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Governo da Turquia prepara revisão profunda no Exército do país

Presidente busca exercer domínio absoluto sobre militares

Rodrigo Craveiro
postado em 29/07/2016 06:00

O premiê turco, Binali Yildirim, com altos oficiais do Conselho Militar Supremo: reunião tensa e sem anúncios


Em uma clara indicação de que pretende concentrar todos os poderes e instalar na Turquia uma poderosa Presidência Executiva, o chefe de Estado, Recep Tayyip Erdogan, começa a pôr em marcha uma profunda reforma nas Forças Armadas. A ideia do presidente é colocar o Exército e o serviço secreto sob controle absoluto do governo. A limpeza nos quartéis ganhou força anteontem, com a expulsão de 149 generais e almirantes, sob a acusação de ;cumplicidade na tentativa de golpe; do último dia 15.

O primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, se reuniu por cinco horas com o que restou do Conselho Militar Supremo (YAS) para debater as bases da reforma, logo após dois altos generais ; Kamil Basoglu e Ihsan Uyar (veja o quadro) ; anunciarem a renúncia. Segundo a agência France-Presse, o encontro entre Yildirim e os oficiais terminou em clima de tensão e com semblantes de poucos amigos. A expectativa é de que as decisões da reunião, ocorrida na residência do premiê, e não no quartel-general do Exército, sejam divulgadas ainda hoje.

Enquanto tentava aparar na caserna qualquer risco de novo levante, o governo Erdogan levava adiante o expurgo nos principais setores da sociedade e se mostrava especialmente implacável com a imprensa. Na quarta-feira, as autoridades anunciaram o fechamento de 131 veículos de comunicação ; 45 jornais, 16 emissoras de televisão, três agências de notícias, 23 emissores de rádio, 15 revistas e 29 editoras. Desde segunda-feira, 89 jornalistas foram alvos de mandados de prisão. Desde o levante frustrado, Ancara iniciou uma caçada a supostos seguidores do clérigo moderado Fethullah Gulen, autoexilado nos Estados Unidos e considerado o artífice do movimento.

Autocracia islamita
Abdullah Bozkurt, ex-editor do Today;s Zaman, contou ao Correio que espera ser alvo da próxima onda de repressão. ;Minha agência de notícias, a Muhabir, foi fechada e os bens estão apreendidos pelo governo. A polícia fez uma batida em meus escritórios hoje (ontem);, relatou. ;Erdogan tem buscado transformar a democracia parlamentar secular em regime islamita autocrático governado por uma forte Presidência Executiva, sem qualquer tipo de inspeção.; Bozkurt disse ter sido demitido do Today;s Zaman, em março, quando o governo fechou o jornal, um dos diários de maior circulação na Turquia. ;Praticamente não restou qualquer mídia independendente em meu país;, lamenta.

O jornalista aposta que a situação na Turquia vai piorar. ;A nação vai se tornar mais anti-Ocidente, xenofóbica, com conspirações alimentadas pelo governo islamita. A infraestrutura econômica não será capaz de sustentar tamanha transformação radical, já que a economia turca depende do comércio e de investimentos do exterior. Esse experimento, eventualmente, fracassará, mas infligirá danos significativos ao país;, prevê Bozkurt.

Professor de sociologia da Faculdade Metropolitana de Caieiras ; Uniesp e doutor em ciência política pela USP, Fabio Metzger afirma que a Turquia está no caminho para o fechamento do pluralismo político construído pelo país ao longo de décadas. ;A questão do Exército é delicada. Se houve uma tentativa real de golpe, dado o histórico da nação, é possível contextualizar a defesa do Estado contra uma desobediência interna;, disse à reportagem. O especialista alerta que uma concentração de poderes implica na perda dos freios e dos contrapesos, fundamentais a um regime minimamente plural. ;Serão tempos difíceis. A sociedade turca terá que repensar o seu papel, tanto os setores religiosos quanto os civis.;

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