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Vitória da oposição nas legislativas acaba com hegemonia chavista

O governo conquistou apenas 46 cadeiras no parlamento de um total de 167

Agência France-Presse
postado em 07/12/2015 09:27
A oposição conquistou o controle do Parlamento da Venezuela com a eleição de pelo menos 99 de 167 deputados, uma votação de castigo ao governo do presidente Nicolás Maduro que acaba com 16 anos de hegemonia chavista no país. O governo conquistou 46 cadeiras e outras 22 ainda estão indefinidas, segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), o que significa que não está descartado que a oposição, que já tem maioria simples, alcance a maioria absoluta (101 deputados).

[SAIBAMAIS]Pouco depois do anúncio do resultado oficial, Maduro aceitou a derrota: "Viemos com nossa moral, com nossa ética, reconhecer estes resultados adversos, aceitá-los e dizer para a nossa Venezuela que a Constituição e a democracia triunfaram".

"Hoje começou a mudança na Venezuela", afirmou Jesús Torrealba, secretário-executivo da coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD), que adotou um tom conciliador e descartou "revanchismos".

Depois de reduzir as divisões internas, a MUD sempre apareceu como a favorita nas pesquisas para obter a maioria em uma Assembleia dominada pelo governo desde 1999, quando Hugo Chávez, falecido em 2013, chegou ao poder.

Fogos de artifício explodiram em Chacao, zona leste de Caracas, reduto da oposição, enquanto na Praça Bolívar, próxima ao comando da campanha chavista, os simpatizantes do governo abandonaram o local durante a noite.

O dia eleitoral foi calmo e registrou uma "extraordinária participação" de 75% dos 19,5 milhões de eleitores, segundo a presidente da CNE, Tibisay Lucena.

Voto de mudança
A chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, afirmou nesta segunda-feira que as eleições na Venezuela foram um "voto de mudança e um claro apelo a todos os atores políticos e instituições na Venezuela para que se comprometam em esforços políticos construtivos".

O chefe de Governo da Espanha, Mariano Rajoy, elogiou o desenvolvimento das eleições: "Apesar da adversidade, se impôs o espírito dos venezuelanos. Eu os felicito por eleições com civismo e coragem. Ganhou a liberdade", escreveu no Twitter. Rajoy pediu a libertação dos opositores presos, em particular a do líder radical Leopoldo López, e pediu para eles um "Natal com suas famílias".

O triunfo da oposição na Venezuela é o mais recente de uma série de derrotas eleitorais da esquerda na América Latina, revertendo a tendência iniciada com a eleição de Hugo Chávez no fim 1998.

Na Argentina, o candidato de centro-direita Mauricio Macri venceu a eleição presidencial e encerrou 12 anos de governo kirchnerista, grande aliado do chavismo venezuelano. No Brasil, a presidente Dilma Rousseff foi reeleita ano passado, mas enfrenta uma forte queda de popularidade e a possibilidade de um julgamento político que pode resultar no impeachment.

Cansados das filas
Maduro, que assumiu o governo em abril de 2013 após a morte de seu mentor, considerou que a derrota foi provocada por uma "guerra econômica" contra o país, em meio ao descontentamento com o alto custo de vida e a escassez de produtos básicos, o que provoca filas imensas nos supermercados. "Você não consegue papel higiênico. Não se pode votar no governo quando há problemas para sobreviver", disse Filros Guzmán, um garçom de 24 anos que sempre havia votado no chavismo.

Orlando Apitz, de 54 anos, assistente jurídico, disse esperar uma "mudança como na Argentina" porque está "cansado das filas e dos malandros (delinquentes)". A Venezuela é o segundo país mais violento do mundo, atrás de Honduras, com uma taxa de homicídios de 62 para cada 100.000 habitantes, segundo a ONU. "Este é um voto castigo muito importante da população à gestão de Maduro", disse o analista Luis Vicente León, presidente da empresa de pesquisas Datanálisis.

A Venezuela - o país com as maiores reservas de petróleo do mundo e que obtém 96% de suas divisas graças ao combustível - encerrará 2015 com uma contração econômica de 10% e uma inflação de 200%, segundo economistas. Um rígido sistema de controle de divisas - com três taxas de câmbio - convive com um mercado negro onde o dólar tem cotação 145 vezes maior que o mínimo legal.

O que a oposição pode fazer?
Apesar de legislativas em um regime presidencialista, analistas concordaram em classificar como transcendental a votação, porque provocará uma recomposição de forças políticas e um balanço no poder. "Mudará o poder de negociação da oposição. O governo deve reconhecer sua contraparte", disse León, que não descarta a possibilidade de maioria absoluta.



Com maioria simples, a oposição poderá buscar uma anistia para 75 "presos políticos", designar as autoridades da Assembleia, aprovar leis ordinárias, assim como uma emenda constitucional para reduzir o mandato presidencial, mas esta questão deve ser submetida a referendo. "Eu não vou descansar até libertar todos os presos políticos", declarou Lilian Tintori, esposa de Leopoldo López, que teve permissão do governo para votar na prisão.

As legislativas representavam, segundo o cientista político John Magdaleno, a possibilidade de um "contrapeso" em um Estado cujos poderes "estão totalmente controlados pelo governismo".

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