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Mãe e filho contam sua história após 45 dias separados por Trump

Otila e Geremy foram separados pela política de tolerância zero após realizar a travessia pela fronteira do México com os Estados Unidos

Agência France-Presse
postado em 19/07/2018 18:06
Otila e Geremy foram separados pela política de tolerância zero após realizar a travessia pela fronteira do México com os Estados Unidos
Los Angeles, Estados Unidos - Otilia Asig-Putul fica com a voz embargada quando recorda os intermináveis 45 dias em que esteve separada de seu filho.

[SAIBAMAIS]O pesadelo começou quando ela entrou nos Estados Unidos pela fronteira com o México para pedir asilo, em meio a uma política de "tolerância zero" impulsada pelo presidente americano, Donald Trump.

Vinha de uma viagem longa e cansativa a partir da Cidade da Guatemala, de onde saiu de mãos dadas com ;Geremy;, como identifica seu filho de 11 anos, e um sobrinho.

Deixou para trás seus outros três filhos: um de 10 anos, uma menina de seis e o caçula, de quatro. Separou-se de seu marido, que parou de lhe dar dinheiro, e para conseguir manter seus filhos decidiu emigrar aos Estados Unidos.

Não deu muitos detalhes da viagem, apenas que vieram com outras famílias - não na polêmica caravana migrante, esclareceu - e que receberam a ajuda de "um rapaz". No posto de fronteira de San Luis, Arizona, se entregaram às autoridades, o primeiro passo para um asilo.

Era um dia quente de maio, tanto Otilia como ;Geremy; lembram bem. Os oficiais de imigração os colocaram em um carro com as janelas fechadas. "Quente, quente. Não sabia o que fazer, comecei a chorar", disse à AFP esta mulher de 31 anos em uma entrevista telefônica. Foram as primeiras lágrimas de muitas que derramaria neste processo, que ainda não terminou.

Quando chegaram aos Estados Unidos, o governo começava a implementação de uma política - suspensa semanas depois ante a pressão local e internacional - de processar todos os imigrantes que cruzaram a fronteira ilegalmente e separar crianças de seus pais.

"Nunca imaginei que isso ia acontecer", expressou esta dona de casa, que ficou a dois anos de terminar sua faculdade de contabilidade. "Se eu soubesse que isto estava acontecendo, não teria vindo, como vou pôr em risco a vida do meu filho?".

O pesadelo começou quando ela entrou nos Estados Unidos pela fronteira com o México para pedir asilo, em meio a uma política de
- "Se despeça de seu filho" -
Daquele carro que parecia um forno, Otilia, ;Geremy; e o sobrinho foram levados à "geladeira", como muitos imigrantes chamam a prisão onde são colocados pelas autoridades federais. "Nos deixaram três dias com muito frio, no chão, e não nos davam nada", indicou. "Os agentes zombavam de nós em inglês".

Há uma imagem que ;Geremy; tem gravada na memória daqueles primeiros dias em cativeiro: levaram sua mãe "acorrentada nos pés, mãos e cintura". "Me senti muito mal, comecei a chorar", contou o menino.

Foi pior quando o oficial de imigração disse a Otilia: "Se despeça de seu filho". "Ele também estava chorando, e assim nos despedimos". Ela foi ao centro de detenção de Eloy, no próprio Arizona, enquanto ele foi levado a Chicago, a 2.800 km.

"Eu não sabia o que fazer, imagina se me deportassem, como ia saber onde estava meu filho? Estava muito assustada".

;Geremy; foi atacado no abrigo por um menino de 14 anos, e teve de ir ao hospital, com um ferimento na cabeça. O escritório Nexus Derechos Humanos, que assumiu o caso, processou a instalação por "negligência".

"Minha trabalhadora social me tratava mal, não queria me ver", indicou o menino.

- "Se fazia de forte" -
Com a ajuda de outras presas, Otilia conseguiu averiguar onde estava seu filho, e dois dias depois conseguiu falar com ele. "Eu percebia que ele estava triste, mas se fazia de forte". A única coisa que eu lhe dizia é que não desanimasse, que tudo ia sair bem".

Saiu um mês depois sob fiança, 20.000 dólares que o Nexus pagou ao decidir representá-la pro bono. Isto lhe permite permanecer nos Estados Unidos até que seu asilo seja resolvido.

A empresa trabalha em cerca de 60 casos relacionados com esta política que em poucas semanas levou à separação de entre 2.500 e 3.000 crianças dos adultos com que cruzaram a fronteira.

Nexus ameaçou ir à justiça com Otilia, mas conseguiram que o menino fosse solto antes, no fim de junho. Agora vivem na casa de uma tia paterna do menino em Miami Beach. Juntos e livres, pensam no futuro.

Preciso "conseguir trabalho, deixei meus três filhos lá e tenho que lutar por eles e brigar até o final", expressou Otilia, que espera que ;Geremy; "se prepare e tenha um futuro". "Que valha a pena, por tudo que passamos".

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