Agência France-Presse
postado em 06/04/2016 11:06
Panamá, Panamá - Vários países ocidentais fizeram apelos nesta quarta-feira (6/4) à luta contra a opacidade fiscal após as revelações dos "Panama Papers", e pressionaram a nação centro-americana para que cumpra as regras de transparência internacional.O histórico vazamento de 11,5 milhões de documentos confidenciais do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca, especializado na criação de sociedades em paraísos fiscais, deixou na terça-feira (5/4) sua primeira vítima.
Trata-se do primeiro-ministro islandês, Sigmundur David Gunnlaugsson, que permanecerá afastado do poder "por um tempo não informado", após a divulgação de que teve junto a sua esposa, uma rica herdeira, uma empresa no paraíso fiscal das Ilhas Virgens britânicas.
Nesta quarta-feira, a França lidera a pressão sobre as autoridades do Panamá e anunciou que voltará a colocar o país na lista de paraísos fiscais depois de tê-lo retirado há quatro anos.
"Infelizmente, o Panamá tem tendência a dar guinadas de 180 graus, brincar de policial bom e mau ao mesmo tempo. Isso não pode continuar", disse o ministro francês das Finanças, Michel Sapin, que pediu aos 34 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos que também voltem a incluir o país na lista.
O ministro indicou ainda que a questão pode ser debatida em uma reunião do G20 prevista para a próxima semana em Washington.
As autoridades panamenhas responderam às críticas e o ministro da presidência, Álvaro Alemán, advertiu que "existe uma lei que estabelece medidas de retaliação contra países que incluírem o Panamá em listas cinza" de lavagem de dinheiro.
Estas medidas incluem bloquear os investimentos estrangeiros ou congelar concursos públicos, o que pode deixar os países ocidentais fora de importantes contratos.
Por sua vez, o vice-chanceler panamenho, Luis Miguel Hincapié, classificou de "injustas e discriminatórias" as críticas expressadas em uma carta pelo secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría.
Pressão dos EUAÀ pressão da França pode se unir agora a dos Estados Unidos, a primeira economia mundial, historicamente ligada ao Panamá, onde foi proprietária do canal até 1999. "A questão da evasão fiscal é um problema enorme", disse na terça-feira Barack Obama, e pediu para endurecer a legislação em vigor e reforçar a cooperação internacional.
Os Estados Unidos também lutam contra este fenômeno em casa e acabam de adotar novas leis para frear o exílio fiscal de multinacionais americanas que transferem sua sede ao exterior aproveitando a compra de empresas.
A reunião do G20 em Washington da próxima semana, que coincide com as reuniões do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, será a chance de tratar a questão, segundo uma fonte francesa.
O tema também será discutido em uma reunião de ministros das Finanças europeus prevista para Amsterdã no fim de abril. O escritório Mossack Fonseca está no centro do escândalo depois que uma fonte anônima conseguiu extrair milhares de documentos e os compartilhou com o Sueddeutsche Zeitung.
[SAIBAMAIS]O jornal alemão os divulgou, por sua vez, a mais de 100 meios de comunicação de todo o mundo através do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ).
Após um ano de investigação, o ICIJ e os meios de comunicação participantes publicaram a primeira onda de revelações que envolvem 140 personalidades de primeiro nível de todo o planeta.
A criação de sociedades em paraísos fiscais, as chamadas "offshore", não é ilegal em si, embora em muitos casos sirva para ocultar o patrimônio das autoridades ficais, para lavar dinheiro do tráfico de drogas ou para esconder fortunas que teriam consequências políticas nefastas para seus proprietários.
Ramón Fonseca Mora, diretor e membro fundador da empresa, declarou na terça-feira que sua empresa havia sido hackeada e anunciou uma denúncia ante os tribunais.
"Ninguém fala de hackers e é o único crime que foi cometido. Não entendemos. O mundo já aceita que a privacidade não é um direito humano", disse Fonseca.
As revelações dos documentos, que cobrem um período de quase 40 anos e onde aparecem citadas 214.000 sociedades, atingiram personalidades de todo o mundo, de parentes do presidente russo Vladimir Putin ou do chinês Xi Jinping a atletas como o argentino Lionel Messi ou o novo presidente da Fifa, Gianni Infantino.
Também aparecem os nomes do presidente argentino Mauricio Macri e o do pai do atual primeiro-ministro britânico, David Cameron. Segundo o Süddeutsche Zeitung, entre os clientes do Mossack Fonseca também havia "traficantes de drogas do México, Guatemala e Europa Oriental".