-a a tornar-se uma "referência para a humanidade" e acolher e ajudar os imigrantes que chegam às suas margens. "A uma União mais extensa, mais influente, parece (...) se somar à imagem de uma Europa um pouco envelhecida e comprimida, que tende a sentir-se menos protagonista", considerou.A impressão geral transmitida pelo Velho Continente é "a de uma avó, uma Europa que já não é fértil nem viva", enquanto o mundo se tornou "cada vez menos eurocêntrico", estimou o primeiro papa não-europeu ao falar sobre as instituições europeias em um longo discurso de tom muito pessoal e bastante crítico. "Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa assustada e dobrada sobre si mesma, para que seja um ponto de referência importante para toda a humanidade", ressaltou.
Francisco renovou o apelo feito em julho de 2013 na ilha italiana de Lampedusa: "Não podemos tolerar o fato de o Mediterrâneo estar se tornando um grande cemitério! Nos barcos que chegam diariamente às costas europeias, há homens e mulheres que precisam de acolhimento e ajuda".
Segundo o pontífice, a Europa deve implementar "leis que, ao mesmo tempo, protejam os direitos dos cidadãos europeus e garantam o acolhimento dos migrantes". Puramente institucional, esta visita de quatro horas, a mais curta de um papa ao exterior, não prevê nenhum encontro com católicos, para a decepção dos fiéis confinados atrás de uma tela gigante montada na catedral de Estrasburgo. Para compensar esta decepção, o Vaticano prometeu uma visita a França em 2015.
[SAIBAMAIS]Os fiéis aplaudiram quando viram no telão o papa aterrissar em Estrasburgo, pouco antes das 10h (7h de Brasília). Ele foi recebido em nome do governo francês pela ministra da Ecologia, Ségol;ne Royal, a número três do governo. Enquanto era recebido no Parlamento Europeu ao som dos hinos do Vaticano e europeu, os sinos soaram por toda a cidade de Estrasburgo. Em um breve momento de emoção, o papa recebeu uma senhora alemã de 97 anos que o hospedou em 1985, quando ele aprendia alemão.
Aborto e eutanásia
"Grandes ideias que uma vez inspiraram a Europa parecem ter perdido seu apelo para serem substituídas por técnicas burocráticas", criticou Francisco em seu discurso enérgico aos deputados. "O cristianismo não é uma ameaça para o caráter laico do Estado ou a independência das instituições da Europa, mas sim um enriquecimento", insistiu ele, enquanto alguns deputados protestaram contra sua visita em nome do secularismo.
O papa criticou especialmente o individualismo e o consumismo, a falta de solidariedade, a burocracia, que reduzem os homens e mulheres "a meros parafusos de uma engrenagem que os trata como bens de consumo". Em uma condenação indireta do aborto e da eutanásia, ele citou "o caso dos doentes terminais, os idosos que são abandonados e deixados sem cuidados, as crianças que são mortas no ventre da mãe".
Após seu discurso aos parlamentares dos 28 países da UE, o papa atravessou o rio para entrar no Conselho da Europa, uma organização intergovernamental que representa 47 Estados. Acompanhados por um violão, alguns fiéis cantaram músicas cristãs, bloqueados atrás das barreiras de segurança do Conselho da Europa.
O último papa a ter visitado as duas assembleias foi João Paulo II em 1988, quando a Europa ainda estava dividida ao meio pela Cortina de Ferro. Diante do Conselho da Europa, o papa chamou os europeus a "não cair nas tentações passadas", ao citar os extremismos e as tensões persistentes no continente. "Quanta dor e quantos mortos neste continente que aspira à paz, mas que mais uma vez volta a cair nas tentações do passado", declarou o Sumo pontífice.
O papa também criticou as "outras formas de conflito, tais como o terrorismo religioso e internacional que alimenta um profundo desrespeito à vida humana e mata sem discernimento vítimas inocentes", incentivado por um "tráfico de armas realizado em total tranquilidade".
A visita relâmpago de Francisco acontece em um momento de tensão na Europa: o desemprego, a imigração, debates sociais e a ameaça de uma nova Guerra Fria com o conflito na Ucrânia. No centenário do aniversário da Grande Guerra, e quase 70 anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, o papa Francisco também deve recorrer a Moscou para pedir pela Ucrânia.