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50 anos sem Luther King: igualdade racial segue como utopia

Especialistas admitem que a igualdade racial segue como utopia 50 anos depois do assassinato do ativista Martin Luther King Jr. e veem demandas similares às registradas em 1968. Disparidades na Justiça e na economia afetam os negros

Rodrigo Craveiro
postado em 04/04/2018 06:28
Americanos visitam estátua de Martin Luther King Jr. esculpida na rocha, em Washington, a poucos metros do local do famoso discurso de 1963
Nas escadas do Lincoln Memorial, de frente para o National Mall, em Washington, a inscrição talhada no chão marca o local do famoso discurso de Martin Luther King Jr., em 28 de agosto de 1963. Não muito longe dali, o imenso busto do ativista, esculpido na rocha, tornou-se centro de peregrinação de afro-americanos que ainda aguardam a materialização do sonho do ;Dr. King;. Às 18h01 de 4 de abril de 1968, em Memphis (Tennessee), a 1,4 mil quilômetros da capital, uma bala calou uma das principais vozes contra a segregação da população negra nos Estados Unidos. Meio século depois, apesar de o legado do reverendo King seguir intacto, o racismo é ferida aberta na sociedade. Em todos os 50 estados americanos, supremacistas brancos atuam respaldados pela Primeira Emenda ; o texto da Constituição que resguarda a liberdade de expressão.

Professor da Faculdade de Política e Governo da George Mason University, em Arlington (Virgínia), Jeremy Mayer admitiu ao Correio que o racismo se mantém como fato vergonhoso na opinião pública, nas instituições sociopolíticas e nas eleições americanas.;A explicação para o fracasso dos EUA em erradicar o preconceito racial está na relutância dos brancos em desistirem do poder e em abandonarem a discriminação.; De acordo com ele, há duas mentiras envolvendo o debate racial. ;Uma é a de que não temos racismo, falácia propalada pelos conservadores. A outra é a de que o racismo continua tão ruim como quando King era vivo. Apesar de isso não ser verdade, o problema está longe de ser resolvido.;

O motel, em Memphis, diante do qual o reverendo foi assassinadoColette Mazzucelli, professora de relações internacionais da New York University, a persistência da violência das armas e do racismo sistêmico nos EUA ;deve ser abordada nos termos da interseccionalidade, no âmago dos males da sociedade;. ;A discriminação contra os marginalizados (;) deve ser tratada em todos os níveis da sociedade, para honrar o legado de King e nutrir o ativismo cívico do século 21, inclusivo e emancipatório;, disse à reportagem.

Demônios

Além do racismo, muitos dos demônios que atormentaram os EUA em 1968 não foram exorcizados. Se naquele ano os pacifistas vociferavam contra combates no Vietnã, agora o país se vê às voltas com a guerra no Afeganistão. A luta pela emancipação das mulheres foi reeditada, como foco no assédio sexual. Estudantes voltaram a tomar as ruas, dessa vez para exigir o controle de armas. Colette explicou que os protestos se centram em temas que atingiram a maioridade dos movimentos do século 20 ; os direitos iguais para as mulheres, as preocupações ambientais (o banimento da energia nuclear) e as marchas pela paz (a oposição ao envolvimento do país na Guerra do Vietnã). ;As preocupações da era atual são domésticas por natureza, particularmente as demonstrações contra a violência das armas, que mataram centenas de jovens. Ao contrário dos anos1960, os protestos contam com as mídias sociais para organizar o ativismo a partir das bases;, comentou a especialista.

[SAIBAMAIS]Por sua vez, David Farber, historiador da University of Kansas, explicou ao Correio que King provocou profundas mudanças na sociedade. ;Os protestos silenciosos e as manifestações lideradas pelos afro-americanos forçaram os brancos a reconhecerem o racismo que permeou os EUA. A magnífica oratória de King os desafiou a escolherem entre o racismo e os ideais ; igualdade, democracia e tolerância ; que eles afirmavam defender.; Em 1965, os EUA aprovaram leis que baniram a discriminação racial nos postos de trabalho e em todos os locais públicos. ;Mesmo 50 anos depois, há muito a ser feito;, acrescentou.

Farber admite que a sociedade é menos violenta que meio século atrás. ;A violência das armas, as prisões em massa e a má conduta policial continuam a afetar a comunidade afro-americana. Sem a liderança do presidente Donald Trump, que tem agravado os problemas, jovens voltaram às ruas para demandar uma sociedade igualitária.; Segundo ele, nesse sentido, 2018 e 1968 foram bem similares. ;King estaria orgulhoso desses jovens que se levantaram pela justiça social.;

Especialistas admitem que a igualdade racial segue como utopia 50 anos depois do assassinato do ativista Martin Luther King Jr. e veem demandas similares às registradas em 1968. Disparidades na Justiça e na economia afetam os negros

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