Agência France-Presse
postado em 14/07/2017 19:00
O ex-presidente peruano Ollanta Humala e sua esposa, Nadine Heredia, passaram sua primeira noite na prisão após se entregar à justiça acatando a ordem de 18 meses de prisão preventiva, no caso de lavagem de dinheiro por recebimento de fundos da Odebrecht para a campanha eleitoral.
O casal, pais de três filhos menores de idade, dormiu na cela do Palácio da Justiça, de onde serão enviados para centros de reclusão separados ainda nesta sexta-feira.
Ironicamente, Ollanta Humala ficará preso com o ex-presidente Alberto Fujimori, contra quem se rebelou em 2000 quando era militar.
Fujimori cumpre pena de 25 anos por corrupção e crimes contra a humanidade em uma unidade da polícia ao leste de Lima. Ali, ele ocupa um amplo espaço e se dedica à jardinagem.
Por sua vez, Nadine Heredia ocupará uma cela no presídio feminino ;Virgem de Fátima;, em Lima.
"Estão psicologicamente bem, fortalecidos pela decisão de submeter-se à autoridade do juiz. Quantos políticos no Peru são capazes disso?" - ressaltou o advogado do casal, Wilfredo Pedraza.
[SAIBAMAIS]A prisão de Humala é parte de um triste cenário sobre o prestigio da classe política: quatro dos últimos cinco presidentes em 25 anos estiveram envolvidos em escândalos de corrupção.
O presidente Pedro Pablo Kuczynski mencionou os esforços da justiça para acabar com a corrupção, em meio aos casos envolvendo a construtora Odebrecht.
"A imagem do Peru (na luta anticorrupção) é boa, é um país que tomou medidas drásticas, com um grande custo econômico, sem dúvida, mas que estão surtindo efeitos", disse o presidente a jornalistas.
Kuczynski classificou de "histórica" a decisão judicial, informando que "no fim das contas o que está acontecendo é muito triste". "É um dia trágico para a família de Ollanta e Nadine", acrescentou.
Além de Humala (2011-2016) e Fujimori (1990-2000), presos, os ex-presidentes Alejandro Toledo (2001-2006) e Alan García (2006-2011) estão sendo processados por corrupção.
Toledo vive nos Estados Unidos, de onde o Peru tenta extraditá-lo para que cumpra 18 meses de prisão preventiva por um suposto suborno de 20 milhões de dólares da Odebrecht. García, por sua vez, é investigado pelo caso do metrô de Lima, que a Odebrecht construiu em troca de subornos de funcionários do seu governo.
"Lamento que ex-presidentes da República estejam comprometidos em investigações de corrupção", disse à rede CNN o presidente do Poder Judiciário, juiz Duberlí Rodríguez.
Humala estreou na política na 2006 como candidato presidencial com apoio do venezuelano Hugo Chávez, antes de alinhar-se em 2009 com o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Russeff, que o apoiaram nas eleições de 2011 como parte da projeção geopolítica do Brasil na região.
A esquerda ladeira a baixo
"A esquerda está perdendo o predomínio no negócio da ética política", avaliou o analista Mirko Lauer.
A prisão de Humala ocorre na mesma semana que o ex-presidente Lula foi condenado a 9 anos e meio de prisão. Na Argentina, Cristina Kirchner é investigada por corrupção.
"Se hoje há mais presidentes de esquerda com problemas é porque a esquerda ganha as eleições há 10 anos ou mais na América Latina. Se a direita tivesse ganhado, teria o mesmo problema", disse Lauer à AFP.
O selo Odebrecht
O juiz Richard Concepción Carhuancho determinou a prisão preventiva de Humala na quinta-feira acolhendo o pedido do procurador Germán Juárez, que alegou risco de fuga ou de pedido de asilo do ex-casal presidencial. A prisão "é idônea e necessária para garantir a investigação", afirmou o juiz na decisão.
Segundo o Ministério Público, a Odebrecht entregou três milhões de dólares em 2011 a Humala, o que o ex-presidente nega, embora argumente que a lei peruana não proíbe contribuições de campanha do exterior. No caso da campanha eleitoral de 2006, o procurador garante que Humala recebeu recursos da Venezuela.
O pedido de prisão preventiva se baseou fundamentalmente na delação do empresário Marcelo Odebrecht, que garantiu ao procurador Juárez ter doado três milhões de dólares para a campanha eleitoral.
A Odebrecht revelou ter pago 29 milhões de dólares em subornos no Peru para obter obras públicas entre 2005-2014.