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Morre promotor do histórico julgamento dos chefes da ditadura argentina

Strassera foi o acusador no julgamento pelos crimes, torturas e desaparecimentos na ditadura aberto por um decreto do ex-presidente Raúl Alfonsín, um dos primeiros atos de seu governo quando assumiu, em 1983

Agência France-Presse
postado em 27/02/2015 13:34
Buenos Aires - Julio César Strassera, o promotor do histórico julgamento de 1985 dos comandantes da última ditadura argentina (1976-1983) que condenou à prisão perpétua os ex-líderes Jorge Videla e Emilio Massera, entre outros, morreu nesta sexta-feira aos 81 anos vítima de uma doença respiratória.

Em um julgamento que foi comparado com as sentenças dos chefes nazistas depois da II Guerra Mundial, Strassera conseguiu com sua acusação levar à prisão Videla, Massera, o brigadeiro Orlando Agosti e o general Roberto Viola. Outros cinco acusados foram absolvidos neste primeiro caso.


"Senhores juízes, nunca mais", declarou o fiscal no fim de sua histórica argumentação em um julgamento oral realizado durante a retomada da democracia, em meio à fragilidade das instituições e quando a sociedade ainda estava abalada pelo medo de represálias.

O julgamento foi aberto por um decreto do falecido ex-presidente Raúl Alfonsín, um de seus primeiros atos de governo quando assumiu, em 1983.

Strassera sofria uma insuficiência respiratória aguda que o levou a ser hospitalizado há três semanas na clínica San Camilo da capital, onde sua morte foi registrada nesta sexta-feira, confirmou à AFP o chefe da unidade de terapia intensiva, Mario Kenar.


"Senhores juízes, nunca mais"

Sua frase "Nunca mais" foi cunhada pelo falecido escritor Sabato no relatório, convertido posteriormente em livro, que recolheu os testemunhos de sobreviventes dos crimes da ditadura que deixou 30.000 desaparecidos, segundo organismos humanitários.

Videla morreu em uma prisão comum em 2013, depois de ter sido novamente condenado pelo roubo de bebês e troca de suas identidades, entre outras acusações por crimes contra a humanidade.

"Foi um julgamento que nunca teríamos imaginado quando vivíamos a ditadura", disse Nora Cortiñas, integrante da organização humanitária Mães da Praça de Maio, lembrando que elas foram proibidas de presenciar o processo com seus emblemáticos lenços brancos na cabeça, símbolo da luta pela busca de seus filhos desaparecidos.

Cortiñas lamentou que o caminho para condenar os culpados pelos crimes da ditadura "tenha terminado frustrado por uma claudicação de Alfonsín com as posteriores leis de anistia" que encerraram os processos até 2005, quando a Suprema Corte de Justiça as declarou nulas e permitiu a reabertura de dezenas de julgamentos, muitos ainda em andamento.

"Vimos que havia vontade de punição aos genocidas, aos responsáveis pelo horror total, do roubo de crianças", disse a líder humanitária.


Testemunhos do horror


León Arslanián, ex-juiz integrante do tribunal no julgamento às juntas militares, destacou o "papel magistral que Strassera teve como acusador".

"Sua morte causa angústia em todos os que viram a importância desta etapa fundacional para o país", disse o canal TN.Arslanian lembrou que o processo de 1985 foi realizado em uma etapa "nada havia sido feito, o poder militar estava intacto e havia um temor social muito forte de que a revisão do passado trouxesse consequências".

"Foi um ;Nunca mais; aos crimes chocantes do Estado, mas também um nunca mais ao golpe na Argentina. Esse é o grande legado de Strassera", concluiu.

Ricardo Gil Lavedra, outro dos juízes que integrou o tribunal e assinou a sentença, disse que o promotor encarnou "o símbolo da justiça no retorno à democracia".

Gil Lavedra lembrou que Strassera "forneceu as provas para acreditar os fatos e conduziu as audiências orais e públicas que mostraram o horror com a revelação das ações macabras que (o regime militar) praticava para submeter a população" na ditadura.

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