Agência France-Presse
postado em 08/09/2015 12:29
Mais de quatro milhões de sírios fugiram da guerra, mas as ricas monarquias petrolíferas do Golfo abriram suas portas para poucos, provocando críticas e interrogações sobre a solidariedade árabe. "Os países do Golfo deveriam ter vergonha quando veem as portas da Europa abertas aos refugiados sírios, enquanto eles fecham suas portas para nós", afirma Abu Muhammad, um sírio de 30 anos refugiado na Jordânia.[SAIBAMAIS]Desde o início da "crise migratória", tais críticas reverberam nas redes sociais, com hashtags como "#Receber os refugiados é uma obrigação para o Golfo". Mesmo dentro dos países do Golfo, alguns se perguntam sobre o silêncio das autoridades. "Infelizmente, os ricos países do Golfo não emitiram qualquer declaração sobre a crise e muito menos propuseram uma estratégia para ajudar os migrantes, em sua maioria muçulmanos", escreveu recentemente um colunista do jornal catari Gulf Times.
Os seis países do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG - Arábia Saudita, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Omã, Catar) não permaneceram, contudo, inativos desde o início da guerra na Síria em 2011. Eles gastaram bilhões de dólares em ajuda humanitária para melhorar as vidas de centenas de milhares de sírios aglomerados em acampamentos instalados nos países vizinhos (Líbano, Jordânia, Turquia). Mas quando alguns desses refugiados decidem deixar os campos para tentar a sorte em outro lugar, olham primeiramente para os países ocidentais, especialmente europeus, apesar dos riscos da viagem.
Desde o início do ano, 365.000 migrantes e refugiados cruzaram o Mediterrâneo e mais de 2.700 morreram, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM). A Alemanha simboliza o El Dorado para muitos deles, enquanto os Estados do Golfo também são prósperos e estão mais próximos geograficamente, além de compartilhar valores culturais e religiosos comuns com o seu país.
Responsabilidade moral
Ante o silêncio das autoridades, um proeminente blogueiro dos Emirados, Sultan Al Qasemi, pediu às monarquias petrolíferas para lançar uma iniciativa "moral e responsável" para acolher os refugiados. Até mesmo o pai do pequeno Aylan Kurdi - o menino de três anos, cujo corpo sem vida em uma praia na Turquia comoveu o mundo inteiro - declarou no funeral de sua esposa e dois filhos: "Eu quero que os governos árabes, e não os países da Europa, vejam o que aconteceu com os meus filhos e que ajudem as pessoas".
No entanto, poucos especialistas esperam uma rápida mudança na atitude dos países do Golfo, que não assinaram a Convenção das Nações Unidas para os Refugiados. "Eu não vejo nenhum líder fazer como David Cameron, que mudou de atitude em 36 horas", explica Michael Stephens, especialista em Oriente Médio no Instituto Rusi, em referência à intenção do primeiro-ministro britânico de autorizar a entrada de 15.000 refugiados da Síria. "A grande maioria dos cidadãos do Golfo acreditam que os seus governos têm feito a coisa certa na Síria", acrescenta.
A crise em questão ocorre num momento em que os países do Golfo estão concentrados no conflito no Iêmen e na complexa operação militar que conduzem contra os rebeldes xiitas huthis.
Temores de segurança
Opostos ao presidente sírio Bashar al-Assad, alido do Irã xiita, o rival regional, os países do Golfo apoiaram, com dinheiro e armas, grupos rebeldes sunitas engajados contra o regime em Damasco.
Arábia Saudita e Catar foram acusados %u200B%u200Bde apoiar organizações extremistas jihadistas. Neste contexto, considerações de segurança são utilizadas para explicar a recusa em acolher os refugiados. "À medida que os países do Golfo estão envolvidos nos assuntos políticos da Síria, eles podem se preocupar com o que poderiam fazer aqueles que entrarem em seus territórios", explica Sultan Barakat, do Brookings Doha Center.
A Arábia Saudita tem sido alvo desde o início do ano de ataques do grupo Estado Islâmico (EI). Além disso, pequenos Estados, como os Emirados e o Catar, onde a população nativa é, em grande parte, minoritária, existe um grande medo de serem oprimidos pelos refugiados, enquanto empregam milhões de migrantes, especialmente do sul da Ásia.
Para Sultan Barakat, um gesto poderia ajudar os sírios e acalmar as críticas: permitir a entrada de refugiados que já têm familiares no Golfo. Centenas de milhares de sírios vivem há anos na região, atraídos pelas oportunidades de emprego. A concessão de vistos permanece estritamente controlada.