Agência France-Presse
postado em 03/11/2016 19:19
Apoiadores do governo da Venezuela marcham nesta quinta-feira (3/11) rumo ao palácio presidencial de Miraflores, desafiando a oposição, que acusa o presidente Nicolás Maduro de descumprir os compromissos assumidos com o Vaticano na mesa de negociações.
A concentração chavista, liderada por Maduro, acontece justamente no mesmo dia em que a oposição realizaria um protesto no Miraflores contra o governo. A manifestação, contudo, foi adiada, à espera de gestos recíprocos no diálogo iniciado no domingo.
"A oposição está cumprindo (o acordado), o governo possivelmente descumprirá a palavra dada ao Vaticano", afirmou o secretário-geral da Mesa da Unidade Democrática (MUD), Jesús Torrealba.
Ao suspender o protesto no Miraflores e um processo contra Maduro por sua suposta responsabilidade na crise, a MUD deu, na terça-feira, uma trégua de dez dias ao governo para que dê mostras concretas a favor do diálogo, mas o oficialismo rejeitou esse prazo como uma "ameaça".
"Agora a MUD nos está dando 10 dias para que retifiquemos (...) Voltou a nos ameaçar. O chavismo seguirá unido, alerta, na rua", afirmou o número dois do chavismo, Diosdado Cabello.
A trégua começou mal. Na mesma noite de terça-feira, Maduro chamou de "terrorista" o Voluntad Popular (VP), o partido fundado por Leopoldo López, preso que rejeitou o diálogo por não acreditar na vontade do governo.
"Hoje o presidente está com o monsenhor prometendo coisas e depois de 24 horas está insultando e acusando de terrorista o VP. O importante é que o mundo veja que a dirigência opositora cumpre (o acordado) e merece dirigir o país", afirmou Torrealba.
Ambas as partes se comprometeram a "diminuir o tom de agressividade da linguagem utilizada no debate político", segundo o acordo que formalizou nas negociações.
Torrealba considerou a acusação de Maduro como uma tática para rachar a MUD, que já se dividiu em relação às negociações, 16 dos 30 partidos que a formam ficaram à margem do processo.
Na ocasião, a MUD pediu a liberdade dos "presos políticos" e um cronograma eleitoral, que segundo líderes opositores poderia ser um adianto das eleições gerais - previstas para dezembro de 2018 - ou uma reativação do referendo revogatório contra Maduro, suspenso há duas semanas.
A oposição considera que uma mudança de governo é a única saída para a crise que assola o país, com um grave desabastecimento de alimentos e medicamentos e uma inflação que o FMI estima em 475% para este ano.
Protestos com ou sem diálogo
Apesar da suspensão da marcha opositora até Miraflores, cerca de 300 estudantes se concentraram em uma estratégica avenida de Caracas, apoiados por dirigentes do VP, e entregaram na Nunciatura Apostólica uma carta em que pedem a libertação dos opositores, a solução para a crise econômica e um processo eleitoral.
"Com diálogo ou sem diálogo manteremos nossas exigências e nas ruas em protesto", disse Hasler Iglesias, dirigente estudantil da Universidade Central da Venezuela.
No centro de Caracas, podiam ser vistas concentrações de chavistas que se dirigiam a Miraflores.
"Estamos mobilizados para defender a democracia, a revolução. Há uma ameaça permanente, por isso o povo não pode deixar de se mobilizar", declarou o líder da bancada do governo no Parlamento, Héctor Rodríguez.
Há vários dias, dezenas de jovens chavistas de diversas regiões do país instalaram um acampamento nos arredores do Miraflores, para esperar o que seria a manifestação opositora.
"Um grupo sem ovários e sem culhões veio ameaçar nosso presidente e por isso aqui está a juventude revolucionária defendendo o presidente Nicolás Maduro", declarou à AFP Tony Bata, em sua barraca de camping.
Segundo o governo, esse protesto era parte de um "livreto" que buscava replicar os fatos de 11 de abril de 2002, quando uma enorme mobilização ao Miraflores resultou em confrontos com 19 mortos e um golpe de Estado que tirou Hugo Chávez do poder durante três dias.
Desde que a MUD assumiu a maioria parlamentar em janeiro passado vive uma forte disputa com boa parte do poder público, acusado de servir ao chavismo.
Eleições no primeiro trimestre de 2017
Segundo um dirigente da MUD, a oposição venezuelana planeja dialogar com o governo sobre a antecipação das eleições para o primeiro trimestre de 2017.
"Para nós, o adiantamento das eleições tem que ser o quanto antes. Nossa proposta, que levamos à negociação, é a reativação do referendo revogatório ou o adiantamento das eleições para o primeiro trimestre do ano de 2017", disse Carlos Ocariz em coletiva de imprensa.
O líder opositor não informou se a proposta se refere a eleições presidenciais ou gerais, como sugeriram outros porta-vozes da MUD.
"A nossa contraparte tem uma visão distinta, disso que se trata esse esforço por parte do Vaticano", acrescentou Ocariz.
"Estamos lá (na negociação) porque queremos uma solução eleitoral para a profunda crise produto das nefastas políticas do governo", disse o dirigente, informando que a as partes participarão de uma reunião no dia 11 de novembro, em que a MUD espera que haja avanços neste e nos demais temas da agenda.