Caracas, Venezuela - A oposição venezuelana tentava nesta sexta-feira (21/10) se reerguer do duro golpe que recebeu com a suspensão do processo do referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro, que por enquanto se livra de uma saída antecipada do poder, apesar de enfrentar uma enorme rejeição popular.
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou na noite de quinta-feira (20/10) que decidiu adiar até novo aviso a coleta de quatro milhões de assinaturas que a oposição precisava reunir, de 26 a 28 de outubro, como último passo para que as autoridades convocassem a consulta.
O CNE justificou sua decisão no acatamento de decisões dos tribunais penais de vários Estados, que anularam por fraude uma primeira coleta de assinaturas de 1% do padrão eleitoral, realizada pela Mesa da Unidade Democrática (MUD) em abril para promover o referendo. "Estas decisões têm como consequência a paralisação" da etapa seguinte de coleta de 20% do colégio eleitoral, afirmou o CNE, acusado pela MUD de ser aliado do governo.
Pouco depois, o ex-candidato presidencial Henrique Capriles denunciou que um tribunal ditou uma proibição de saída da Venezuela contra ele e outros sete dirigentes opositores, incluindo o secretário-executivo da MUD, Jesús Torrealba. "Eles nos ditam proibição de saída do país! Perdem mais uma vez seu tempo", escreveu Capriles no Twitter ao publicar uma foto da notificação derivada das decisões judiciais.
[SAIBAMAIS]Neste contexto, Torrealba anunciou que "a alternativa de luta" da oposição "está sendo consultada e consensuada" e serão divulgados nesta sexta-feira os passos a serem seguidos. "Não poderão adiar a mudança que o país está pedindo", acrescentou.
Por sua vez, Capriles advertiu que Maduro não "respeita a Constituição" e está levando o país a "um cenário muito perigoso e de aumento da crise". Sem se referir diretamente às sentenças, Maduro disse antes de partir na quinta-feira em uma viagem pelo Oriente Médio que os opositores "fizeram uma fraude gigantesca" na primeira coleta de assinaturas e disse que "as trapaças" vêm à tona.
A MUD estava certa de que superaria com folga o mínimo de 20% de assinaturas do padrão eleitoral, diante da impopularidade de Maduro pela grave crise, refletida em uma aguda escassez e uma inflação que o FMI calcula em 475% neste ano.
Segundo a empresa Datanálisis, 76,5% dos venezuelanos reprovam a gestão do presidente socialista e 62,3% votariam por revogá-lo. "A oposição é maioria eleitoral, todas as pesquisas indicam isso. A MUD poderá converter esta maioria em pressão das ruas?", se perguntou Eugenio Martínez, especialista em assuntos eleitorais.
Morreu ao nascer
Os estados onde os tribunais penais deixaram sem efeito o processo são Aragua, Apure, Bolívar e Carabobo. O número dois do chavismo, Diosdado Cabello, incluiu Monagas, embora o CNE não o tenha mencionado. Luis Emilio Rondón, único dos cinco reitores do CNE próximo à oposição, disse não compartilhar a decisão porque "medidas cautelares penais não devem penalizar a expressão da soberania popular".
O constitucionalista José Ignacio Hernández disse à AFP que a decisão do CNE é "totalmente" contrária à Carta Magna, já que "um tribunal penal não pode anular um processo comicial". Há meses, o governo apresentou 8.600 ações contra o recolhimento de 1% das firmas, acrescentando que a MUD incluiu assinaturas de falecidos, menores de idade e condenados.
"Foi uma tentativa de ativação (de referendo) que morreu ao nascer. Não foi o presidente que a matou, não foram os chavistas, os que armaram a fraude a mataram", disse o líder Jorge Rodríguez.