Agência France-Presse
postado em 08/01/2015 17:58
Bruxelas - Os dois homens procurados na França pelo ataque ao semanário satírico "Charlie Hebdo" estavam há tempos sendo observados pela Inteligência francesa, mas isso não impediu que passassem à ação. Segundo especialistas, é quase impossível manter uma vigilância policial permanente. A busca dos irmãos Cherif e Said Kouachi, suspeitos de terem cometido o atentado, intensificou-se nesta quinta-feira.O mais novo, Cherif, de 32 anos, é um velho conhecido dos serviços antiterroristas franceses. Esteve envolvido no envio de combatentes ao Iraque em 2005, foi julgado e condenado. Também foi considerado suspeito de envolvimento na tentativa de fuga de uma figura do Islã radical, mas terminou absolvido nesse caso.
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"Mas não é porque alguém está fichado, localizado, que tem uma vigilância permanente", disse Eric Dénécé, diretor do Centre Français de Recherche sur le Reinseignement (CF2R, Centro Francês de Pesquisa sobre Inteligência). "Chega um momento em que a vigilância é suspensa, sobretudo se o vigiado é esperto o suficiente para se manter correto o tempo todo. São os inevitáveis buracos das redes", acrescentou.
Nesta quinta-feira de manhã, o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, disse que "os indivíduos estavam sendo, sem dúvida, vigiados, mas não há um risco zero" frente à possibilidade de atentado.
O ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, confirmou que "os indivíduos estiveram sob vigilância", mas que não eram alvo de um procedimento judicial, porque "não havia elementos sobre eles que sugerissem a iminência de um atentado".
Uma fonte policial disse nesta quinta que os dois irmãos não estavam efetivamente sob vigilância, embora Cherif tenha sido fichado pela Inteligência francesa como uma possível ameaça à segurança e aos interesses fundamentais da nação - o que, acrescentou a fonte, "é lógico, dado seu passado".
Ainda segundo a fonte policial, Cherif não fez qualquer "viagem recente" ao exterior.
Falta de recursos
Desde os anos 1980, a França está exposta à ameaça terrorista tradicional. Há alguns meses, porém, a ameaça aumentou com o retorno, ao território francês, de centenas de aspirantes a combatentes que passaram pelo Iraque, ou pela Síria. Isso multiplica a quantidade de potenciais suspeitos e pode complicar o trabalho dos investigadores, com inúmeras pistas falsas.
"Não temos, é claro, os meios para colocar todo mundo sob vigilância permanente", admitiu recentemente um dos responsáveis franceses da luta contra o terrorismo, que pediu para não ser identificado.
"Então, o que fazemos, é que organizamos listas. Os que parecem ser os mais perigosos, os que podem passar à ação, têm vigilância permanente; os outros, menos, em função dos meios. A lista evolui sem parar. Alguns saem, outros entram. A arte consiste em ter os nomes certos no lugar certo, e não é fácil", completou.
"A vigilância 24 horas de um suspeito - que, além disso, usa, com frequência, de três a quatro celulares diferentes - representa 30 policiais. Como querem que a gente faça? A única solução são as listas com prioridades", justificou.
Os projetos de atentados desmantelados recentemente, as filiais desmontadas e as redes neutralizadas provam que a França está diante de uma ameaça que pode assumir qualquer forma, constituída ao mesmo tempo por aprendizes de terroristas treinados e determinados, combatentes jihadistas aguerridos e todas as variantes possíveis entre esses perfis.
"No nosso país, o dispositivo jurídico para lutar contra essa ameaça existe e é eficaz", defendeu Eric Dénécé. "Para vigiar tudo, seria preciso analisar o aumento em massa do efetivo policial, o que colocaria um problema democrático (...) e, de qualquer modo, não seria eficaz. Os investigadores não dariam conta. Estamos diante de uma ameaça assimétrica no sentido próprio do termo", explicou.