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Campanha contra assédio sexual chega ao Egito

Segundo um estudo da ONU publicado em 2013, mais de 99% das mulheres já foram vítimas de assédio no Egito

Agência France-Presse
postado em 07/11/2017 14:58
A campanha contra o assédio sexual, através da qual mulheres do mundo todo compartilham suas experiências utilizando a hashtag #MeToo, chegou ao Egito, o país árabe mais povoado e onde esse problema é alvo de uma luta diária.

"Parei de caminhar na rua (...) e gastei metade do meu salário, umas 1.500 libras (70 euros) em táxis só para evitar os assédios", relatou no Facebook Yustina Tharwat, uma jovem egípcia.

[SAIBAMAIS]Outra mulher, Basma Mustafa, explica também na rede social que foi assediada em um mercado quando estava grávida. "Quando bati no peito dele, me esbofetou", contou.

Como Yustina e Basma, outras mulheres egípcias aproveitaram a hashtag #MeToo, lançada após as acusações de várias atrizes contra o produtor Harvey Weinstein nos Estados Unidos, para contar suas experiências.

Mas no Egito, país de mais de 93 milhões de habitantes onde o assédio sexual é endêmico, o uso de #MeToo (#AnaKaman em árabe) é moderado.

Segundo o advogado Taher Abu El Nasr, a campanha #AnaKaman atingiu apenas "alguns setores da sociedade", e a maioria das usuárias egípcias desta hashtag provém das classes médias e superiores.

O fenômeno também não chegou às primeiras páginas dos jornais.

99% das mulheres são vítimas


Segundo um estudo da ONU publicado em 2013, mais de 99% das mulheres já foram vítimas de assédio no Egito.

Após a revolta de 2011, grupos de voluntários se organizaram para proteger as mulheres das agressões coletivas durante as manifestações, e cada vez mais vítimas romperam o silêncio para compartilhar suas experiências.

Em fevereiro de 2013, as mulheres se manifestaram nas ruas empunhando facas.

Finalmente em junho de 2014 o governo egípcio adotou uma lei que tornou o assédio sexual um crime, reforçando o arsenal jurídico contra este tipo de comportamento. Mas levar os assediadores aos tribunais não é tarefa fácil, segundo os advogados que trabalham nestes casos.

Para Abu El Nasr, a proporção "de meninas e mulheres atingidas pelo assédio que decidem falar com a polícia é muito pequena, já que a cultura da sociedade conservadora não permite isso".

O advogado cita o exemplo de uma de suas clientes, que optou por abandonar a denúncia que tinha feito por medo "a represálias da família do assediador se este chegasse a ser condenado".

O caso Weinstein, e a campanha #MeToo que se seguiu a ele, podem ter contribuído para estimular as denúncias, estima Mozn Hassan, diretora do centro de estudos feministas Nazra no Egito.

Como muitos outros defensores dos direitos humanos, esta célebre militante está proibida desde junho de 2016 de sair do país.

"As mulheres no Egito foram encorajadas a falar sobre suas experiências de assédio sexual", diz à AFP.

Precedente no Egito

A campanha #MeToo teve um precedente no Egito em abril, com uma hashtag, em árabe, que significa "a primeira vez que me assediaram".

Mas o caminho a percorrer para as mulheres egípcias ainda é longo, visto que o tabu está muito arraigado na sociedade.

Muitas celebridades egípcias não participaram da campanha #MeToo por considerarem, segundo Hassan, que esta representa "uma mancha na reputação" do país e porque "têm medo" de uma rejeição da sociedade.

Há alguns dias, o Egito se encontra envolvido em uma nova polêmica pelas declarações de um advogado, Nabih al Wahsh, que afirmou que estuprar mulheres que usam calças rasgadas é "um dever nacional", o que provocou fortes reações nas redes sociais.

O Conselho Nacional dos direitos das mulheres apresentou uma denúncia contra o advogado.

O mufti do Egito, Shawki Allam, publicou um vídeo em plena campanha #MeToo no qual afirma que "o assédio sexual é proibido pela lei islâmica, e figura entre os piores pecados".

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