Agência France-Presse
postado em 02/10/2015 13:52
Londres, Reino Unido - Quando Adam Smith abriu um café no norte industrial da Inglaterra, no qual serve pratos com restos de comida que iam acabar no lixo, tinha grandes ambições: acabar com o desperdício de alimentos.
"Desde o primeiro dia, a minha intenção era alimentar o mundo e tenho a intenção de fazer isso", disse com ambição o fundador de um império ético, o Real Junk Food Project (Projeto da Verdadeira Comida do Lixo, RJFP).
O primeiro café da rede abriu há três anos em um humilde centro comunitário no pobre distrito de Armley, em Leeds, e o projeto conta agora com 120 filiais em todo mundo, incluindo na Austrália, França, Coreia do Sul, Estados Unidos e, mais recentemente, Nigéria.
"As pessoas estão começando a se darem conta de que somos uma organização séria", disse Smith, que acaba de participar de um ato para sensibilizar os deputados britânicos dando a eles comida vinda de alimentos resgatados do lixo de supermercados.
O conceito é simples e consiste em utilizar alimentos que de outra forma teriam sido dispensados - porque sua data de validade estava vencida ou porque não podem ser vendidos sob as regras comerciais, como uma fruta manchada e convertê-los em comidas perfeitamente comestíveis.
Desde que se iniciou o projeto em dezembro de 2013, foram "interceptadas" quase 200 toneladas de alimentos, disse Smith. Aproximadamente um terço dos alimentos produzidos todos os anos no mundo para o consumo humano se perde ou se desperdiça, segundo a ONU.
Para fugir das leis britânicas, que impedem a venda desses alimentos, os clientes dos cafés RJFP pagam o que querem por seus pratos, explicou Smith.
"Fazemos nossa própria análise, pelo gosto e pelo olfato, para determinar se os alimentos estão aptos para consumo", afirmou.
Smith esclareceu que não criou o projeto para alimentar os pobres, mas para muitas comunidades a iniciativa é uma forma de alcançar pessoas de baixa renda.
Ajudada por cerca de 90 voluntários, a aposentada Shena Elsie Cooper administra o café na cidade de Northampton, região central da Inglaterra, como parte da rede RJFP.
"Queremos criar uma sociedade mista", disse. "algumas pessoas vêm tomar café e um bolo e pagam algumas libras, e tem pessoas que não podem pagar nada", explicou.
;Lixeira;
Os voluntários são desafiados a criar pratos saborosos com o que tem a mão e essa é "a parte divertida para eles", disse Cooper.
No evento "Binner" (lixeira) que Elsie organizou este mês, um chefe convidado transformou os alimentos resgatados em uma festa gourmet: crostini com molho de pêra, salsicha com bolo de polenta e uma sobremesa de chocolate e figos.
"É possível sentir a conscientização do projeto ao comer uma torta", brincou Heike Mapstone, uma atendente de call center, depois do jantar. "Eu acho que é uma ótima ideia. Por que você tem que jogar toda essa comida?", completou.
Cooper sabe que seus cafés são apenas uma gota em um oceano, mas espera que os esforços coletivos sirvam para expor a "realidade do sistema alimentício." "Há tantas coisas ruins nele", afirmou. "O fato de trazermos bananas vindas do mundo todo para logo jogá-las fora é ridículo".
Adam Buckingham alimenta cerca de 200 pessoas por semana em um café RJFP em uma igreja em Brighton, no sul da Inglaterra, e já recebeu desde uma peça de presunto a quantidades enormes de chocolate. "A gente se surpreende ao saber que toda esta comida teria ido para o lixo", disse, pedindo por mudanças nas atitudes e leis sobre alimentos. "Lamentavelmente chegamos a um ponto em que achamos que é uma boa ideia jogar comida boa fora e comprar mais".
No norte de Londres, duas empresárias aproveitaram o que acreditam ser uma aversão a esta forma de pensar.
Tessa Cook e sua sócia americana Saasha Celestial-One lançaram um novo aplicativo, o "Olio", para conectar os consumidores a fontes excedentes de alimento.
O app permite que os doadores coloquem fotos dos produtos cuja data de validade está próxima e os usuários podem encontrar o que precisam e organizar a forma de buscar os produtos atravez de mensagens privadas.
"Fizemos algumas pesquisas de mercado e descobrimos que um terço das pessoas praticamente sentia ;dor física; ao jogar comida fora. Para mim, isso foi incrível", disse Cook.
Até o momento se inscreveram 15 pessoas e empresas que querem oferecer produtos. Ainda que até agora esteja centrado em Londres, Cook espera que o aplicativo seja usado em todo o mundo. "Quanto mais olhamos, mais surpresos ficamos com a enorme quantidade de comida que é jogada fora. É um desperdício irresponsável e imoral", afirmou.