Agência France-Presse
postado em 27/05/2017 08:58
Caracas, Venezuela -A oposição exortou nesta sexta-feira os militares a cessar a "repressão" na Venezuela e a retirar seu apoio ao presidente Nicolás Maduro, que tem nas Forças Armadas sua principal sustentação.
A oposição voltou às ruas de Caracas nesta sexta-feira, no 56; dia de protestos que já deixaram 57 mortos, e planejava chegar a Los Próceres, zona militar de Caracas, onde fica o ministério da Defesa, perto do emblemático Forte Tiuna, a maior instalação militar do país petroleiro, mas foi impedida pela Guarda Nacional, que utilizou jatos d;água e bombas de gás lacrimogêneo.
Várias pessoas ficaram feridas em Caracas, incluindo o deputado opositor Carlos Paparoni, atingido na perna por um objeto contundente.
Este protesto é "para exigir das Forças Armadas que baixe suas armas e não seja cúmplice da ditadura", disse Freddy Guevara, vice-presidente do Parlamento, único poder controlado pela oposição.
Guevara exortou os militares a rejeitar a Assembleia Constituinte convocada por Maduro, que segundo ele "liquidará a democracia venezuelana para sempre".
À oposição soma-se assim a um grupo de militares reformados, que denunciou os "atropelos" de seus colegas da ativa contra manifestantes e expressou seu repúdio à Constituinte proposta por Maduro, que quer introduzir "um regime comunista".
Na noite desta sexta-feira, manifestantes queimaram um ônibus em Altamira, bairro de classe média no leste da Caracas, e levantaram barricadas em várias zonas da cidade.
A oposição anunciou que voltará às ruas no sábado "pela liberdade de expressão", no leste de Caracas e em vários Estados, para recordar o décimo aniversário do fechamento da RCTV, por decisão do então presidente, Hugo Chávez.
As manifestações ocorrem depois de a procuradora-geral, Luisa Ortega, de 59 anos, responsabilizar a militarizada Guarda Nacional pela morte de um jovem e de mais de 500 feridos durante os protestos.
Em claro desafio ao governo, Ortega, chavista confessa, destacou que a morte de um jovem durante um protesto em Caracas foi provocado pelo impacto de uma bomba de gás lacrimogêneo e não por uma pistola de abate usada pelos manifestantes, como afirmam as autoridades venezuelanas.
"Mais da metade dos feridos se deu pela ação de forças de segurança", disse.
O ministro do Interior e Justiça, general Néstor Reverol, defendeu a atuação dos corpos de segurança, ao mesmo tempo em que a acusou a Procuradoria de promover um "clima de impunidade" diante de atos de violência de opositores.
Vários líderes opositores, como o presidente do Legislativo, Julio Borges, pediram à Força Armada para respeitar a lei ao denunciar uma forte "repressão".
"Não queremos que uma Força Armada que se passe para a oposição, queremos uma Força Armada que se passe para a Constituição", expressou Borges recentemente.
O governo responsabiliza os opositores, alguns armados com pedras e coquetéis molotov, de confrontos fora de controle. Mas seus adversários afirmam que têm que se defender das bombas de gás lacrimogêneo, das balas de borracha e, inclusive, de munição letal.
"Sim à Constituinte"
No outro extremo da cidade, uma maré vermelha de chavistas com cartazes com dizeres como "Sim à Constituinte" se dirige ao Palácio Presidencial de Miraflores, em apoio ao projeto convocado pelo presidente Maduro.
"Estamos mobilizados em apoio a uma Constituinte, uma Constituinte da paz e do futuro", destacou Kennedy Morales, líder estudantil de 24 anos.
Esta semana, o governo ativou o projeto - cuja votação está prevista para o fim de julho. O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) inclusive convidou os candidatos a se inscreverem na quinta e na sexta-feira da próxima semana.
A iniciativa é rejeitada de pronto pela oposição, alegando que com este projeto o único que Maduro quer é se perpetuar no poder.
A oposição e vários analistas advertem, ainda, que o sistema de eleição da Constituinte - ao qual chamam de fraudulento - nega o voto universal e envolverá apenas as bases setoriais fiéis ao chavismo.
Maduro esclareceu que serão eleitos 540 constituintes, 364 por municípios e 176 em votações por setores sociais como trabalhadores, indígenas e camponeses. Mas cada candidato deve receber luz verde do CNE, acusado de servir ao governo.
O governo acusa a coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) de "atos de terrorismo" para desencadear um golpe de Estado.
Nos últimos dias, Maduro denunciou uma "corrente nazi-fascista" que - sustenta - cresce na oposição. Segundo ele, os chavistas são "os judeus do século XXI".
Os protestos se multiplicam em meio a uma severa crise econômica, com uma inflação descontrolada - estimada em 720% pelo FMI para 2017 - e uma escassez de alimentos básicos e medicamentos.
Isto afeta ainda mais a popularidade de Maduro, cujo governo é desaprovado por sete em cada dez venezuelanos, segundo pesquisas privadas.