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Violência no Iraque atinge índices "atordoantes", motivada por jihadistas

Relatório das Nações Unidas revela índices alarmantes de violência no Iraque e divulga casos macabros de execuções cometidas pelo Estado Islâmico. Pelo menos 3,5 mil mulheres e crianças foram transformadas em escravas pelos jihadistas

Rodrigo Craveiro
postado em 20/01/2016 09:44
Relatório das Nações Unidas revela índices alarmantes de violência no Iraque e divulga casos macabros de execuções cometidas pelo Estado Islâmico. Pelo menos 3,5 mil mulheres e crianças foram transformadas em escravas pelos jihadistas
O professor iraquiano curdo Diler Kocher, 32 anos, mora em Dohuk, a 60km da cidade de Nínive e a 45km do local em que os jihadistas do Estado Islâmico (EI) mantêm posição, na estrada para Mossul. Ele conta ao Correio que os terroristas estão por trás de uma série de atrocidades na região. ;Idosos e crianças foram assassinados. Vi alguns jovens sequestrados em Sinjar. Eles me relataram que o EI executou todos os homens de famílias inteiras e capturou as meninas, para serem vendidas como escravas sexuais;, afirma. Publicado ontem pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCH, pela sigla em inglês), o Relatório sobre a proteção de civis no conflito armado do Iraque: 1; de maio a 21 de outubro de 2015 atesta o relato de Diler. De acordo com o documento, o EI mantém como escravas cerca de 3.500 crianças e mulheres, em sua maioria, integrantes da etnia yazidi. Entre 800 e 900 jovens foram levados de Mossul para treinamento militar e doutrinação religiosa. Alguns deles morreram enquanto tentavam fugir de uma batalha na província ocidental de Anbar.

O relatório alerta que a violência no Iraque atingiu índices ;atordoantes;, impulsionados pelos jihadistas. Entre janeiro de 2014 e outubro de 2015, foram contabilizadas as mortes de 18.802 civis; outros 36.245 ficaram feridos. No período exclusivo de análise do relatório, em apenas cinco meses, foram registradas pelo menos 10.911 vítimas civis, com 3.855 pessoas mortas e 7.056, feridas. ;O chamado ;Estado Islâmico do Iraque e o Levante; (ISIL) continua a cometer violência sistemática e disseminada, e abusos da lei de direitos humanos internacionais e da lei humanitária. Esses atos podem, em alguns casos, ser classificados como crimes de guerra, crimes contra a humanidade e, possivelmente, genocídio;, admite o documento, ao utilizar o nome antigo do EI.

Militantes do Estado Islâmico atiram suposto homossexual de prédio

;Os obscenos dados de mortes falham em refletir com exatidão como terrivelmente os iraquianos sofrem no Iraque;, lamentou o alto comissário Zeid Ra;ad Al-Hussein. ;As estatísticas se referem àqueles que foram mortos ou mutilados pela violência aberta, mas não incluem os que morreram por falta de acesso a comida, água e tratamento médico.;

Não faltam exemplos de barbáries perpetradas pelo EI, no relatório da ONU. Em 23 de junho, o grupo jihadista publicou um vídeo de sete minutos de duração sobre as execuções de 16 homens. Os assassinatos se dividem em três tipos ; as imagens mostram uma granada propelida a foguete atingindo um carro onde as vítimas estavam trancadas; prisioneiros afogados em jaula submersa numa piscina; e explosivos pendurados nos pescoços de supostos informantes das forças iraquianas. ;Em julho e em agosto, o ISIL assassinou civis que tentavam escapar de Hawija, a sudoeste de Kirkut. Os corpos foram frequentemente pendurados em postes de eletricidade, para desencorajar outros que consideravam fugir rumo a Salah Al-Din e a Kirkuk;, afirma o texto.

Prisioneiros executados por afogamento, em jaula colocada na piscina

Segundo a ONU, o EI também eliminou imãs (clérigos islâmicos) por se recusarem a elogiar a facção em seus sermões. Além das mortes extrajudiciais, o EI submete prisioneiros a tribunais não autorizados pela Justiça iraquiana, os quais seguem interpretações draconianas e distorcidas da sharia (lei islâmica). Em 4 de junho, dois jovens e um homem de 60 anos foram jogados do alto do prédio da Companhia Nacional de Seguros, em Mossul. O documento de uma Corte estabelecida pelo EI foi lido pouco antes das mortes, o qual acusava o trio de atos homossexuais.



Subestima
Morador de Bagdá, o jornalista iraquiano Methaq Al-Fayyadh, 36 anos, disse ao Correio não ter ficado impressionado com os números do relatório da ONU. ;Eu acho que o Estado Islâmico fez muito mais do que foi reportado;, comentou. ;Tenho conversado com pessoas em áreas sob controle do Daash (acrônimo árabe para EI). O grupo usa guerra psicológica para amedrontar os civis. Isso inclui amputações, execuções em público e detenções.;

De acordo com Methaq, a cidade de Mossul foi palco ontem de novas violações cometidas pelo EI. ;Elementos do Daash organizaram uma festa para casar seis meninas yazidis. Uma delas escapou e buscou ajuda com um morador. Os jihadistas conseguiram localizá-la e a trouxeram de volta. Antes, assassinaram o homem que tentou abrigá-la;, contou. A aviação iraquiana bombardeou o local da reunião do EI e matou 20 pessoas. Uma declaração das Forças Armadas do Iraque não esclarece se as seis garotas foram estupradas pelos militantes, nem se elas sobreviveram ao ataque. ;O Exército conseguiu liberar mais áreas do EI no oeste do país, mas a pergunta é: por que a coalizão internacional liderada pelos EUA não consegue, destruir o grupo?;, questiona Methaq.

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