Agência France-Presse
postado em 10/12/2015 08:28
Paris, França - As negociações sobre o clima chegaram à hora da verdade, com os delegados reunidos na madrugada desta quinta-feira em torno de um novo rascunho e tudo indica que haverá um acordo em Paris para evitar uma catástrofe planetária, embora muitos se perguntem qual será seu real alcance. [SAIBAMAIS]"Peço que não voltem a discutir os compromissos que já acertamos, e que se concentrem nos pontos políticos", disse o presidente da conferência, o chanceler francês, Laurent Fabius, antes de convidar os delegados dos 195 países para uma longa noite de discussões.
O rascunho passou de 43 a 29 páginas e árduas negociações são esperadas entre os 195 países participantes para levantar obstáculos persistentes sobre financiamento, diferenciação de responsabilidade e metas a longo prazo, admitiu Laurent Fabius.
Uma maioria de observadores, ONGs e delegações saudaram a organização e o método da presidência francesa para dirigir até bem perto as deliberações. "Esperamos que a França nos encaminhe para um compromisso o mais ambicioso possível", disse Matthieu Orphelin, porta-voz da ONG Fundação Nicolas Hulot.
De fato, a palavra "ambição" tornou-se uma das mais utilizadas na reta final das negociações. Ela está sendo empregada especialmente para falar da meta principal do acordo, a de limitar a um máximo de 2 ;C o aquecimento do planeta, mais além do qual os cientistas alertam para riscos de devastadoras secas, elevação do nível dos oceanos e deslocamentos massivos da população.
As pequenas ilhas do Pacífico ameaçadas de desparecimento, os estados africanos mais pobres e os países da América Central, pediram junto a outros prejudicados pelo aquecimento global um texto mais ambicioso que mencione a meta de %2b1,5;C com relação ao nível da era pré-industrial.
Segundo Alden Meyer, da norte-americana Union of Concerned Scientists, "as próximas 24 a 36 horas determinarão com que tipo de acordo iremos embora de Paris".
Reparos dos petroleiros
A Arábia Saudita, que lidera a resistência dos países petroleiros, quer evitar que o texto mencione o objetivo de "descarbonizar" a economia mundial - quer dizer, liberá-la das energias fósseis como carvão, gás ou petróleo - uma palavra também criticada pela Venezuela, segundo sua negociadora Claudia Salerno.
O acordo pode satisfazê-los neste momento e optar pelo conceito de "neutralidade climática".
Outro dos pontos de bloqueio eram os prazos de revisão do acordado. Sobre a mesa está a proposta de revisão a cada cinco anos, embora a Índia trabalhe para que este período seja de dez.
Embora a revisão a cada cinco anos tenha acabado se impondo, a primeira foi marcada para 2023 ou 2024, após a entrada em vigor do acordo em 2020.
Outros países como a Argentina pediam mais tempo, ou melhores condições de acesso a tecnologias das quais dispõem os países desenvolvidos.
Juan Carlos Villalonga, o emissário na COP21 do presidente eleito Mauricio Macri, que assumirá o cargo na quinta-feira, substituindo Cristina Kirchner, disse que a partir desse dia iria baixar os "decibéis" das objeções da Argentina, que nesta quarta-feira renderam a seu país o vergonhoso prêmio "Fóssil Award", atribuído pela rede de ONGs Climate Action Network.
A Argentina está "batendo os pés", lamentou Villalonga, que disse estar disposto a contribuir com propostas capazes de "desatar nós" para chegar a um acordo e empurrar por exemplo para incluir a data de 2050 como a etapa de redução de gases de efeito estufa.
A chave que abriria a porta
O principal obstáculo nas negociações continuava sendo no último momento a questão do financiamento de 100 bilhões de dólares que o Norte desenvolvido aportará cada ano a partir de 2020 aos países em desenvolvimento para que adaptem suas economias ao aquecimento global.
Aqui também entra em jogo a "ambição": os países do Sul querem que essa soma seja um piso a partir do qual mais fundos seriam trazidos, enquanto os industrializados argumentaram que "o mundo mudou" e conseguiram que os emergentes poderosos sejam convidados a ajudar também os vulneráveis.
Uma proposta formulada pela Índia - um dos atores protagonistas em Le Bourget -, poderia finalmente ser a chave que abre a porta do acordo final: sincronizar os planos nacionais voluntários de redução de emissões (INDC) de cada país com o financiamento e o acesso às tecnologias trazido pelo norte.
Outra meta do acordo era impulsionar o estabelecimento de um "preço de carbono", algo que também ficaria no texto final como um objetivo "importante" a ser alcançado, para que o mundo se afaste progressivamente das energias fósseis e adote as opções verdes.
O porta-voz da ONG Oxfam, Romain Benicchio, alertou sobre os riscos de uma diluição do que foi acordado: "Os países claramente estão preferindo a facilidade em vez de brigar pelo que é justo para seus cidadãos e para o planeta. Ainda não é muito tarde para elevar o nível de ambição do acordo".