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Professores britânicos comentam referendo sobre o futuro do Reino Unido

Os britânicos devem definir o destino do país respondendo à questão: "O que deve fazer o Reino Unido: permanecer na União Europeia ou sair da União Europeia?"

postado em 23/06/2016 08:58
O Correio perguntou a dois especialistas britânicos: "O senhor é a favor da saída ou da permanência do Reino Unido na Europeia?" Eles escreveram artigos nos quais expõem e defendem seu ponto de vista.

PERMANÊNCIA NA UNIÃO EUROPEIA

"Reino Unido perderia acesso a mercados"

Aris Georgopoulos


Os britânicos devem definir o destino do país respondendo à questão: O eleitorado britânico enfrenta um momento decisivo hoje, 23 de junho. É uma decisão que, independentemente do resultado, terá repercussões dentro do Reino Unido e no resto da União Europeia (UE). A decisão se baseia em uma questão simples: se o Reino Unido deveria permanecer ou abandonar a UE. Em minha visão, a questão não é meramente simples. Ela é simplista e, por essa razão, arriscada. É simplista por tentar simplificar o que é, essencialmente, um tema complexo e cheio de nuances, ou seja, o nível e a intensidade de integração que o Reino Unido deseja manter com o restante da UE. É arriscado porque a lógica binária do referendo deixa pouca margem para correção, depois de a decisão ter sido tomada. Um referendo desse tipo não costuma deixar "navios ou pontes".

Seja como for, uma questão tem de ser feita e deve ser perguntada. Eu sinceramente acredito que o Reino Unido deveria permanecer na UE; não apenas isso, deveria liderá-la. O argumento econômico para permanecer na UE é convincente. A economia do Reino Unido tem se beneficiado de forma tremenda da condição de membro da UE. Ela só é suficiente para comparar a performance da economia britânica entre antes da adesão à Comunidade Econômica Europeia e hoje. Abandonar a UE significaria que o Reino Unido perderá o acesso irrestrito ao mercado único. Em outras palavras, o destino de mais de 46% das exportações do Reino Unido. Além disso, um Reino Unido fora da UE essencialmente significaria que ele iria negociar acordos comerciais com as economias emergentes do século 21, enquanto mercado de 60 milhões de pessoas, não como parte de um bloco comercial de 550 milhões de pessoas. Embora a atuação do Reino Unido por si só possa capacitá-lo a fechar acordos comerciais com outros países mais rapidamente, ele o faria com base em termos impostos por outras partes mais fortes, como a China e a Índia. Nas negociações comerciais, tamanho importa.



No entanto, este referendo não é apenas sobre economia e comércio. É sobre democracia e soberania. É verdade que, como parte da UE, o Reino Unido, assim como outros países-membros, compartilha parte de sua soberania com outros membros, a fim de maximizar e amplificar, por meio da ação coletiva, o seu poder no mundo. Não é verdade que a tomada de decisão da UE seja antidemocrática. As regras da UE são propostas pelo serviço jurídico europeu (a Comissão Europeia), mas são alteradas e votadas pelo Parlamento da UE diretamente e pelos representantes dos governos nacionais eleitos democraticamente, dentro do Conselho. Em qualquer caso, a discussão sobre a democracia e a responsabilização teria sido mais honesta se, ao invés de castigar a UE, mostrasse o mesmo nível de sensibilidade democrática para os padrões democráticos no Reino Unido. Por exemplo, o sistema eleitoral, pouco representativo, a não eleição da Câmara Alta da Casa dos Lordes. a dependência das Agências Executivas). Eu receio que, sob o disfarce de "sensibilidade democrática, se esconde insidiosamente algo mais sinistro, o velho inimigo do continente europeu: o nacionalismo.

Esse referendo, e o contexto no qual ocorre, me lembra O senhor dos anéis, de J R Tolkien. Na minha concepção, o anel a ser destruído é a reemergência do nacionalismo. Por quase 60 anos, uma associação de nações conseguiu, com sucesso, subjugar esse velho inimigo. Como no livro de Tolkien, essa associação está longe de ser perfeita. No entanto, desmantelá-la ou se afastar dela não pode ser a resposta. É preciso coragem, perseverança e compromisso para entregar a sua missão. Eu realmente espero que o Reino Unido não se distanciará dessa associação.

Aris Georgopoulos é professor de direito público e europeu da Faculdade de Direito da Universidade de Nottingham (Reino Unido)


SAÍDA DA UNIÃO EUROPEIA

Uma questão de soberania

Mark Stuart


Os britânicos devem definir o destino do país respondendo à questão: Nesta quinta-feira, 23 de junho, o povo do Reino Unido enfrenta sua maior decisão em uma geração política: se permanece ou se abandona a União Europeia (UE). Durante a campanha pelo referendo, o debate tem sido dominado por questões em torno da economia. Poderia o Reino Unido sobreviver de fora da UE? No entanto, nenhuma evidência de experts em economia do lado da permanência, emanando do Fundo Monetário Internacional (FMI), da Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OECD) ou o Banco Mundial, parece ter surtido qualquer efeito sobre as pesquisas de opinião.

A razão pela qual metade do povo britânico não escutou essa evidência clara está no fato de que eles têm uma conexão emocional muito pequena com a União Europeia. Para eles, esta é uma instituição remota e antidemocrática. Questões sobre nacionalidade e identidade nacional importam mais: quem governa o Reino Unido, e podemos "chutar os patifes" para fora, em eleições gerais? O sistema eleitoral britânico lhes permite fazerem isso. O sistema da União Europeia, não.

Veja o que ocorreu com os gregos, no ano passado. Eles elegera um governo que desejava pôr fim à austeridade. Ainda assim a UE interveio e disse que eles não poderiam fazer isso. Sim, a Grécia, o país que inventou a palavra "democracia" ("demos"), foi incapaz de se governar. A dura realidade é que, em um mundo moderno e globalizado, as pessoas têm muito pouco poder para moldar suas próprias decisões, ainda que queiram retomar algum controle sobre quem as governa. Por isso, voto hoje pela saída da União Europeia.

A maior preocupação no Reino Unido é com a imigração descontrolada. Desde a década de 1990, mais de 3 milhões de imigrantes vieram da UE para trabalhar no Reino Unido, fundamentalmente alterando o tecido social de nosso país. Enquanto pessoas mais jovens estão confortáveis com tais mudanças, os cidadãos mais velhos se mostram preocupados com o fato de o passo da mudança vir rápido demais. Eles sentem que a imigração descontrolada está levando a uma perda da identidade nacional britânica e que as elites políticas não têm escutado suas preocupações. Votar pela saída é visto por muitos como um protesto contra essas mudanças.

Mas, apesar de a imigração ser o bastante para assegurar um voto pela saída ("Brexit") no referendo, provavelmente não é suficiente para garantir a vitória daqueles que desejam a saída do Reino Unido do bloco. A classe média indecisa, preocupada com suas economias e investimentos, é quem provavelmente vai balançar o resultado no último minuto em favor da permanência no bloco. Se esse resultado ocorrer, isso vai me entristecer, pois quero que minha filha pequena viva em um país livre e que seja capaz de se governar.

Mark Stuart é professor da Faculdade de Ciências Sociais na Universidade de Nottingham (Reino Unido)

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