A presidente Dilma Rousseff discursou neste sábado na sessão plenária da Cúpula das Américas, realizada na Cidade do Panamá, onde elogiou a iniciativa de Estados Unidos e Cuba de buscar a reaproximação e o abandono de "preconceitos e nocivos antagonismos".
A seguir, a íntegra do discurso:
"Excelentíssimo sr. Juan Carlos Varela, presidente do Panamá; excelentíssimos srs. e sras. chefes de Estado e de governo presentes a esta VII Cúpula das Américas; sr. Miguel Insulza, secretário-geral da Organização de Estados Americanos, srs. e sras. jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas.
Agradeço ao Povo e ao Governo do Panamá, na pessoa do Presidente Juan Carlos Varela, a calorosa acolhida e a eficiente organização desta VII Cúpula das Américas.
Panamá ; ;ponte do mundo; ; é hoje o lugar de reencontro das Américas.
Celebramos, aqui e agora, a iniciativa corajosa dos Presidentes Raúl Castro e Barack Obama de restabelecer relações entre Cuba e Estados Unidos, pondo fim a este último vestígio da Guerra Fria na região que tantos prejuízos nos trouxe.
Saúdo, igualmente, Sua Santidade, o Papa Francisco, pela contribuição dada para que essa aproximação se realizasse.
Com o aplauso de todos os líderes presentes neste encontro, os dois Presidentes deram uma prova do quanto se pode avançar quando aceitamos os ensinamentos da História e deixamos de lado preconceitos e antagonismos, que tanto afetaram nossas sociedades.
Estamos seguros que outros passos serão dados, como o fim do embargo ; que, há mais de cinco décadas, vitima o povo cubano e enfraquece o sistema interamericano. Aí, sim, continuaremos construindo as linhas que pautarão nosso futuro e estaremos sendo contemporâneos de nosso presente.
Amigas e amigos, inúmeras oportunidades nascem desse novo ambiente, razão pela qual saúdo o tema escolhido pelo Panamá para esta Cúpula.
A prosperidade, a equidade e a cooperação, juntas com a inclusão social e a democracia, são caros a todos nós e representam tudo pelo que nós lutamos nos últimos anos e décadas. Refletem o espírito que deve presidir essa nova etapa das relações hemisféricas.
Desde a Cúpula de Miami, nossos avanços econômicos, sociais e políticos nesta região foram notáveis.
Em 1994, enfrentávamos problemas crônicos como a fome, a miséria, o desemprego, causados, em grande medida, por visões e políticas equivocadas que agravavam a exclusão social.
Recém-saídos de regimes autoritários, recebemos um legado de endividamento, concentração de renda e baixo desenvolvimento.
Hoje, estamos reunidos em um contexto diferente.
A consolidação da democracia e novos paradigmas políticos em cada um dos nossos países inverteram a lógica da ação do Estado, conferindo prioridade ao desenvolvimento sustentável com justiça social.
A América Latina e o Caribe têm agora menos pobreza, menos fome, menos mortalidade infantil e materna, menos analfabetismo. Mas sabemos que é preciso mais riqueza, mais dignidade, mais segurança, mais educação, e assim é o que construiremos nos próximos anos. Sem dúvida, aumentamos a expectativa de vida, o índice de desenvolvimento humano e o PIB per cápita. Mas, diante de nós, ainda resta um longo caminho e muitos desafios.
Também temos mais comércio, mais investimentos, mais turismo. Em vários países, como no meu, erradicamos a fome, objetivo que parecia inatingível.
Essas conquistas sociais são uma demonstração do vigor democrático e da capacidade de mobilização de nossas sociedades, da nossa capacidade de organização em fóruns como o Mercosul, a Aliança do Pacífico, a Unasul e a Celac.
A afirmação da democracia ; em seu sentido mais completo, com participação social ; é um patrimônio de grande valor em nossa região. É preciso preservar, ampliar e desenvolver essas conquistas.
Não podemos também fechar os olhos para a persistência de desigualdades, que ainda afetam, em diferentes graus, a todos os países do hemisfério.
Esse fenômeno não passa despercebido a uma sociedade que nós ajudamos a criar e que é cada vez mais esclarecida, mais exigente e mais crítica.
A concentração de renda e de riqueza ainda ameaça a coesão social e o desenvolvimento de nossas economias.
Essa disparidade é ainda maior quando analisada sob o prisma de gênero e raça, em especial no acesso à educação, à renda e ao poder.
Combater a desigualdade em todas as suas manifestações, no espírito da cooperação, é algo importante em todos os fóruns e agora, como o lema desta VII Cúpula, é o grande desafio das Américas e do mundo no século XXI.
Esse combate, aqui na nossa América, demonstra também a necessidade de um crescimento econômico contínuo de nossos países, capaz de assegurar a sustentabilidade da inclusão social.
Esse combate deve estimular uma verdadeira cultura e prática da integração. A integração comercial e de cadeias produtivas é um dos mecanismos capazes de assegurar que em todos os momentos e, em especial diante de problemas ou crises, possamos sustentar, sim, o desenvolvimento.
Nosso hemisfério foi capaz de construir arranjos de integração diversos, concretos e complementares, que ampliaram o diálogo político, o intercâmbio comercial, a realização de investimentos e a integração de cadeias produtivas. Nos aproximaram política, cultural, econômica e socialmente.
Já não se pode pensar em temas como comércio, saúde e combate às drogas de maneira local. Já não se pode pensar em democracia, em promoção dos direitos humanos e em políticas baseadas na nossa capacidade de sustentar a inclusão por meio da educação com base em modelos únicos.
Mas temos de ter metas únicas. Os modelos podem ser diversos, mas as melhores práticas devem ser por nós adotadas.
Presidentes e Presidentas, chefes de Estado e de governo,
Há tempos, celebramos o fato de que, do Alasca à Terra do Fogo, nossos países vivem em paz uns com os outros.
Esperamos comemorar, em breve, o fim do mais longo conflito interno nas Américas.
Saúdo a coragem do povo colombiano, de seus atores políticos e do Presidente Santos, demonstrada no esforço de pôr fim ao ciclo de violência que infelicitou, por décadas, seu país. A opção por uma paz negociada constitui precedente inestimável para a região e para o mundo.
Celebramos também os avanços na consolidação da paz no Haiti e afirmam
O bom momento das relações hemisféricas já não admite medidas unilaterais e políticas de isolamento, em geral e sempre contraproducentes e ineficazes.
Por isso, rechaçamos a adoção de sanções contra a Venezuela.
os nosso firme compromisso com a estabilidade democrática, o desenvolvimento e a soberania haitiana. Apoiamos a reconfiguração da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH), tal como determinada pelo Conselho de Segurança da ONU.
O bom momento das relações hemisféricas já não admite medidas unilaterais e políticas de isolamento, em geral e sempre contraproducentes e ineficazes.
Por isso, rechaçamos a adoção de sanções contra a Venezuela.
O atual quadro nesse país irmão pede moderação, pede aproximação de posições de todas as partes.
É com esse propósito que a UNASUL trabalha para acompanhar e apoiar o diálogo político entre o governo e a oposição na Venezuela, buscando contribuir para o pleno respeito, por todos, ao Estado democrático de Direito, ao direito de defesa e à Constituição do país.
Senhoras e senhores,
A cooperação facilita a busca de soluções para problemas comuns a nossos países.
Quatro temas são especialmente relevantes: a segurança, a educação, as migrações e a mudança do clima.
Assegurar o direito humano fundamental à segurança para os cidadãos das Américas continua a ser um desafio premente.
Temos de buscar uma cooperação que privilegie um enfoque abrangente e atente para as diversas causas e consequências da violência, conferindo especial atenção aos grupos mais vulneráveis ; às mulheres, aos jovens, especialmente aos negros, aos povos originários, e às pessoas discriminadas por sua orientação sexual e identidade de gênero.
O combate ao tráfico de drogas deve combinar repressão e prevenção. As pessoas que usam drogas têm direito a uma política de saúde pública integrada e multidisciplinar, baseada em evidências científicas e no respeito aos direitos humanos. Mas, o combate ao tráfico de drogas deve combinar prevenção e repressão.
Uma educação inclusiva e de qualidade, em todos os níveis, sem sombra de dúvida, é o maior desafio do nosso continente porque ela é indispensável para romper o ciclo de reprodução da desigualdade; para gerar oportunidades e inovação; para democratizar o acesso e a produção do conhecimento, sobretudo para não sermos apenas produtores de commodities e, sim, entrarmos na economia do conhecimento, baseada na educação de alta qualidade e na pesquisa científica e tecnológica, como base para inovarmos e introduzirmos esta inovação na nossa sociedade.
Por isso, a inovação combina dois dos principais desafios que a América Latina enfrenta: primeiro, dar sustebtabilidade a esse imenso esforço de retirar da miséria e elevar à classe média milhões e milhões de latino-americanos. Nós precisamos da educação para que isso não volte atrás, para que isto seja definitivo.
Ao mesmo tempo, para avançar em direção ao desenvolvimento, os nossos países têm na educação uma das maiores alavancas para que sejamos capazes, ao educar da creche, da pré-escola, à pós-graduação, com qualidade e com as melhores práticas para conseguimos, de fato, que a América Latina dê um passo adiante e se transforme.
Sim, temos riquezas. Podemos ser grandes produtores de commodities. Mas também temos homens e mulheres que serão capazes de criar um novo século de inovação baseada na pesquisa e na ciência.
O século XXI requer também um novo enfoque sobre migração, que deve ser centrada nos direitos humanos dos migrantes, ser sensível ao crescimento dos fluxos migratórios entre países em desenvolvimento; favorecer o trabalho decente; e prevenir e mitigar os efeitos de desastres socioambientais.
Sigamos no sentido oposto ao da xenofobia e da intolerância, ascendentes em diversas partes do mundo. Temos que impedir que isto se caracterize como a tendência dominante aqui na América Latina. Não podemos aceitar nem a xenofobia, nem a intolerância.
De outro lado, a agenda global de mudança do clima também requer avanços.
Com base nos debates realizados em Lima, é fundamental que a próxima Conferência das Partes, em Paris, produza um acordo ambicioso, equilibrado e legalmente vinculante, firmemente ancorado no marco da Convenção do Clima. Nossos países - e aqui eu queria emprestar (sic) nossa solidariedade à Presidenta Michelle Bachelet pelos desastres naturais que ela tem enfrentado.
E quero reiterar que os nossos países vêm enfrentando uma série de problemas, como é o fato (sic), por exemplo, do Brasil, ter enfrentado nos últimos anos a maior seca da sua História. Não na região tradicionalmente afetada pela seca, mas no sudeste do País, a região mais rica, até então jamais afetada por uma seca com as dimensões da presente.
Daí que o combate à mudança do clima, que afeta nossas economias, que afeta nossas sociedades, que atribui penalidades para as populações, exige, sim, equilíbrio entre o crescimento da economia, a diminuição da desigualdade social e a proteção ao meio ambiente.
O Brasil reafirma seu engajamento nesse tema, refletido em compromissos voluntários audaciosos. Reafirmamos e adotamos as conclusões da Conferência Rio Mais Vinte de que é possível, sim, preservar, incluir, crescer e se desenvolver.
Caros amigos e amigas,
A VII Cúpula inaugura uma nova era nas relações hemisféricas, na qual é uma exigência conviver com diferentes visões de mundo, sem receitas rígidas ou imposições.
É nossa responsabilidade fazer deste século um período de paz e de desenvolvimento para todos. Sobretudo, é nosso desafio fazer com que a régua pela qual nós nos medimos seja a régua pela qual medimos todos os demais. Não podemos achar que somos superiores ou inferiores a quem quer que seja.
O século XXI tem de resgatar a esperança que um dia marcou nossa região. Região que, como disse Eduardo Galeano: ;(se encuentra) al otro lado de la mar ; mágica mar que transfigura destinos ; la gran promesa de todos los tiempos.;
A geografia nos legou um só continente, onde vivemos juntos, separados do resto do mundo por dois oceanos. Estamos todos neste mesmo e imenso barco. Cabe a nós levá-lo a porto seguro e garantir que toda a sua população tenha uma vida digna, com todos os direitos - humanos, sociais, econômicos e, sobretudo, protegidos da discriminação de qualquer espécie.
Muito obrigada".