Agência France-Presse
postado em 31/07/2015 13:16
Tóquio, Japão - Os Estados Unidos espionaram várias autoridades japonesas, segundo revelou nesta sexta-feira (31/7) o site Wikileaks, o que coloca Tóquio em uma posição difícil num momento em que o governo conservador de Shinzo Abe tenta se aproximar de seu aliado americano. Estas informações sobre o monitoramento de um aliado muito próximo dos Estados Unidos pela Agência de Segurança Nacional americana NSA surgem após revelações similares de espionagem na Alemanha e França.O WikiLeaks publicou uma lista de "35 alvos secretos da NSA no Japão", incluindo membros do governo, líderes de empresas japonesas e do banco central, incluindo o governador Haruhiko Kuroda. O primeiro-ministro Shinzo Abe não é mencionado diretamente, mas altos funcionários do governo o são, incluindo o ministro do Comércio Yoichi Miyazawa.
A espionagem remonta ao primeiro e breve mandato de Abe, que começou em 2006, de acordo com o site. O premiê voltou ao poder em 2012. "Os documentos mostram a profundidade do monitoramento do governo japonês e o fato de que informações de muitos ministérios e departamentos governamentais foram recolhidas e analisadas", afirma WikiLeaks.
[SAIBAMAIS]Eles "mostram um conhecimento detalhado das discussões internas no Japão sobre temas tais como as importações de produtos agrícolas e disputas comerciais, as posições japonesas na rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio, projetos de desenvolvimento técnico do Japão, sua política em matéria de mudanças climáticas, energia nuclear", acrescenta o site especializado na publicação de documentos confidenciais.
Washington também recolheu informações da "correspondência de Tóquio com organizações internacionais, como a Agência Internacional de Energia (AIE), os memorandos sobre a estratégia do país em suas relações diplomáticas com os Estados Unidos e a União Europeia, bem como o conteúdo de um briefing confidencial do primeiro-ministro realizada na residência oficial de Shinzo Abe".
Estas revelações chegam em um momento embaraçoso, enquanto Abe tenta aprovar no Parlamento suas leis de defesa que tornariam possível enviar Forças de Autodefesa japonesas - o nome oficial do exército - para ajudar um aliado, principalmente os Estados Unidos. Esta reinterpretação da Constituição pacifista do país é muito contestada pela oposição e entre os japoneses que têm organizado inúmeras manifestações de magnitude rara neste país.
Acordo de livre comércio em discussão
"É um contexto de forte aproximação com o aliado americano. O governo Abe tem investido fortemente nesta relação desde que chegou ao poder", comenta Celine Pajon, pesquisadora do Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI), uma especialista em Japão. "E, ao mesmo tempo, em nível nacional, a situação é bastante delicada para Shinzo Abe (...) que tem experimentando uma contestação considerável. Esta novidade provocará, portanto, uma reação inicialmente forte", acredita Pajon. "Se isso for verdade, o Japão vai pedir explicações dos Estados Unidos, mas é pouco provável que isso tenha um grande impacto sobre as relações bilaterais", acrescenta Yoshinobu Yamamoto, professor de política internacional na Universidade de Niigata.
O Wikileaks também parece querer aproveitar o momento, em que estão sendo discutidas o Acordo de Parceria Trans-Pacífico (TPP) de livre comércio em fase de negociação entre 12 países da região Ásia-Pacífico. O TPP "é também uma questão muito sensível para a população japonesa e para muitos lobbies agrícolas e outros no Japão", afirma Celine Pajon, para quem "alguns grupos de interesse e partidos políticos da oposição vão se aproveitar desta novidade". "Veremos o governo japonês se preocupar com o que deverá dizer ou não aos Estados Unidos, a fim de evitar comprometer (...) as relações diplomáticas", comentou o fundador do Wikileaks, o australiano Julian Assange.
As autoridades japonesas ainda não reagiram nesta sexta-feira à noite às revelações.