Agência France-Presse
postado em 16/01/2017 19:21
Os venezuelanos começaram a usar as novas cédulas que excedem em até 200 vezes a nota de maior valor atual, medida com a qual o governo tenta controlar a inflação mais alta do mundo.
Os bancos de Caracas entregaram as novas cédulas de 500, 5.000 e 20.000 bolívares, que deveriam começar a circular em dezembro, mas que segundo o presidente Nicolás Maduro sofreram atraso por uma "sabotagem" dos Estados Unidos.
Após mais de um mês de espera, alguns venezuelanos se mostraram incrédulos e outros enfrentaram as primeiras dificuldades.
"Um cliente chegou com várias notas de 5.000 e queria me pagar um café (que custa 150 bolívares). Lhe disse que não, como faço para dar o troco?" - contou à AFP Luis Ubillús, comerciante do centro da capital.
Até o último domingo a nota de mais alto valor era a de 100, que passou a ser uma moeda e serve para muito pouco. Um cigarro, por exemplo, custa 200 bolívares.
Essa nota foi substituída pela de 20.000 (cerca de 30 dólares), que representa a metade do salário mínimo.
"No caixa, nos deram várias notas de 500 e a um senhor, a de 20.000", disse um jovem ao sair de um banco, enquanto mostrava as notas. As pessoas ao redor fotografavam a novidade com seus celulares.
Inflação sem controle
Com as novas notas, o governo busca um paliativo para os efeitos da inflação, que o FMI calcula em 475% durante 2016 - a mais alta do mundo - e em 1.660% para este ano.
O governo não divulgou dados do custo de vida em 2016, mas os venezuelanos sentem diariamente seus desvalorizados bolívares evaporar.
Desde 8 de janeiro, o salário mínimo subiu para 40.638 bolívares (60 dólares pelo câmbio oficial e 11,4 pelo mercado negro), muito abaixo do necessário para completar a cesta básica, segundo estimativas privadas.
"Essa medida facilita a vida para o venezolano, mas não deterá a inflação. As moedas e cédulas do país só representam 8% de toda a liquidez monetária, a maior pressão está nas transações eletrônicas", explicou à AFP a economista Anabella Abadi.
Seu colega Orlando Ochoa considera que a atualização da moeda deveria ter sido feita há três anos. "Essas novas moedas facilitam as transações, não geram inflação, mas as pessoas sabem que seu dinheiro perdeu valor", argumentou.
Problemas persistem
Os bancos só entregavam nesta segunda-feira as notas nos caixas, sem a opção de saque no caixa eletrônico.
Um gerente de um banco estatal de Caracas disse à AFP na condição de anonimato que as máquinas ainda não foram programadas para essa distribuição.
"Há um problema técnico associado ao tamanho ou ao desenho das notas. Consertar isso em todo o país pode levar 90 dias", afirmou Abadi.
Maduro disse na semana passada que o Banco Central da Venezuela (BCV) recebeu 60 milhões de notas de 500 bolívares, 4,5 milhões de 5.000 e 2,9 milhões de 20.000.
Em novembro circulavam 6,1 bilhões de notas de 100 bolívares, segundo o BCV. As notas novas que chegaram representam apenas 18% do valor dessa massa monetária.
"As novas notas são insuficientes, é difícil acreditar que as notas de 100 sairão de circulação no dia 20 de fevereiro", disse Abadi.
O presidente anunciou em dezembro a retirada da nota de 100, antes da nova emissão, ao denunciar que "máfias" que operam nas fronteiras com Brasil e Colômbia extraíam a moeda para deixar o país sem dinheiro e desestabilizar a economia.
Entretanto, três dias depois ampliou sua vigência diante do atraso das novas cédulas, o que provocou distúrbios pela falta de dinheiro, com quatro mortos e centenas de lojas saqueadas.
Também para combater as supostas máfias, que segundo Maduro desvalorizam a moeda e alimentam o mercado negro, o governo autorizou nesta segunda-feira a operação de oito casas de câmbio na fronteira com a Colômbia.
Essa é a primeira medida de um novo decreto de emergência econômica, similar ao que deu amplas faculdades ao governo nesta matéria em 2016.