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China cria uma nova rota da seda em um porto perdido do Paquistão

Situado em uma península árida no mar Arábico, Gwadar ("porta do vento", na língua balúchi) foi escolhido por sua localização estratégica, que a longo prazo poderia lhe render um importante papel no comércio mundial

Agência France-Presse
postado em 25/10/2017 14:25

O modesto e periférico porto pesqueiro de Gwadar, no sul do Paquistão, parece ter muita sorte. A China o elegeu para estabelecer as bases de um ambicioso projeto de desenvolvimento, com vocação comercial internacional.

[SAIBAMAIS]Situado em uma península árida no mar Arábico, Gwadar ("porta do vento", na língua balúchi) foi escolhido por sua localização estratégica, que a longo prazo poderia lhe render um importante papel no comércio mundial. A cidade vai ser tornar a porta do Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC), um projeto de 54 bilhões de dólares lançado em 2013 para conectar o oeste da China com o oceano Índico, via Paquistão.

O CPEC é um eixo da iniciativa chinesa "One Belt One Road", para o desenvolvimento de um cinturão terrestre e de rota marítima, que envolve cerca de 65 países. Para o Paquistão, esse é um desafio gigantesco, já que o país sofre com instituições frágeis, numerosos grupos violentos de inspiração jihadista ou separatista e uma corrupção endêmica.

"Este porto vai ajudar o Paquistão a estabelecer vínculos com os países vizinhos. Toda a nação vai se beneficiar de Gwadar, mas especialmente os habitantes locais e os do oeste do Paquistão", diz o presidente da administração portuária Dostain Khan Jamaldini. A província do Baluchistão é uma das mais pobres e violentas do país.

A população considera que Islamabad lhe deixa à margem e retira todos os seus hidrocarbonetos e minerais. Os insurgentes separatistas têm atacado repetidamente as obras do CPEC e os trabalhadores chineses. O projeto prevê, para 2055, o primeiro porto de águas profundas do país, uma zona franca para a indústria e 50 km de cais - tudo perto do estratégico estreito de Ormuz.

Apesar de depender da participação financeira chinesa, o projeto está aberto a outros investidores. "O porto de Gwadar não é chinês: nosso parceiro principal é chinês e nós apreciamos sua audácia", disse Jamaldini.

Território disputado

Há anos, a China está interessada em Gwadar, onde já financiou parte de um porto e, em 2013, assumiu o contrato de exploração que estava nas mãos de um grupo de Cingapura.

Mas o CPEC não é uma unanimidade. A Índia critica que atravesse a Caxemira, objeto de discórdia entre os dois países. Esse argumento é admitido pelo chefe do Pentágono, Jim Mattis, e interpretado por Islamabad como uma tentativa de "conter a China". Além da diplomacia, outra questão-chave é a segurança em Gwadar, reconhece o oficial Kamal Azfar, comandante da "Brigada 440", criada para proteger o CPEC.

Além disso, há escassez de água e eletricidade, e a região está exposta à especulação imobiliária, diz Sajjad Baloch, diretor da Gwadar Development Authority. Também não há abundância de mão de obra qualificada, diz Mohamed Siddique, diretor de um moderno hospital local, mas inutilizado devido à "escassez de especialistas".

Chinatown

Em Gwadar, a atividade econômica relacionada ao CPEC é limitada. Há apenas um navio ancorado no porto três ou quatro vezes por mês. Cerca de 300 chineses ligados ao projeto residem em "Chinatown" - em casas pré-fabricadas e dispostas de forma retangular, de onde só saem sob escolta da "Brigada 440".

Os 100 mil habitantes da cidade viviam, até então, de pesca e da construção de pequenas embarcações. Até 50 mil pessoas poderiam ser realojadas "gradualmente" para abrir espaço, e o porto pesqueiro mudaria de lugar. A população deve aumentar consideravelmente.

Os empregos serão para todos os moradores locais, afirma Baloch, seguidos "dos balúchis e, na sequência, do resto do Paquistão". Mas, por ora, poucos se beneficiariam, afirmam trabalhadores que produzem barcos na praia. "Esperemos que nos contratem", disse um deles, Juneid, que sonha com uma vida melhor para seus filhos.

"Seria um azar que os balúchis não se beneficiassem, porque agravaria a sensação de privações que existe há décadas", afirma Abdulá Usman, um assistente social.

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