Mundo

"O revogatório é um direito nosso", diz Henrique Capriles

Rodrigo Craveiro
postado em 24/06/2016 06:00


Governador do departamento (estado) de Miranda e um dos principais líderes da oposição na Venezuela, Henrique Capriles Radonski acredita que o ;ânimo inquebrantável; dos venezuelanos, ao permanecerem horas nas filas para validar as assinaturas, envia uma mensagem contundente ao Palácio de Miraflores. ;No entanto, (o presidente Nicolás) Maduro e sua cúpula se fazem de surdos, preferem não escutar a voz do povo. A eles só interessa se manterem no poder a todo o custo;, afirmou Capriles ao Correio, em entrevista exclusiva por e-mail. Para o fundador do partido opositor Primero Justicia, a população resiste à ;operação tartaruga; promovida pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para retardar o referendo revogatório do mandato de Maduro. ;Nós seguiremos validando as assinaturas até que tenhamos a maior quantidade possível de firmas validadas. Com toda a lentidão e as travas que estão colocando no processo de validação;, prometeu. Capriles denuncia uma tentativa do governo de sabotar todo o processo e destaca que o país anseia por uma mudança pacífica e eleitoral. ;Nosso povo está passando fome. Nas comunidades onde antes lhe pediam ajuda para construir moradia, agora lhe pedem comida;, lamenta.


Como avalia o fato de que milhares de venezuelanos enfrentaram filas, a fim de validar a assinatura para o referendo revogatório?
Esse é o reflexo do que vêm afirmando as pesquisas. Mais de 80% dos venezuelanos querem uma mudança, e mais de 70% desejam que ela ocorra por meio do revogatório. Nós, venezuelanos, estamos demonstrando o nosso humor. Somos um povo democrático, queremos uma mudança pacífica e eleitoral. O revogatório é um direito nosso, está em nossa Constituição. Os venezuelanos estão nas filas com um ânimo inquebrantável. Isso deveria ser uma lição para o governo de Nicolás Maduro. A Venezuela lhe falou com contundência, em 6 de dezembro, quando os deputados da Mesa de Unidade Democrática ganharam uma enorme vantagem. Hoje, nas filas, estão dando uma outra mensagem. No entanto, Maduro e sua cúpula se fazem de surdos, preferem não escutar a voz do povo. A eles só interessa se manterem no poder a todo o custo. O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) está aplicando o que se chama de ;operação tartaruga;. Eles fazem que o processo seja lento, a fim de que o povo se canse e saia das filas, para que menos pessoas validem as assinaturas. Mas ali está nosso povo venezuelano, valente e perseverante, e cansado de tanto atropelo. Como vão pedir mais tempo ao nosso povo, se temos famílias que vão para a cama sem comer? Se temos venezuelanos morrendo por falta de medicamentos? Ante isso que estamos vivendo a resposta do povo é sair às ruas e validar as assinaturas para revogar o pior governo que nossa Venezuela teve em sua história.

A oposição tem números de assinaturas suficientes para acelerar o revogatório?
Olhe... Essa etapa em que estamos é uma invenção do CNE. Não está na Constituição. Nem sequer estão no regulamento do CNE todos os passos que se tem dado. A cada dia, o CNE inventa algo novo para atrasar o processo. Como sabemos que o povo quer mudança, para não complicar mais o processo do que já está sendo feito pelas decisões de quatro senhoras reitoras do CNE e de seu chefe, Nicolás Maduro, cumprimos cada passo para avançar. Este não é um processo da Unidade, mas dos venezuelanos. O povo convoca e o povo revoga. Agora, as assinaturas sobram. Necessitávamos de quase 196 mil, e recolhemos 2,6 milhões. Nós entregamos 1,8 milhão de assinaturas para não atrasar a entrega das mesmas ao CNE. Em um invento dessas senhoras, se moveram mais de 600 mil firmas. Está bem... Ainda assim temos muitas mais. Pelo menos 1,35 milhão de venezuelanos estão convocados para validar a assinatura. Se em 6 de dezembro os deputados da Unidade obtiveram quase 8 milhões de votos, como não teremos as assinaturas de 196 mil venezuelanos? Por favor, é um verdadeiro absurdo o que essas senhoras estão fazendo. Mas, como eu lhe disse, tudo o que for necessário para irmos ao revogatório será feito. Como conhecemos do que são capazes, seguiremos validando as assinaturas até que tenhamos a maior quantidade possível de firmas validadas. Com toda a lentidão e as travas que estão colocando no processo de validação.


Há bases suficientes para que a OEA acione a Carta Democrática Interamericana e expulse a Venezuela da entidade?
Será preciso não apenas esperar a discussão da aplicação da Carta Democrática na Venezuela, mas também se haverá um grupo de amigos ; como pediram alguns países da OEA ; ou se haverá conteúdos e prazos, como pediu Luis Almagro (secretário-geral da OEA). Nós, venezuelanos, estamos lutando para que a Constituição seja respeitada e que o referendo revogatório seja realizado neste ano, para que a nossa Venezuela possa avançar.


De que modos o governo Maduro tenta sabotar o referendo revogatório?

Para começar, se a Constituição fala da necessidade de se ter as assinaturas de 20% do registro eleitoral para iniciar o processo revogatório, e o CNE inventa em um regulamento que se necessita, primeiro, recolher 1% para depois ir a esses 20%, já aqui há um obstáculo. Mas, se além disso, à margem desse regulamento lhe pedem que deve recolher outras firmas para que lhe deem a planilha para esse 1%, e ainda tem que solicitá-la várias vezes, já há outros obstáculos. E, se logo inventam novos passos, como a pré-validação do CNE, onde se tardaram 40 dias em uma etapa que não existe de forma alguma, e a semana de exclusão, já se somam mais obstáculos. A isso se soma que, para a validação das firmas, colocaram os pontos em zonas distantes e com poucos eleitores, para tratar de evitar que as pessoas o fizessem. Veja quantos obstáculos temos, sem mencionar todos os incidentes que ocorreram na jornada de validação, como trancar o trânsito nas vias até esses lugares, deter ônibus, começar tarde o processo, fazê-lo no horário de trabalho etc. As quatro senhoras do CNE e seu chefe, Nicolás Maduro, inventam a cada dia um novo obstáculo, mas temos nos esquivado de todos eles.


Quais os principais anseios da população da Venezuela em relação à mudança?
O governo de Nicolás Maduro é o governo da inflação mais alta do mundo; a escassez mais elevada do planeta; o aumento da pobreza a níveis mais elevados que quando a mal chamada revolução chegou ao poder em 1998; e a violência transbordante... Nosso povo está passando fome. Nas comunidades onde antes lhe pediam ajuda para construir moradia, agora lhe pedem comida. Você escuta a história de nosso povo e fica com o coração partido quando lhe dizem o que lhe dão de comer a seus filhos. As mães deixam de comer. Os venezuelanos devem fazer horas de filas para comprar o que há e o que lhes permite o número da carteira de identidade. Às vezes, nem isso, pois os preços, apesar de haver controle sobre eles, aumentam tanto que o salário se torna insuficiente para pagar os produtos. Há também um toque de recolher implícito, pois o medo e a insegurança fazem que você regresse mais cedo para casa e se tranque. Essa é a Venezuela que traçou esta mal chamada revolução. Essa Venezuela deve mudar, e logo.


O senhor tem planos de se candidatar a presidente nas próximas eleições? Quais seus projetos políticos?

Isso não é pelo que estamos lutando neste momento. O objetivo é um: revogar o pior governo da nossa história para que a Venezuela possa avançar. O algo mais será visto em seu momento.


A chanceler Delcy Rodríguez acusou a OEA de ter se tranformado num "tribunal de Justiça contra a Venezuela". Como vê isso?

O problema dessa senhora é que ela não representa os venezuelanos. Ela apenas defende os interesses do governo de Nicolás Maduro, não os venezuelanos.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação