Agência France-Presse
postado em 21/12/2017 13:01
Washington, Estados Unidos - Em nome da aplicação do slogan "America First", um Donald Trump frequentemente imprevisível agitou o mundo em 2017 com suas decisões polêmicas e espetaculares.
Desde sua chegada à Casa Branca em janeiro, os anúncios do magnata republicano foram motivo de apreensão para os aliados dos Estados Unidos: decreto anti-imigração, retirada do Acordo de Paris sobre o clima, assim como da Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), a suspeição do acordo nuclear iraniano e o reconhecimento unilateral de Jerusalém como capital de Israel.
"A doutrina da retirada", resumiu o presidente do "think tank" Council on Foreign Relations (CFR), Richard Haass, diplomata em vários governos republicanos.
[SAIBAMAIS]O presidente americano "aplica o pior do que se poderia temer em matéria política ;trumpiana;, com uma retirada da cena multilateral", afirma Célia Belin, da Brookings Institution, outro "think tank" de prestígio, com sede em Washington.
Três de seus anúncios mais estrondosos - "simbolicamente muito fortes e de pesadas consequências" - têm "apenas vocação para satisfazer seu eleitorado", mas "não têm nenhuma concretização irreparável nesse estágio", disse ela à AFP.
A retirada do Acordo de Paris, por exemplo, passa a valer apenas no fim de mandato; o acordo iraniano permanece em vigor; e instalar a embaixada americana em Jerusalém levará "vários anos".
Este é "o método Trump", avalia a especialista: "uma ruptura simbólica que provoca reações muito, muito fortes". "O mundo inteiro entendeu a mensagem: ;a América está de volta, com força;", declarou Trump na segunda-feira (18), ao anunciar sua Estratégia de Segurança Nacional (NSS, na sigla em inglês).
;Caos;
Para Barbara Slavin, do "think tank" Atlantic Council, "Trump parece pensar que a força militar e econômica dos Estados Unidos é suficiente para lhes permitir fazer o que quiserem".
"Os Estados Unidos estão no auge de sua potência quando estão manobrando para dar vida a um consenso internacional", acrescentou Barbara, em entrevista à AFP, destacando o risco de isolamento e de perda de credibilidade. O número de críticos cresce até mesmo entre os correligionários de Trump.
"O governo atual oferece apenas um pouco de alívio diante do caos de um mundo sem a liderança americana", escreve o influente senador republicano e veterano de guerra John McCain no site Medium. "Nosso presidente vê sua imprevisibilidade como uma virtude e prefere seus tuítes mal informados a estratégias construídas", completa McCain.
De fato, os aliados dos EUA parecem continuar desorientados com o estilo do empresário, capaz de perturbar a China em um tuíte após o outro, de ameaçar, na ONU, "destruir totalmente" a Coreia do Norte, ou ainda de desautorizar seu secretário de Estado, Rex Tillerson, em público.
"A atitude impulsiva do presidente Trump, sua governança imprevisível e seus tuítes abalaram várias capitais", constata Paul Stares, autor de uma pesquisa anual com cerca de 400 especialistas e diplomatas sobre os riscos de conflito.
Nesse relatório do Council on Foreign Relations, Washington está na linha de frente de dois dos principais perigos de confrontação armada em 2018: Coreia do Norte e Irã. Em relação a essas duas grandes crises, explica Paul Stares à AFP, "é difícil saber", se as ameaças de Donald Trump "são da ordem da fanfarronice, ou se ele está, realmente, determinado a usar a força".
E a diplomacia americana ainda não registrou grandes sucessos. "Assim que o presidente assumiu o cargo, ele identificou a Coreia do Norte como a principal ameaça à Segurança Nacional dos Estados Unidos. Infelizmente, isso continua sendo verdade 11 meses depois - se não tiver piorado", reconheceu Tillerson.
;O mal está feito;
Tanto para Pyongyang quanto para Teerã, a linha "está posta para todos os aliados", completa Célia Belin, acrescentando que "Trump tem uma retórica anti-iraniana muito forte, mas, por enquanto, nenhuma ação concreta e eficaz".
Apesar de abalados, não parece que os aliados vão permanecer nesse estado de perplexidade, acredita Célia. "A França é pragmática", europeus e asiáticos "se acostumam com os tuítes de Trump", e ele chega até a ser, eventualmente, apreciado no Leste Europeu, ou no Oriente Médio, onde "ele reafirmou com força" a aliança com Israel e Arábia Saudita.
Em vários casos, da crítica à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) à ameaça de uma guerra comercial com a China, "uma forma de realismo e de continuidade se impôs", analisa a pesquisadora da Brookings.
O mesmo vale para o Afeganistão, de onde o presidente queria se retirar até confessar que "as decisões são muito diferentes, quando você está no Salão Oval". Quanto à desejada aproximação com Moscou, encontra-se paralisada pelas suspeitas de conluio durante a campanha eleitoral entre a Rússia de Vladimir Putin e a equipe do então candidato Trump.
Na verdade, observa Célia Belin, apenas alguns poucos aliados realmente tiveram perdas: o México, pressionado pelos projetos de muro fronteiriço, e os britânicos, "já sozinhos no mundo em pleno Brexit", alvo de virulentos tuítes de @realDonaldTrump sobre a gestão da ameaça extremista.
E, por fim, a Alemanha, "profundamente desestabilizada pelos ataques antialemães contra a chanceler Angela Merkel", disse a pesquisadora.
O ministro alemão das Relações Exteriores, Sigmar Gabriel, alertou: "o recuo dos Estados Unidos, sob Donald Trump, de seu papel de garantidor confiável do multilateralismo ocidental" deve levar os europeus a um protagonismo. Porque, completou, o mal está feito, e "isso não mudará fundamentalmente na próxima eleição".