Agência France-Presse
postado em 22/06/2017 15:40
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, lançou poderosas figuras de seu governo como candidatos à Assembleia Constituinte, cuja eleição, em 30 de julho, enfrenta um repúdio crescente de opositores e chavistas dissidentes.
Em plena escalada da crise, com uma onda de protestos que dura quase três meses, Maduro concluiu na quarta-feira as mudanças de gabinete para completar suas postulações à Constituinte, nas quais se destacam o deputado Diosdado Cabello, a chanceler Delcy Rodríguez e sua esposa, Cilia Flores.
[SAIBAMAIS]"A Constituinte de Maduro foi feita como um terno sob medida [...], não vai resolver o problema das filas [que se formam pela escassez de alimentos], nem do custo de vida, nem da insegurança", disse nesta quinta-feira Julio Borges, chefe do Parlamento.
A Assembleia Constituinte é rechaçada pela procuradora-geral, Luisa Ortega, que a considera um retrocesso nos direitos humanos e na democracia, e pela oposição, que a vê como uma fraude com a qual Maduro, dizem, pretende instalar um sistema como o cubano.
A oposição chamou os venezuelanos a desconhecer o governo e a Constituinte, e anunciou o início nesta quinta-feira do que chama de a "fase decisiva" de sua ofensiva para retirar Maduro do poder, com uma marcha em apoio à procuradora, chavista confessa hoje considerada traidora pelo governo.
Acompanhando a marcha em Caracas, são previstas mobilizações em todo o país até os gabinetes regionais da Procuradoria, em uma nova jornada de manifestações que deixam 74 mortos desde que começaram, em 1; de abril.
"Um refúgio para resistir"
Respaldado por decisões do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) e do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Maduro avança com seu projeto de Constituinte, que considera fundamental para devolver a estabilidade política e econômica ao país.
"Vão fazer história, história grande neste país", assegurou ao agradecer aos funcionários que deixaram seus cargos para lançar suas candidaturas à Constituinte.
Além de Cabello, Rodríguez e Flores, há a deputada e ex-ministra da Defesa Carmen Meléndez, o ex-vice-presidente Aristóbulo Istúriz e o ex-ministro e ex-governador Adán Chávez, irmão do falecido presidente Hugo Chávez.
Cabello, vice-presidente do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), é mencionado por setores da oposição como o futuro presidente da Constituinte, com a qual ampliaria ainda mais a sua influência que, segundo os especialistas, já é vista no governo, na Força Armada e nos aparatos de Segurança e de Inteligência.
A Constituinte irá reger o país por um tempo indeterminado como um "superpoder" e será composta por 545 legisladores, que, de acordo com a oposição, serão eleitos por um sistema "fraudulento" que garantirá o controle pelo governo.
"A Constituinte é para o PSUV, mas, sobretudo, para o ;madurismo;, [e será] apenas um guia, uma desculpa para obter um maior poder de negociação, um refúgio para resistir", assegurou o cientista político Michael Penfold.
";Boomerang; político"
Mas os analistas advertiram que a iniciativa de Maduro, além de intensificar a crise, pode agradar a fissura aberta pela procuradora. "Provavelmente também acabará sendo um afiado ;boomerang; político", acrescentou Penfold.
Em uma carta assinada pelo arcebispo Bernadito Auza, observador permanente da Santa Sé na ONU, o Vaticano advertiu que a Constituinte "coloca em perigo o futuro democrático do país".
"O Vaticano, a procuradora, setores da Força Armada, diferentes atores do governo e atores internacionais estão vendo a nossa luta contra a ditadura, não apenas contra a Constituinte", disse o deputado opositor Juan Requesens, prestes a iniciar a marcha até o Ministério Público para expressar o apoio à procuradora.
Ortega, que denunciou que a Justiça é usada para "perseguir a dissidência política", enfrentará um possível julgamento depois que o TSJ aceitou um recurso do deputado da situação Pedro Carreño, que também pediu a sua destituição por "insanidade mental".
A procuradora lidera um grupo de chavistas que sustenta que Maduro "está destruindo o legado" de Chávez.
Penfold acredita que o governo está ameaçado à medida que "as fissuras dentro do chavismo e da esfera militar se aprofundam". Mas ainda não é certo que isto aconteça.
Esta semana, Maduro anunciou a renovação da cúpula da Força Armada e ratificou como ministro da Defesa o general Vladimir Padrino López, que lhe declarou "lealdade incondicional".