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Venda de maconha estatal no Uruguai enfrenta seu maior desafio: os bancos

O espanhol Banco Santander avisou aos farmacêuticos que vendem maconha que encerraria suas contas


Na última quinta-feira, o estatal Banco República (BROU), que alguns viam como alternativa ao setor privado, anunciou que também não ia fazer essa operação. O presidente, Jorge Polgar, manifestou ao jornal El Observador que, caso contrário, "provocaria o isolamento financeiro do BROU e de seus clientes, impedindo-lhe de realizar qualquer tipo de operação com contrapartida internacional".

Sem soluções à vista
A preocupação entre os farmacêuticos é patente. Alguns já expressaram a intenção de deixar de vender maconha. A decisão dos bancos, que querem cumprir sobretudo a normativa americana, parece ter surpreendido as autoridades uruguaias.

"A verdade é que não sabíamos que isso poderia acontecer", expressou o ministro da Economia, Danilo Astori, citado pelo jornal La República. "É preciso encontrar o caminho, e estamos buscando-o" para compatibilizar o cumprimento da lei aprovada no Uruguai com as normas internacionais, completou.

A ameaça que paira sobre a venda legal de maconha é um "risco certo", manifestaram à AFP fontes vinculadas à elaboração da legislação. Ao mesmo tempo, Mujica, pai da iniciativa, lançou uma dura advertência ao atual governo de Tabaré Vázquez, seu sucessor de seu partido. "Se isso estiver bloqueado, todo o Parlamento será bloqueado", disse o atual senador, cujo bloco político possui a maior bancada do Congresso.

Segundo o professor da Universidade da República Adolfo Garcé, consultado pela AFP, Mujica pensa no sistema "como se fosse seu filho. Ele suportou bem certas dilatações" para implementá-lo, "mas acabou sua paciência. Ele faz ameaças bem a sério".

Imprevisto
Julio Calzada, um dos principais promotores e articuladores do projeto que virou lei quando estava à frente da Junta Nacional de Drogas, disse à AFP que "há alternativas" a médio prazo, mas que ainda "não estão no Uruguai". "Nós temos que gerenciá-las com os bancos norte-americanos".

"O Uruguai trabalhou muito seriamente acerca desse tema", afirmou Calzada, que indicou que todos os órgãos do controle de drogas do Estado, assim como o Ministério da Economia, participaram da discussão da Lei de Regulamentação da Cannabis, e lembrou que no Uruguai o "sistema de comercialização (em farmácias) é legal".

Esse trabalho "atinge o governo e a Frente Ampla", estimou o cientista político Garcé. "Depois de tanto tempo discutindo o assunto, depois de tantos avanços concretos, depois de ter plantado a maconha, depois de ter colhido ela, depois de ter chegado às farmácias, não poder comercializá-la por um problema que não tinha sido previsto é um golpe muito duro", resumiu. Além disso, "para o Uruguai esse assunto se transformou em uma bandeira, em publicidade favorável ao país", refletiu.