Agência France-Presse
postado em 17/12/2018 10:58
Londres, Reino Unido - Decidida a seguir adiante com seu acordo de Brexit apesar da hostilidade do Parlamento, a primeira-ministra britânica, Theresa May, deve advertir nesta segunda-feira (17/18) aos deputados que um eventual segundo referendo provocaria "danos irreparáveis" à legitimidade política.
"Não vamos quebrar a fé do povo britânico ao tentar organizar outro referendo sobre o Brexit", deve declarar May aos parlamentares esta tarde, de acordo com trechos de seu discurso divulgados por Downing Street.
"Outra votação... provocaria danos irreparáveis à integridade da nossa política", argumenta May, ante o crescente apoio à ideia em um país, no qual poucas pessoas parecem satisfeitas com o acordo estabelecido com Bruxelas após 17 meses de árduas negociações.
O ex-chanceler conservador Boris Johnson, um dos principais defensores do Brexit, afirmou que aqueles que consideram um segundo referendo estão "loucos". "Um segundo referendo provocaria sentimentos de traição instantâneos, profundos e inenarráveis", escreveu em sua coluna semanal no jornal Daily Telegraph.
No referendo convocado em junho de 2016 pelo então premiê conservador, David Cameron, 52% dos britânicos votaram a favor da saída da União Europeia. Cameron estava convencido de que a opção pela permanência no bloco seria vitoriosa.
Quase três anos depois, o país deve sair da UE em 29 de março. Porém, ainda não conseguiu ratificar um acordo que permita a retirada de forma ordenada e com o benefício de um período de transição que permita os muitos ajustes necessários.
A Câmara dos Comuns deveria ter votado em 11 de dezembro sobre o texto de 585 páginas acordado em novembro entre a primeira-ministra e os 27 sócios europeus. Diante de uma evidente derrota, porém, May cancelou a sessão de ratificação um dia antes e a adiou para janeiro, para voltar a conversar com os líderes europeus.
A resposta que ela recebeu na reunião de cúpula europeia da semana passada demonstrou, no entanto, a impossibilidade de uma nova negociação e que ela deve ser mais precisa em seu pedido de algum tipo de "garantia" para atender ao Parlamento.
O acordo esbarra na rejeição da oposição trabalhista, dos centristas liberal-democratas, dos nacionalistas escoceses, dos unionistas norte-irlandeses do DUP ; apoio fundamental para a maioria parlamentar de May ; e de mais de 100 conservadores rebeldes.
O ponto de maior discórdia é o denominado "backstop", ou "rede de segurança", pensado para evitar o retorno de uma fronteira dura na ilha de Irlanda, algo que poderia enfraquecer o Acordo de Paz de 1998, que acabou com 30 anos de conflito violento.
Os defensores do Brexit temem que este mecanismo mantenha o Reino Unido indefinidamente atrelado às redes europeias. Os ativistas pró-UE alegam que as condições do acordo são piores do que aquelas que o país tem atualmente como membro do bloco.
O próprio governo May admitiu que qualquer modalidade de Brexit terá efeitos negativos para a economia britânica, mas alerta que a pior opção seria deixar o bloco sem acordo. Esse cenário levaria o país a uma crise de grandes proporções.
O ex-primeiro-ministro trabalhista Tony Blair (1997-2007) afirmou na sexta-feira que, se os deputados "não conseguem chegar a um acordo, a lógica é voltar a dar a voz ao povo". O comentário foi mal recebido por May, que nesta segunda-feira pretende destacar aos parlamentares que um segundo referendo "dividiria o nosso país justamente no momento em que deveríamos trabalhar pela união".
Mas o simples fato de seu comparecimento ao Parlamento, oficialmente destinado a informar sobre a reunião europeia, ter como objetivo rejeitar a organização de um novo referendo é interpretado por alguns como a confirmação de que esta ideia, que há alguns meses era considerada impossível, ganha força em um país à beira do caos.