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Cuba e o enigma dos 'ataques acústicos' a diplomatas dos EUA

Até 14 de setembro eram 21 os afetados, com um último "incidente" registrado em agosto, segundo Washington

O caso obscuro dos "ataques acústicos" em Cuba contra diplomatas dos Estados Unidos, que envenena as relações bilaterais há mais de nove meses, parece longe de ter um desenlace, pois as diferentes pistas exploradas levam a becos sem saída.

[SAIBAMAIS]Agressões dirigidas, sabotagem, acidente? Cerca de trinta diplomatas americanos, mas também canadenses, assim como seus familiares, sentiram sintomas importantes de origem desconhecida no mesmo período.

Um cenário digno de romance de espionagem, que alimenta os boatos e evoca as lembranças dos complôs mais extravagantes da Guerra Fria.

Os fatos


Os primeiros fatos suspeitos foram reportados no fim de 2016, mas o governo americano esperou até agosto deste ano para falar dos misteriosos "sintomas físicos" observados em vários funcionários de sua embaixada.

Alguns sofreram "enxaquecas, náuseas", mas também "leves lesões cerebrais de origem traumática e perda definitiva de audição", revelou depois a diplomacia americana.

Até 14 de setembro eram 21 os afetados, com um último "incidente" registrado em agosto, segundo Washington.

Do lado do Canadá, uma fonte próxima à embaixada informou, sob a condição de ter sua identidade preservada, que mais de cinco famílias foram afetadas, inclusive crianças, mas "nenhum caso grave" foi reportado até o momento.

Funcionários americanos disseram a jornalistas suspeitar do uso de dispositivos acústicos de origem desconhecida, com o objetivo de socavar a "integridade física" dos diplomatas. Havana negou formalmente qualquer implicação e lançou uma investigação.

Em 23 de maio, sem esperar seu desenvolvimento, os Estados Unidos tomaram a primeira represália ao expulsar discretamente dois diplomatas cubanos. Washington não considera Cuba culpada, mas a julga responsável como país anfitrião.

O secretário de Estado, Rex Tillerson, falou de um possível fechamento da embaixada em Cuba. Em resposta, Havana preveniu contra qualquer "politização" do caso.

Tillerson teve na terça-feira uma discussão "firme e franca" sobre o tema com seu contraparte cubano, Bruno Rodríguez, informou o Departamento de Estado, sem dar detalhes.

Ondas nefastas?


A investigação ainda não teve resultados, mas "tantas famílias afetadas ao mesmo tempo não é banal. Não pode ser acaso", diz uma fonte próxima à embaixada canadense.

Evocada em Washington, a emissão dirigida de ondas nocivas a partir de um dispositivo não detectável é "totalmente possível de um ponto de vista técnico", assegurou à AFP Denis Bedat, especialista em bio-eletromagnetismo.

"As ondas ultrassônicas, que se situam além da capacidade acústica do ser humano, podem ser difundidas com um amplificador. O dispositivo não tem que ser de grande tamanho e pode ser ativado dentro ou fora de uma casa", explica o especialista francês.

Bedat deu como exemplo o Active Denial System (ADS), um canhão anti-distúrbios criado nos Estados Unidos, que permite dirigir ondas eletromagnéticas para as pessoas escolhidas, causando-lhes uma sensação insuportável de calor.

Pesquisas e boatos


Segundo fontes americanas citadas por veículos locais, o presidente Raúl Castro informou ao chefe da missão de Washington sobre sua perplexidade ante este assunto e, em um fato incomum, autorizou o FBI e a Polícia canadense a realizar investigações em Havana.

Muitos observadores duvidam que Havana tenha se arriscado nestas ações no fim de 2016, quando as relações entre os antigos inimigos da Guerra Fria estavam em pleno auge. Depois se deterioraram com a chegada ao poder de Donald Trump.

O mesmo ocorre com o Canadá, principal provedor de turistas a Cuba e país com o qual os vínculos são muito bons. Segundo diplomatas canadenses, Ottawa não vê como suspeitos os altos funcionários cubanos.

As especulações abundam em ambos os lados do estreito da Flórida. Alguns apontam à iniciativa de agentes cubanos desertores, outros a um terceiro país interessado em afetar as relações entre Cuba e Estados Unidos, como Rússia ou Coreia do Norte.

Mas a hipótese mais recorrente aponta para a possível incidência de um sistema de escuta defeituoso ou mal controlado, uma opção reforçada pela reputação de "grandes ouvidos" que Cuba tem.

No entanto, esta é rechaçada por especialistas que destacam que um sistema de escuta não está desenhado para a difusão. E, segundo veículos americanos, os investigadores do FBI não encontraram evidências durante as buscas minuciosas realizadas nas casas das vítimas.

"Não temos resposta definitiva sobre a origem ou a causa dos incidentes", reconheceu na terça-feira um encarregado do Departamento de Estado, enquanto Havana anunciou ter tomado "medidas adicionais de proteção dos diplomatas americanos e seus familiares".

No entanto, "a questão é que tem gente que não está bem e ainda não sabemos porque", lamentou a fonte próxima à embaixada canadense.