Agência France-Presse
postado em 21/03/2016 16:24
Londres, Reino Unido - O primeiro-ministro britânico, David Cameron, tentava nesta segunda-feira acabar com a disputa em seu Partido Conservador após a saída de um ministro que criticou os cortes sociais e em um contexto de tensão pelo referendo sobre a União Europeia.
[SAIBAMAIS]Cameron compareceu ante o Parlamento e anunciou o cancelamento da redução de benefícios sociais a trabalhadores incapacitados, medida esta que provocou a demissão de seu ministro do Trabalho, Iain Duncan Smith, e um racha no gabinete.
Smith acusou em sua carta de demissão o ministro das Finanças, George Osborne, de ter jogado o peso da austeridade sobre as costas dos menos favorecidos.
"Sobre a invalidez, eu lhes digo que não continuaremos com as mudanças que foram apresentadas" no novo orçamento, garantiu Cameron no Parlamento.
O premiê, que comparece ante o Parlamento após cada cúpula europeia, anunciou, então, a retirada do plano para reduzir 1,3 bilhão de libras (US$ 1,4 bilhão) anuais em ajudas a trabalhadores incapacitados, o que havia causado indignação em muitos setores - incluindo uma parte dos deputados conservadores.
A oposição trabalhista lamentou que Osborne não tenha comparecido à sessão - "onde está o ministro da Finanças?", questionou o líder Jeremy Corbyn -, e reivindicou a retirada do "caótico orçamento" do qual a medida faz parte.
Cameron insistiu no fato de que seu governo é "compassivo" e que "continuará concedendo a maior prioridade a melhorar as oportunidades dos mais pobres".
O novo ministro do Trabalho e da Previdência Social, Stephen Crabb, confirmou a retirada da medida em sua primeira intervenção no Parlamento desde que assumiu a pasta. Também ensaiou uma desculpa: "por trás de cada estatística, há um ser humano e, às vezes, os políticos se esquecem disso".
Crabb garantiu que não haverá novos cortes nos auxílios sociais.
A renúncia de Duncan Smith surpreendeu a todos. Cameron se disse "perplexo e desapontado", e de acordo com alguns meios de comunicação chegou a insultar seu ministro em uma conversa por telefone, porque Duncan Smith, conhecido em Wesminster como "um homem tranquilo", era considerado o grande campeão dos cortes, e a primeira reação do Partido Trabalhista foi prever que "haverá muitas lágrimas por ele".
Duncan Smith era o fusível que protegia Cameron e Osborne, e sua renúncia foi comparada com a de Geoffrey Howe, um colaborador próximo de Margaret Thatcher, cuja renúncia em 1990 precipitou a queda da Dama de Ferro.
Os trabalhista e os nacionalistas escoceses pediram, de fato, que Osborne siga o exemplo de seu companheiro.
Mas, independentemente do impacto que a crise possa ter sobre o ministro das Finanças, que ambiciona suceder Cameron, o que preocupa realmente é o referendo sobre a permanência do país na União Europeia.
Desde o anúncio do referendo de 23 de junho, o partido se dividiu entre partidários de permanência no bloco e os detratores, ao contrário do Partido Trabalhista, (quase) unanimemente favorável à permanência.
"Embora as divisões sobre a Europa não tenham sido a causa imediata da demissão, sem dúvida, criaram as condições para isso", considerou nesta segunda-feira o jornal The Guardian em seu editorial.
Osborne e Cameron defendem a permanência na União Europeia, e Duncan Smith a saída. Agora poderá fazer campanha abertamente ao lado do prefeito de Londres, outro conservador, Boris Johnson.
"Uma das principais cartas da campanha pró-europeia é a autoridade de Cameron como primeiro-ministro e o papel de Osborne defendendo os argumentos econômicos para a permanência" na União Europeia, ressaltou o Financial Times em seu editorial desta segunda-feira.
Michael Howard, ex-líder do Partido Conservador, pediu calma aos seus colegas, em uma entrevista na Rádio BBC: "Em 24 de junho deveremos estar juntos, porque vamos ter de continuar governando este país pelo menos durante os próximos quatro anos".