Agência France-Presse
postado em 22/04/2017 17:07
Na esteira de um grande número de marchas pela ciência no mundo todo, cerca de mil pessoas começaram a se reunir neste sábado (22) pela manhã, em Washington, para defender a pesquisa científica, que consideram ameaçada pelo governo de Donald Trump.
Após os discursos de mais de 60 pessoas, entre elas Nancy Roman, responsável pelos programas de astronomia da Nasa, está previsto que a manifestação, que coincide com o Dia Mundial da Terra, seja concluída com uma marcha em direção ao Capitólio, sede do Congresso americano.
Outras cidades americanas, como Nova York, registraram mobilizações semelhantes, e mais de 600 marchas estão previstas no mundo todo. Já foram realizados eventos similares em Londres, Paris, Gana, Nova Zelândia e Austrália.
"Estou preocupada com a retórica anticiência dessa administração e com sua falta de conhecimento científico", diz à AFP a bioquímica Kathy Ellwood, que se dirigia à grande esplanada do National Mall.
"Eles têm de entender que os fatos científicos são apolíticos, e escutar os seus cientistas", acrescenta.
"Se esse presidente (Donald Trump) puder impôr suas decisões, a ciência estará em perigo", opina a bióloga aposentada Elisabeth Johnston, de 71 anos.
"Mas acredito que haverá muita resistência no Congresso", completa.
Kara Lukin, de 45 anos, professora de imunologia da Universidade Western Governors, que viajou de Denver (Colorado, centro) a Washington com a filha de seis anos, espera "que esta marcha represente o início de uma mudança nos Estados Unidos, onde a ciência e a educação foram desvalorizadas nos últimos anos".
A ciência ameaçada
Esses cientistas ecoam as afirmações de Rush Holt, presidente da Associação Americana pelo Avanço da Ciência (AAAS), a maior organização científica do mundo, com 120.000 membros.
Na quinta-feira, Holt disse que "os pesquisadores percebem cada vez mais que os fatos científicos são ignorados com frequência nos debates públicos e substituídos por opiniões e crenças ideológicas".
Esse fenômeno apareceu há várias décadas e se agravou recentemente, segundo esse cientista nuclear, antigo membro da Câmara de Representantes, que aponta que o orçamento geral de pesquisa representa hoje menos da metade que o dos anos 1960, em porcentagem do Produto Interno Bruto (PIB).
"Não podemos ficar de braços cruzados e supor que todo mundo compreende até que ponto a ciência é crucial para a economia, segurança nacional, meio ambiente, saúde humana e muitas outras coisas", considera o presidente da União Geofísica dos Estados Unidos, Eric David, que defende esta marcha, apoiada por mais de 220 organizações científicas e institutos de pesquisa do mundo todo.
"Precisamos da tecnologia e da inovação americana para resolver o problema" das mudanças climáticas, aponta Myles Allen, diretor do programa de pesquisa climática da Universidade de Oxford.
Pouco depois de chegar à Casa Branca, Trump assinou decretos para revogar regulações ambientais promovidas por seu predecessor democrata, Barack Obama, e nomeou o cético do clima Scott Pruitt para a direção da Agência de Proteção Ambiental (EPA).
"Um mito"
Ao longo da campanha, Trump defendeu que as mudanças climáticas eram "um mito" e prometeu tirar os Estados Unidos do Acordo de Paris sobre o clima, o qual prevê a redução de emissões de gases de efeito estufa. Essa decisão continua sendo debatida por seus conselheiros.
Seu primeiro projeto de orçamento propõe uma redução de 31% dos fundos destinados à EPA e cortes nas subvenções aos institutos nacionais de saúde.
Os organizadores da mobilização insistem em que esta não tem motivações políticas, mas alguns cientistas temem que seja contraproducente, já que os conservadores percebem-na como orientada à esquerda.
"Uma marcha não pode comunicar a importância da pesquisa, especialmente sobre o clima, aos nossos homens políticos e aos americanos que ignoram totalmente a ciência", adverte o professor de geologia Robert Young, da Universidade Western Carolina.
"Os cientistas têm de mudar a maneira de se comunicar com os grupos de americanos", aponta.
A ideia da marcha pela ciência nasceu no dia seguinte da posse de Donald Trump, quando foram organizadas em todos os Estados Unidos e em outros países marchas das mulheres em defesa dos direitos cívicos, que mobilizaram mais de dois milhões de pessoas.
Outra marcha, pelo clima, está prevista para o próximo 29 de abril.