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Turquia celebra batalha de Galípoli à sombra do genocídio armênio

O chefe de Estado turco, Recep Tayyip Erdogan, homenageou os soldados mortos e enviou uma mensagem de paz

Agência France-Presse
postado em 24/04/2015 14:55

Soldados do Exército turco ensaiam os seus movimentos antes de um memorial que marca o 100º aniversário do início da Batalha de Gallipoli, em 24 de abril de 2015

Galípoli - A Turquia celebrou nesta sexta-feira com grande pompa o centenário da batalha de Galípoli, uma cerimônia ofuscada pela polêmica envolvendo outro centenário, o do genocídio armênio.

Vinte líderes de todo o mundo inteiro, ex-beligerantes ou vizinhos, aceitaram o convite de Ancara para honrar a memória dos soldados do Império Otomano, do Império britânico e da França que caíram durante este mortífero episódio da Primeira Guerra Mundial.

Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan,  durante as comemorações do 100º aniversário do início da Batalha de Gallipoli, em 24 de abril de 2015

O chefe de Estado turco, Recep Tayyip Erdogan, homenageou os soldados mortos e enviou uma mensagem de paz: "quero reiterar em nome de todos, ante a memória de centenas de milhares de jovens que descansam nesta pequena península, nossa determinação de assegurar a paz e a prosperidade no mundo".

"Espero que Canakkale (Dardanelos) sirva de exemplo para o mundo inteiro (...) para transformar nosso pesar comum em um instrumento de promoção da fraternidade, amor e paz", insistiu, "um remédio contra o terrorismo, o racismo, a islamofobia e o ódio".

O príncipe Charles deposita uma coroa de flores durante as comemorações do 100º aniversário do início da Batalha de Gallipoli, 24 de abril de 2015

"Devemos honrar o heroísmo dos combatentes de Galípoli de ambos os lado", declarou por sua vez o príncipe Charles, herdeiro da coroa britânica.

Autoridades islamitas-conservadoras iniciaram na quinta-feira celebrações que desejam converter em símbolo de paz e reconciliação."Todos os soldados que participaram desta batalha merecem ser lembrados com respeito e valentia", declarou o presidente turco.

"Fizemos a guerra há 100 anos, mas aqui estamos reunidos para construir a paz juntos, rejeitando a retórica do ódio", acrescentou seu primeiro-ministro, Ahmet Davutoglu.

[SAIBAMAIS]

A mensagem de paz dos dirigentes turcos foi, no entanto, ofuscada pelas críticas provocadas pela negativa em reconhecer o genocídio armênio. Muitos chefes de Estado e de governo, incluindo os presidentes russo, Vladimir Putin, e francês, François Hollande, preferiram viajar a Yerevan para prestar homenagem aos centenas de milhares de armênios massacrados pelo Império Otomano a partir de 24 de abril de 1915.

Nos últimos dias, os turcos criticaram duramente todos os que exigiram que reconhecessem, após um século de negações, o caráter planejado deste massacre.Depois do papa Francisco, o Parlamento austríaco e o presidente alemão, Joachim Gauck, foram os últimos a falar de genocídio, irritando Ancara.

Difamação

Como fez Davutoglu no início da semana, Erdogan reconheceu na quinta-feira o sofrimento dos armênios do Império Otomano entre 1915 e 1917, mas voltou a negar a existência de um genocídio, reconhecido por vinte países.

"A questão armênia se converteu em instrumento de uma campanha de difamação contra a Turquia, o que rejeitamos", afirmou, inflexível.

Após a grande cerimônia internacional e ecumênica desta sexta-feira, os antigos beligerantes de 1915 honrarão os mortos na batalha de Dardanelos em atos que durarão até sábado.

Austrália e Nova Zelândia organizarão, por exemplo, a famosa "cerimônia do amanhecer" na manhã de 25 de abril, na hora exata do desembarque das primeiras tropas aliadas nas praias turcas.

A batalha de Dardanelos começou em fevereiro de 1915 quando uma flotilha franco-britânica tentou forçar o Estreito dos Dardanelos para se apoderar de Istambul, capital de um Império otomano então aliado da Alemanha.

Seu fracasso obrigou os aliados a desembarcar em Galípoli, dando início a uma guerra de trincheiras de nove meses que deixou mais de 400.000 mortos ou feridos nos dois lados, e terminou com uma retirada humilhante.

Apesar da derrota, o heroísmo dos jovens soldados australianos e neozelandeses, que viviam seu primeiro conflito, contribuiu para formar a identidade nacional dos dois países.

"Sua perseverança, sua entrega, sua valentia e sua compaixão nos definiram como nação", declarou o chefe de governo australiano, Tony Abbott.

Por sua vez, o Império Otomano acabou a guerra no grupo dos perdedores e foi desmantelado. Mas a batalha de Galípoli se converteu em um símbolo da resistência que levou ao nascimento da moderna república turca em 1913.

A um mês das eleições legislativas turcas de 7 de junho, não há dúvida de que Erdogan tentará tocar nesta sexta-feira a fibra patriótica de seus cidadãos.

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