Agência France-Presse
postado em 26/07/2018 10:12
Islamabad, Paquistão - Reina o caos, nesta quinta-feira (26/7), no Paquistão, depois que o partido do governo em final de mandato denunciou "fraudes flagrantes" e pediu que se rejeitem os resultados parciais que sugerem a vitória do ex-campeão de críquete Imran Khan nas eleições legislativas de quarta-feira.
Khan já se proclamou vencedor. "Fomos bem-sucedidos e ganhamos um mandato", declarou ele, em uma transmissão ao vivo.
A contagem de votos seguia com um enorme atraso nesta quinta, horas depois de os seguidores de Khan irem às ruas para comemorar. "Motiva a juventude", disse à AFP Fahad Hussain, de 21 anos, que votava pela primeira vez.
Segundo a imprensa local, 17 horas depois de encerrada a votação havia sido apurada menos da metade dos votos, um atraso sem precedentes que alimenta o temor sobre a legitimidade do processo.
As projeções de todas as emissoras de televisão davam como ganhador das eleições o Pakistan Tehreek-e-Insaf (PTI), partido de Imran Khan, com no mínimo 100 cadeiras. Para formar governo, é necessária uma maioria de 137 deputados.
A Comissão Eleitoral Paquistanesa (ECP) justificou essa lentidão por problemas técnicos relacionados com o uso de um novo sistema eleitoral.
"Essas eleições não estão manipuladas [...] São 100% justas e transparentes", afirmou seu diretor, Sardar Muhammad Raza, em entrevista coletiva, a terceira da ECP nessa noite eleitoral.
Raza não disse quando as autoridades poderão anunciar resultados. Alguns veículos sugeriram que não deve ser antes de hoje à noite.
;Irregularidades claras e em massa;
Na quarta-feira à noite, a Liga Muçulmana do Paquistão-Nawaz (PML-N), no poder nos últimos cinco anos, anunciou que rejeitava "os resultados na íntegra [...] por causa de irregularidades claras e em massa" e denunciou que se tenham feito contagens "sem a presença dos nossos agentes eleitorais".
Seu dirigente, Shahbaz Sharif, irmão do ex-premiê Nawaz Sharif, atualmente detido por corrupção, denunciou em coletiva de imprensa "fraudes tão flagrantes que todo mundo se pôs a chorar".
Depois advertiu no Twitter que "resultados baseados em um conchavo em massa provocarão danos irreparáveis ao país".
O líder do Partido Popular Paquistanês (PPP, no poder entre 2008 e 2013), Bilawal Bhutto-Zardari, pronunciou-se nesse sentido, classificando o processo eleitoral de "imperdoável e escandaloso".
"Meus candidatos se queixam de que nossos agentes eleitorais foram expulsos dos centros de votação de todo país", tuitou o filho da ex-primeira-ministra Benazir Bhutto, assassinada em 2007.
A importância da vantagem de Khan frente ao outrora todo-poderoso PML-N, quando os analistas antecipavam que, provavelmente, seria necessária uma coalizão, alimentou a preocupação com o processo, disseram especialistas.
"O elevado resultado do PTI, mesmo antes do fim da apuração, será suficiente para levantar suspeitas no PPP e no PML-N", disse Michael Kugelman, analista do Wilson Center em Washington.
Nem Imran Khan nem os militares, sob suspeita de terem-no apoiado com todo tipo de manobra nos últimos meses, comentaram a situação até o momento.
A polêmica chega após uma campanha que alguns observadores classificaram como uma das "mais sujas" na história do país, devido às acusações de manipulação, e também esteve marcada pela crescente visibilidade dos partidos religiosos extremistas.
"É o caos absoluto", comentou a analista política Azeema Cheema, que disse estar "muito preocupada" com o possível rumo dos acontecimentos.
"Dependerá de como a desobediência civil vai-se organizar. Pode haver motins espontâneos entre os militantes políticos", disse ela à AFP.
"Pouco importa como se vai administrar isso. O clima pós-eleitoral imediato será bastante tenso", considerou Michael Kugelman, que não vê "nenhuma forma de se evitar um período de tempestade".
Realizadas sob um forte esquema de segurança, as eleições de quarta-feira constituíam uma incomum transição democrática entre dois governos civis, neste jovem país com um passado marcado pelos golpes de Estado militares. Potência nuclear, o Paquistão esteve dirigido pelas Forças Armadas quase metade de seus 71 anos de história.