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Suprema Corte mais conservadora coloca em risco direito ao aborto nos EUA

De acordo com o instituto Pew Research, 57% dos americanos são a favor da interrupção voluntária da gravidez, enquanto 40% são contra

Agência France-Presse
postado em 29/06/2018 17:24
Os juízes da Suprema Corte, guardiões da Constituição, são nomeados pelo presidente e confirmados pelo Senado para um cargo vitalício
A aposentadoria do juiz da Suprema Corte Anthony Kennedy ameaça o direito universal ao aborto nos Estados Unidos, já que o presidente Donald Trump pode substituí-lo por um conservador contrário à decisão que descriminalizou a interrupção voluntária da gravidez em 1973.

[SAIBAMAIS]"Estou muito preocupada", declarou à AFP Gloria Allred, advogada especializada nos direitos das mulheres. "Existe um grande risco de que (a decisão no caso) ;Roe vs Wade; seja censurada pelo próximo magistrado".

Os juízes da Suprema Corte, guardiões da Constituição, são nomeados pelo presidente e confirmados pelo Senado para um cargo vitalício, que pode ser voluntariamente interrompido, como no caso de Kennedy.

As suas decisões abarcam temas fundamentais da sociedade como o casamento homossexual, a discriminação racial e as polêmicas eleitorais.

Anthony Kennedy foi nomeado pelo republicano Ronald Reagan, mas foi considerado moderado em temas como o aborto.

O seu substituto será nomeado pelo presidente Trump, que já nomeou outro magistrado conservador, Neil Gorsuch, inclinando a balança ideológica da Suprema Corte para a direita.

A senadora de esquerda Elizabeth Warren indicou que a nomeação do novo juiz será "a batalha de nossas vidas" e determinará o futuro da sociedade americana por décadas.

Do outro lado, Lila Rose, ativista contra o aborto, antecipou "o fim da horrível e imoral decisão de 1973".

De acordo com o instituto Pew Research, 57% dos americanos são a favor da interrupção voluntária da gravidez, enquanto 40% - entre evangélicos, mórmons e outros conservadores - são contra.

Muitos deles votaram em Trump, com Mike Pence de vice-presidente, por sua postura "pró-vida".

Antes da saída de Kennedy, os "pró-escolha" já haviam sofrido outra derrota. Em uma votação de 5-4, o tribunal decidiu contra uma lei da Califórnia que impunha aos centros antiaborto o dever de informar a suas clientes grávidas da possibilidade de uma interrupção em outro local.

A tendência da nova Corte a favor dos argumentos da direita religiosa e contra os direitos das mulheres e das minorias sexuais foi igualmente notada no caso que decidiu a favor de um confeiteiro cristão que se negou a fazer o bolo de casamento de um casal homossexual.


Desertos abortivos

Também há o exemplo de farmacêuticos que se recusam a vender comprimidos contraceptivos ou abortivos, argumentando que vai contra as suas convicções cristãs.

As leis locais que restringem o aborto aumentaram em estados republicanos nos últimos anos, a ponto de Jennifer Dalven, da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU), falar de "desertos abortivos", sem clínicas disponíveis no centro e sul do país.

No Arizona, por exemplo, muitos têm que esperar até três horas para chegar a algumas clínicas em Phoenix, o que requer gastos de viagens, dinheiro para o cuidado de outras crianças, muitas vezes colocando em risco o emprego de mulheres em regiões pobres e isoladas.

Há dois anos, o juiz Kennedy foi fundamental para anular uma lei no Texas que exigia que as clínicas abortivas fossem dotadas de instalações cirúrgicas hospitalares, o que teria resultado no fechamento de 75% delas.

"Os magistrados da Suprema Corte não precisam anular ;Roe vs Wade; para fazer com que o aborto não esteja disponível para as mulheres;, indicou Dalven.

Allison Hoffman, professora da Universidade da Pensilvânia, afirma que várias decisões que não chegaram a impugnar a sentença igualmente diminuíram direitos. "Se for derrogada, as mulheres não terão garantido o acesso ao aborto e qualquer estado que quiser aprovar leis que restrinjam ou proscrevam o aborto poderão fazê-lo".

Neste cenário, Allred teme uma volta "aos anos 1950", quando o aborto era crime. "Terão que completar a gravidez, é o que se chama de gravidez obrigatória" e algumas irão para clínicas clandestinas, "colocando a sua vida em risco".

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