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Trump ignora diplomacia para reconhecer Jerusalém como capital de Israel

O estatuto de Jerusalém é um tema-chave no conflito israelense-palestino, e ambas as partes reivindicam a cidade como sua capital. A notícia sobre a intenção de Trump gerou reações de repúdio na comunidade árabe


O papa Francisco, as Nações Unidas, a China e o Reino Unido se somaram nesta quarta-feira ao coro de preocupações, enquanto que o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu preferiu até o momento evitar qualquer menção à questão.

"Não posso calar minha profunda preocupação com a situação criada nos últimos dias sobre Jerusalém", declarou o pontífice durante sua audiência semanal.

"Faço um apelo desesperado para que todos se comprometam a respeitar o status quo da cidade, em conformidade às resoluções pertinentes das Nações Unidas", completou.

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, afirmou em diversas oportunidades que "devemos ser muito prudentes com o que fazemos".

"O futuro de Jerusalém é algo que deve ser negociado com Israel e o palestinos em negociações diretas, um ao lado do outro", disse o enviado especial da ONU ao Oriente Médio, Mladenov em uma entrevista coletiva em Jerusalém.

A China manifestou sua preocupação com o projeto do presidente americano, que pode provocar uma escalada na região.

"Todas as partes envolvidas devem levar em conta a paz e a estabilidade regional, serem prudentes em suas ações, evitar minar as bases de uma resolução da questão palestina e se abster de engendrar uma nova confrontação na região", declarou o porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Geng Shuang.

"Seguimos com preocupação as informações que ouvimos porque pensamos que Jerusalém deveria, evidentemente, ser parte de uma solução definitiva ao conflito entre israelenses e palestinos, uma solução negociada", afirmou o ministro britânico das Relaciones Exteriores Boris Johnson, em Bruxelas, antes de uma reunião da Otan.

"Nós não temos a intenção de transferir nossa embaixada", acrescentou.

Golpe fatal à paz

Na terça-feira, Trump confirmou sua intenção de transferir a embaixada americana para Jerusalém, mesmo com o risco de a medida provocar um mal-estar no Oriente Médio e prejudicar os esforços de paz entre israelenses e palestinos.

Trump fará um anúncio formal nesta quarta sobre a posição de seu governo sobre o estatuto de Jerusalém, segundo informou a porta-voz da Casa Branca Sarah Sanders.

"Trump fará amanhã (quarta-feira) uma declaração", disse a porta-voz.

Washington poderá reconhecer Jerusalém como capital de Israel e com isso transferir sua embaixada, atualmente em Tel Aviv.

Mais cedo, durante uma série de telefonemas diplomáticos, Trump informou ao líder palestino, Mahmud Abbas, e ao rei da Jordânia, Abdullah II, que o projeto profundamente polêmico que representa o reconhecimento americano de Jerusalém como capital de Israel avançava, embora não tivesse uma data para concluí-lo.

O estatuto de Jerusalém é um tema-chave no conflito israelense-palestino, e ambas as partes reivindicam a cidade como sua capital.

A notícia sobre a intenção de Trump gerou reações de repúdio na comunidade árabe.

A Liga Árabe pediu que Washington reconsidere sua decisão, enquanto o rei Salman, da Arábia Saudita, aliado dos Estados Unidos na região, advertiu que a mudança poderia desatar "a ira dos muçulmanos em todo o mundo".

O presidente americano conversou com o rei Salman e o presidente egípcio, Abdel Fattah Al-Sisi. Ambos advertiram-no a não avançar na mudança de embaixada.

Mais cedo, as advertências já tinham se multiplicado. O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse a Trump que o estatuto de Jerusalém é uma "linha vermelha para os muçulmanos" e ameaçou cortar os laços diplomáticos da Turquia com Israel.

O secretário-geral da Liga Árabe, Ahmed Abul Gheit, expressou que os membros da entidade decidiram se reunir no Cairo diante do "perigo desta questão e suas possíveis consequências negativas não só para a situação da Palestina, mas também na região árabe e islâmica".

[SAIBAMAIS]As mesmas palavras foram usadas pelo líder do movimento islâmico palestino Hamas, Ismail Haniyeh, para quem "o reconhecimento da administração americana de Jerusalém ocupada como a capital da ocupação e a transferência da embaixada para Jerusalém ultrapassam todas as linhas vermelhas".

Em carta enviada a dirigentes árabes e muçulmanos, o movimento islâmico convocou os palestinos dos Territórios a se manifestarem na sexta-feira, proclamando, segundo uma expressão já consagrada, um "dia de cólera".

A transferência da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém foi uma das principais promessas de campanha de Trump.

"O presidente foi claro: não é uma questão de ;se;, mas uma questão de ;quando;. Mas não será adotada nenhuma decisão hoje", disse na segunda-feira o porta-voz da Casa Branca Hogan Gidley.