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Conservador da direita, presidente eleito do Paraguai pede reconciliação

Graduado em marketing nos EUA e filho de um dos homens fortes da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989), Marito herdará um país em pleno crescimento econômico, mas com desafios nas áreas sociais e políticas

Agência France-Presse, Agência Estado
postado em 23/04/2018 07:43
Marito venceu seu adversário,  Efraín Alegre, do Partido Liberal
O presidente eleito do Paraguai, Mario Abdo Benítez, do Partido Colorado (direita), pediu a reconciliação entre seus compatriotas e recordou seu pai ligado à ditadura (1954-89) em sua mensagem de vitória em Assunção.

"Nossa democracia deu o exemplo. Corre o mundo a notícia de que no Paraguai a democracia se consolidou e de um passo à frente para um país unido e reconciliado", afirmou Abdo Benítez, mais conhecido como "Marito".

"Não posso esquecer meu pai, que foi um grande colorado", afirmou ante milhares de seguidores na porta da sede do partido. Seu pai, também chamado Mario Abdo, foi secretário particular e homem de confiança do general Alfredo Stroessner.

O general governou o país com mão dura por 35 anos até que foi derrrubado por um golpe de Estado que devolveu a democracia ao país em 3 de fevereiro de 1989. Ele foi preso e processado por enriquecimento ilícito até que finalmente foi absolvido.

Marito venceu seu adversário, Efraín Alegre, do Partido Liberal. A Justiça eleitoral avaliou a participação de eleitores em 65% de um total de 4.241.000 habilitados a votar de uma população de 7.000.000 de habitantes.

Ele sucederá em agosto o presidente Horacio Cartes, um empresário da indústria do tabaco que, nestas eleições, candidatou-se ao Senado.

Perfil de Marito

Graduado em marketing nos EUA e filho de um dos homens fortes da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989), Marito herdará um país em pleno crescimento econômico, mas com desafios nas áreas sociais e políticas.

A cena do Congresso em chamas no ano passado, depois de manifestações contrárias a uma manobra para aprovar a reeleição presidencial no país, ainda está viva na memória dos paraguaios. Na ocasião, Benítez foi contra a aprovação da emenda.

Para 2018, o FMI projeta um salto econômico no país de 4,5%, mas 26,4% da população vive na pobreza e 4,5% na miséria. Benítez prometeu manter a campanha econômica do atual presidente, Horacio Cartes, e lutar contra a corrupção, principalmente no setor Judiciário, defendendo a limitação de funções dos ministros da Corte Suprema.

Sob a bandeira do Partido Colorado, que domina a política no país há mais de 70 anos, Benítez afirma ser contra as violações dos direitos humanos da época da ditadura, mas lembra êxitos econômicos do período.

O dia de votação neste domingo, 22, foi tranquilo, com poucas filas em centros eleitorais como era esperado. Nas ruas, poucos carros exibiam adesivos com propagandas eleitorais. "Votarei em Marito. Ele pelo menos é sincero, os outros fazem alianças estranhas", disse o taxista José Domínguez, antes de votar no começo da tarde.

A vendedora Glória, de 60 anos, afirmou que seu voto ia para Alegre, mas não tinha esperanças de vitória. "Vou votar para ver se a diferença cai um pouco, mas aqui sempre elegem os colorados "

Ao redor da sede do Partido Colorado, na região central de Assunção, a movimentação foi grande o dia todo. Assessores e partidários conversavam em tom de vitória e acompanhavam cada divulgação de boca de urna. "Serão mais cinco anos de Colorado, com certeza", dizia um dos partidários. Quando as urnas fecharam, uma grande festa começou na sede do partido com gritos de "Sim, se sente, Marito presidente".

A previsão era de que 67,5% dos 4,2 milhões de pessoas aptas a votar compareceriam às urnas. Em 2013, a participação foi de 68% Em uma entrevista coletiva, o ex-presidente Fernando Lugo elogiou o alto comparecimento às urnas. "Existe uma avalanche de participação jovem que vai renovar nossa democracia."

Em declarações à imprensa paraguaia, o político colorado pediu ao longo da campanha que os eleitores o julgassem pelo presente, não pelo passado de seu pai na ditadura Stroessner. Mais de 400 pessoas morreram no período e, de acordo com um relatório da Comissão de Verdade e Justiça de 2008, cerca de 20 mil sofreram torturas ou foram presas.

Em temas controvertidos no país, como a promoção do casamento homossexual e a legalização do aborto, Benítez mantém a posição conservadora do partido e afirmou diversas vezes que vetará tentativas de promover tais mudanças. "Acredito nos princípios bíblicos e na família", afirma.

Benítez teve um café da manhã com jornalistas e, em seguida, foi votar no centro de Assunção. Depois foi visitar o túmulo do pai no cemitério da Recoleta, na capital paraguaia.

Brasil

O embaixador do Brasil no Paraguai, Carlos Alberto Simas Magalhães, afirma que a agenda política entre os dois países deve manter a linha atual, tendo como desafios a segurança nas fronteiras e o combate ao narcotráfico e ao crime organizado, além do desenvolvimento econômico bilateral.

Distância

O Paraguai, que saiu de uma ditadura de 35 anos em 1989, viveu sob a hegemonia do partido Colorado durante os últimos 70 anos, com a única exceção do governo do ex-bispo e ex-presidente de esquerda Fernando Lugo (2008-2012), que foi destituído por incompetência em um julgamento político um ano antes de concluir seu mandato.

Embora se distancie da ditadura lembrando que na época da derrocada de Alfredo Stroessner tinha apenas 16 anos, em 2006 o candidato colorado, Mario Abdo Benítez, foi ao funeral do ex-ditador, que se exilou em Brasília.

"Conquistei credenciais democráticas na minha trajetória política", declarou Benítez neste domingo, ao rejeitar as críticas que vem recebendo pelo fato de seu pai ter sido secretário privado do ex-ditador. Entre eles havia um parentesco por parte da avó.

"O que me contaram é que muitas vezes quando vinha (do interior) a Assunção para estudar no Colégio Militar, Stroessner ficava na casa de minha avó, pois havia um parentesco distante entre minha avó e a mãe do general (que ainda não era presidente)", insiste o candidato. Benítez estudou no exclusivo Colégio San Andrés de Asunción, onde os netos de Stroessner foram seus companheiros de classe.

Apesar dos esforços de Benítez para se desvincular da ditadura, o analista político Francisco Capli diz que "os que têm menos de 40 anos já não se lembram da ditadura, por isso ela não está em discussão nesta campanha".

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