O governo da Síria aprovou neste sábado (10/09) o plano de trégua anunciado por Rússia e Estados Unidos, que pode resultar em uma campanha militar dos dois países contra os extremistas, enquanto a oposição demonstra sua cautela. Mas enquanto os diplomatas vendiam o acordo como o caminho para a paz, neste sábado vários bombardeios aéreos provocaram 24 mortes e deixaram dezenas de feridos na cidade de Idleb, noroeste da Síria.
A ONG Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH) informou que não é possível determinar a autoria dos ataques e que alguns corpos "ficaram tão queimados que estavam irreconhecíveis". Um fotógrafo da AFP na cidade viu homens escalando os escombros, apenas com chinelos ou sandálias, para ajudar a retirar os feridos, moradores e crianças cobertos pela poeira de um prédio derrubado.
Os ataques também destruíram lojas e carros no local. Investigadores da ONU disseram na semana passada que o bombardeio aéreo pelas forças sírias e seu aliado russo, principalmente em Aleppo e Idleb, estavam causando enormes baixas de civis e destruindo infraestruturas vitais. O acordo assinado na sexta-feira entre o secretário de Estado americano, John Kerry, e o ministro das Relações Exteriores russo, Serguei Lavrov, entrará em vigor na na segunda-feira, primeiro dia da festa muçulmana do Eid al-Adha.
[SAIBAMAIS]
A agência estatal síria SANA informou que "o governo aprovou o acordo e o fim das hostilidades começará em Aleppo por razões humanitárias". Ao citar "fontes informadas", a SANA destaca que o "acordo completo foi alcançado com o conhecimento do governo sírio". O Alto Comitê de Negociações (ACN), que reúne os principais representantes da oposição e da rebelião sírias, informou que aguarda o texto oficial e celebrou com prudência.
"Damos as boas-vindas ao acordo, caso seja aplicado", afirmou neste sábado Bassma Kodmani, integrante do ACN. As duas potências apoiam lados opostos no conflito: Moscou respalda o regime do presidente Bashar al-Assad, enquanto Washington auxilia a coalizão de rebeldes que considera moderados.
Os chefes da diplomacia de Estados Unidos e Rússia anunciaram o plano após uma reunião de mais de 12 horas na sexta-feira em Genebra, em uma nova tentativa de acabar com o conflito que deixou mais de 290.000 mortos e obrigou milhões de pessoas a fugir para o Líbano, Turquia e a União Europeia.
Janela de oportunidade
Tanto Kerry como Lavrov afirmaram que o plano complexo é a melhor oportunidade para acabar com a guerra entre o regime e os rebeldes, além de seguir atacando os extremistas da Frente Al-Nusra, antes vinculada à Al-Qaeda, e do grupo Estado Islâmico. A delicada questão da saída de Bashar al-Assad permanece em aberto. As potências ocidentais desejam que o presidente sírio abandone o cargo, mas a Rússia o apoia.
Um ponto chave do acordo é a entrega de ajuda humanitária aos civis que vivem nas áreas controladas pelos rebeldes em Aleppo, segunda maior cidade da Síria, cercada pelo governo. Moscou também terá que convencer a força aérea síria a interromper os bombardeios das zonas controladas pelos rebeldes, enquanto Washington terá que conseguir que os grupos da oposição se desvinculem da antiga Frente Al-Nusra, agora chamada Frente Fateh Al-Sham, que se aliou aos rebeldes em diferentes pontos do conflito.
Kodmani disse que os rebeldes devem romper os laços com os extremistas se a trégua persistir. "Os grupos moderados se reorganizarão y se distanciarão dos grupos radicais. Cumpriremos a nossa parte", declarou. Para o analista Charles Lister, do Middle East Institute, os principais grupos rebeldes observam com desconfiança os diálogos entre Rússia e Estados Unidos e parecem relutantes a separar-se dos extremistas caso o cessar-fogo não se confirme.
"Os rebeldes enfrentam agora a maior e mais crucial decisão desde que pegaram em armas contra o regime de Assad em 2011", disse o analista. O enviado especial da ONU para a Síria, Staffan de Mistura, declarou que o pacto significa uma "janela de oportunidade" e que pretende iniciar consultas com as partes para reativar os diálogos de paz.
Ao mesmo tempo, o exército israelense informou que abriu fogo contra posições militares sírias depois da queda de um "projétil" procedente da Síria nas Colinas de Golã, ocupadas por Israel. Este foi o terceiro acidente similar em menos de uma semana.