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Atoleiro político bloqueia solução econômica na Venezuela

Com as maiores reservas de petróleo do planeta, a Venezuela sofre com a queda dos preços da commodity, fonte de 96% de suas divisas

Agência France-Presse
postado em 08/01/2016 19:30

Caracas, Venezuela - A crescente confrontação entre o governo de Nicolás Maduro e a maioria opositora do Parlamento ameaça, segundo analistas, aprofundar a crise econômica na Venezuela.

A crise institucional que explodiu após a instalação na última terça-feira da Assembleia Nacional tende a piorar. Hoje, a oposição não reconheceu a demanda de nulidade das decisões legislativas feita pelo chavismo à Justiça, após a posse de três deputados de oposição impugnados pelo governo.

Nesse contexto, a situação econômica é a maior preocupação dos venezuelanos. Para os analistas consultados pela AFP, a resposta veio nas urnas, com a vitória contundente da oposição nas eleições legislativas de 6 de dezembro, na forma de um "voto de castigo" em Maduro.

"A agenda da oposição - derrubar Maduro - está muito distante das nossas necessidades, e o governo quer apenas brigar. Nós queríamos que a situação melhorasse, não que os problemas aumentassem", disse a contadora Esmeralda Rivas, de 40 anos.

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Com as maiores reservas de petróleo do planeta, a Venezuela sofre com a queda dos preços da commodity, fonte de 96% de suas divisas. Agravam o cenário doméstico um déficit fiscal de 20% do PIB, uma inflação de 200% e uma contração de 6% da economia em 2015, segundo cálculos privados.

Plano do governoNa próxima terça-feira, Maduro apresentará à Assembleia um decreto de emergência econômica para impulsionar um "modelo socialista produtivo" neste país muito dependente das importações. O presidente disse esperar o apoio do "Parlamento burguês".

Ao reconhecer a gravidade da crise, Nicolás Maduro reorganizou seu gabinete com uma equipe econômica liderada pelo sociólogo Luis Salas, conhecido por defender a tese da "guerra econômica" atribuída pelo governo a empresários de direita com o objetivo de desestabilizar o país.

"Estamos navegando em meio a uma tempestade. A ideia é tirar o barco, e remarmos todos na mesma direção e pô-lo em um horizonte estratégico, que é uma economia produtiva, não especulativa", afirmou Salas.

Asdrúbal Oliveros, da firma Ecoanalítica, teme que a queda dos preços de petróleo - a US$ 27,87 o barril esta semana -, um reforço da ala radical na economia e o conflito institucional agravem a crise.

"Preocupante, se houver medidas isoladas e não profundas, panos quentes em busca de uma solução", disse à AFP.

Economistas recomendam eliminar o controle de preços, unificar as três taxas de câmbio oficiais e aumentar o preço da gasolina, quase de graça na Venezuela.

O "maior perigo" é que "o governo acredite em que não pode assumir os custos políticos do ajuste e dê um passo à frente no precipício", sentenciou o analista Luis Vicente León.

Agenda da oposiçãoNa instalação do Legislativo, a Mesa da Unidade Democrática (MUD) esboçou sua agenda, dedicada a reformas econômicas e, em no máximo seis meses, a encontrar um caminho legal para mudar o governo.

Para León, a oposição não deve se esquecer de que, embora tenha maioria legislativa, o governo possui "blindagem institucional", com um poderoso Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) - regido pelo chavismo, segundo a MUD - e o apoio da Força Armada.

"A oposição vinha conseguindo uma aproximação com os militares. Isso caiu por terra, e esse retrocesso é um ponto crítico", comentou o cientista político Ricardo Sucre.

Acusada pelo governo de querer "privatizar tudo", a MUD planeja eliminar os controles sobre a distribuição e a venda de produtos básicos, favorecer o investimento privado e liberar as forças produtivas.

Em meio ao conflito, a população segue na expectativa.

"Estão esperando que os problemas sejam resolvidos, mas, se os dias passarem e isso continuar assim, a tensão social vai-se exacerbar", opinou Oliveros.

A analista Mercedes Pulido está otimista. "O espírito de sobrevivência é muito forte e se imporá. O choque vai pressionar um entendimento".

A empregada doméstica Gilma Vásquez, de 63 anos, disse à AFP ter votado para que "as filas acabem" nos supermercados, mas está "assustada com que nada vá mudar".

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