Rodrigo Craveiro
postado em 20/06/2016 09:18
O nome do afegão naturalizado americano Omar Mateen constava de uma lista de vigilância antiterrorismo do FBI, a polícia federal dos EUA. Ele foi interrogado por duas vezes, entre 2013 e 2014. Dois anos depois, jurou lealdade a Abu Bakri Al-Baghdadi ; líder do Estado Islâmico (EI) ; e, no mesmo dia, invadiu uma boate voltada para o público gay e executou 49 pessoas, em Orlando (Flórida). Se as autoridades percebessem o perigo, teriam reforçado o monitoramento de Mateen e evitado tantas mortes. Antes dos atentados de Paris, em 13 de novembro passado; e de Bruxelas, em 22 de março; as agências de segurança tinham informações sobre ameaças jihadistas, mas não conseguiram prevenir os ataques. Na história do contraterrorismo, são inúmeros os erros de avaliação que custam vidas e provocam desgaste político. Em entrevista ao Correio, quatro renomados especialistas apontaram as lacunas de inteligência e os desafios do Ocidente na prevenção à ofensiva extremista.
[SAIBAMAIS]No último sábado, a polícia belga prendeu 12 pessoas e indiciou formalmente três homens por tentativa de assassinato. A suposta célula terrorista teria como alvo uma área de torcedores (fan zone) em Bruxelas, durante a Eurocopa. Um exemplo de que o aparato de inteligência vez ou outra funciona. Para o cingalês Rohan Gunaratna, autor de Inside Al-Qaeda: Global network of terror (;Por dentro da Al-Qaeda: a rede global de terror), a ascensão meteórica do EI, dois anos atrás, sobrecarregou as agências de segurança nacionais. ;Os governos precisam debater novas leis e atualizar a legislação atual, a fim de confrontar a natureza mutável da ameaça jihadista. Também é necessário construir capacidades de contraterrorismo mais amplas, dentro das Forças Armadas, da Justiça e da inteligência.
Gunaratna lembra que uma porcentagem significativa de terroristas que perpetraram ataques era conhecida dos serviços de inteligência da América do Norte e do Ocidente. ;No entanto, esses suspeitos não puderam ser presos por três motivos. Em primeiro lugar, suas atividades não encontraram a base legal exigida para a detenção. Em segundo, os governos não possuíam leis para fazer prisões preventivas de suspeitos que planejavam atentados. Por último, as políticas de Estado e as linhas de investigação não foram robustas o suficiente ou limitaram as ações policiais à vigilância dos alvos em potencial;, enumera. O especialista considera exemplar o caso de Mateen e critica a falta de compartilhamento de dados entre as agências de inteligência dos países ocidentais.
Desafio
Ex-agente do serviço secreto francês DSGE, Yves Trotignon cita o atentado em Orlando e o duplo homicídio de policiais ; Larossi Aballa assassinou o casal, em Magnanville (subúrbio de Paris), filmou os corpos e publicou o vídeo no Facebook. ;São os clássicos casos em que homens identificados como terroristas em potencial se tornam assassinos, sem qualquer tipo de alerta. Apesar de uma tendência antiga, é um dos mais importantes desafios enfrentados pelos serviços de segurança;, observa.
Ele vê como fundamental a construção de um sistema de alerta precoce, capaz de detectar ;pequenos sinais; e coibir um banho de sangue. Uma das respostas, segundo Trotignon, envolve dar às agências de segurança capacidades estendidas no campo da aquisição de inteligência, seja por meio da criação de leis, seja pela contratação de centenas de funcionários. ;Você não precisa apenas de inteligência, mas de pessoas capazes de compreender, de forma correta, a ameaça, e, depois, atuar no terreno. Cada ataque terrorista deve ser visto como um fracasso pelas autoridades;, dispara.
O contraterrorismo envolve um dilema ético e moral de dimensões complexas: como capturar potenciais suspeitos jihadistas sem violar os preceitos básicos dos direitos humanos? O britânico Ewan Lawson, especialista do Centro para Estudos Internacionais e Diplomacia (CISD) da Universidade de Londres, reconhece que o direito à livre expressão e à não detenção, além da necessidade de as sociedades se protegerem de um ataque, tem tensionado o trabalho das agências de inteligência. ;No caso dos terroristas solitários, é difícil certificar se um indivíduo tem a séria intenção de provocar, se faz ruídos ou se tem problemas mentais. A polícia e as agências precisam tomar decisões difíceis, quase sempre baseadas em evidências limitadas;, critica. Ele defende a introdução de leis draconianas, por parte do Ocidente, que permitam a detenção prolongada, sem a necessidade de pistas concretas.
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