Agência France-Presse
postado em 16/05/2016 09:44
Caracas, Venezuela -A crise venezuelana entra nesta semana em uma nova etapa de tensões, com um país sob estado de exceção e os opositores decididos a seguir pressionando nas ruas por um referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro.Em meio ao descontentamento popular pela escassez crescente de alimentos básicos e remédios, além dos cortes diários de luz e água, e a maior inflação do mundo, Maduro deu mostras de radicalismo nos últimos dias.
Na sexta-feira prorrogou um decreto de emergência econômica em vigor desde janeiro, mas de forma surpreendente acrescentou a ele um estado de exceção por três meses. Não descartou inclusive prorrogá-lo sucessivamente até 2017.
Espera-se que nesta segunda-feira sejam divulgados os alcances da medida, que costuma restringir o direito de protesto e de reunião, e autorizar detenções e buscas sem ordem judicial.
Por enquanto, Maduro ordenou tomar as indústrias paradas, colocando na mira quatro fábricas da cervejeira Polar - principal produtora de alimentos e bebidas do país - fechadas por falta de divisas para comprar insumos no âmbito do ferrenho controle cambial.
O governo justifica o estado de exceção por um suposto complô dos Estados Unidos e de líderes opositores para intervir no país com as maiores reservas de petróleo do planeta, sob o pretexto de uma crise humanitária.
Diante desta "ameaça externa", Maduro ordenou a realização no próximo sábado de exercícios militares.
O presidente também fundamenta o estado de exceção na necessidade de tomar medidas drásticas contra a "guerra econômica" que, segundo ele, a oposição e a direita executam para levar à escassez e lançar o povo contra ele.
Neste contexto, mobilizou um plano para o abastecimento de produtos básicos subsidiados sem intermediários, e se comprometeu a flexibilizar o controle de preços em troca de que algumas indústrias elevem a produção.
Estado de exceção à prova
Mas os sinais de radicalização vão além do presidente socialista, cuja gestão é reprovada por 68% dos venezuelanos, segundo a empresa Venebarómetro.
O vice-presidente, Aristóbulo Istúriz, rejeitou no domingo a possibilidade de que o herdeiro político do falecido Hugo Cháfez (1999-2013) deixe o poder mediante um referendo.
"Aqui Maduro não vai sair por referendo porque primeiro aqui não vai haver referendo. (...) Eles sabem que não vai haver referendo porque primeiro o fizeram tarde, segundo o fizeram mal e em terceiro cometeram fraude", disse Istúriz, referindo-se às assinaturas entregues pela oposição para que o processo seja ativado.
"Terão que matar a todos nós antes de dar um golpe parlamentar", advertiu em referência ao fato de a oposição controlar amplamente o Legislativo desde janeiro.
O estado de exceção será colocado à prova na próxima quarta-feira, quando a oposição planeja marchar em direção às sedes do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) em todo o país pedindo o cumprimento dos prazos para que o referendo revocatório seja realizado neste ano.
"A oposição sabe que o protesto é o único mecanismo para escalar a pressão, e o governo precisa deter esta tendência", disse à AFP o analista Benigno Alarcón.
Mobilizações similares foram bloqueadas na última quarta-feira por policiais e militares, desencadeando confrontos.
O líder opositor Henrique Capriles, atingido por gás lacrimogêneo na ocasião, advertiu no sábado sobre o risco de que o governo e o CNE - acusado por ele de servir a Maduro - "tranquem" a consulta.
"A Venezuela é uma bomba que a qualquer momento pode explodir. E, portanto, convocamos todo o povo a se mobilizar para o revocatório", disse, ressaltando que esta é a saída pacífica à crise.