Agência France-Presse
postado em 31/01/2018 19:26
Autoridades alemãs estão alarmadas pelo ressurgimento do antissemitismo, 73 anos depois do fim do Holocausto, em um contexto de crescimento da extrema direita e da chegada de milhares de refugiados provenientes de países inimigos de Israel.
"É inconcebível e constitui uma vergonha ver que nenhum estabelecimento judeu possa existir sem proteção policial", declarou a chanceler Angela Merkel em 27 de janeiro, ao lembrar, no Parlamento, o 73; aniversário da liberação do campo de extermínio de Auschwitz.
"O ódio é um veneno e ao final você acaba se envenenando", declarou uma sobrevivente do Holocausto, Anita Lasker-Wallfisch, em seu discurso aos parlamentares.
O antissemitismo é um "vírus aparentemente incurável", criticou.
Angela Merkel, primeira chanceler alemã a pronunciar um discurso no Knesset, no parlamento israelense, há dez anos, se comprometeu a criar um posto de comissariado para o antissemitismo no próximo governo, que espera formar em março.
Merkel lançou essa ideia depois da queima, em Berlim, de bandeiras israelenses durante uma manifestação de protesto contra a decisão dos Estados Unidos de reconhecer Jerusalém como capital de Israel.
Há meses, a comunidade judaica alemã alerta sobre o ressurgimento do antissemitismo.
As festas judias já não podem ser celebradas "no espaço público sem proteção policial", disse Charlotte Knobloch, ex-presidente do Conselho Central dos Judeus da Alemanha.
Mais violento
Os berlineses também ficaram abalados com o roubo de 16 blocos de metal instalados nas calçadas para honrar as vítimas do genocídio judeu.
O roubo foi uma mensagem antissemita, já que ocorreu na véspera da comemoração da Noite dos Cristais, que marcou o início de uma onda de violência contra os judeus executada pelos nazistas nas noites de 9 e 10 de novembro de 1938.
"É a primeira vez que se roubam tantas Stolpersteine (pedras no caminho)", disse Silvija Kavcic, que administra os 7.000 blocos de metal que têm gravações dos nomes das vítimas do nazismo, na maioria judias.
O antissemitismo é "cada vez mais veemente e mais violento", afirma Wenzel Michalski, representante na Alemanha da ONG Human Rights Watch (HRW).
O atual presidente do Conselho Central dos Judeus da Alemanha, Josef Schuster, diz o mesmo.
"Animam-se a dizer o que sempre pensaram, mas que justamente antes não se animavam a dizer", afirma Schuster em uma entrevista ao jornal Bild am Sonntag.
A lembrança do Holocausto, o genocídio dos judeus, está no centro da identidade da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial.
Mas, paralelamente ao desaparecimento das últimas testemunhas e sobreviventes do genocídio, os tabus estão desaparecendo.
A entrada da extrema-direita na câmara dos deputados após as eleições de setembro agravou a situação.
Um dos dirigentes da extrema-direita classificou de "memorial da vergonha" o monumento de Berlim que lembra o Holocausto. Essa bancada conta com conhecidos antissemitas.
Alguns especialistas também denunciam a radicalização de alguns muçulmanos, em particular na forte minoria turca, sensível à retórica do presidente turco Recep Tayyip Erdogan.
"Para eles, tudo o que ele diz é sagrado. Erdogan é um antissemita virulento", acusa o representante da HRW.
Também preocupa o desenvolvimento do antissemitismo nas escolas, em particular entre os jovens muçulmanos.
"Judeu" se tornou um dos insultos mais frequentes nos pátios das escolas, dizem professores.
Diante desse fenômeno, uma autoridade da cidade de Berlim propõe que todas as escolas organizem uma visita a um campo de concentração, como já acontece na Baviera.
"O determinante não é a origem geográfica, mas o nível de educação", assegura Günter Morsch, diretor do Memorial de Sachsenhausen, um campo de extermínio onde morreram 30.000 pessoas.