Agência France-Presse
postado em 30/01/2019 16:52
Caracas, Venezuela - Opositores venezuelanos, liderados pelo presidente interino autoproclamado Juan Guaidó, convocaram nesta quarta-feira (30) a Força Armada a não reconhecer o presidente Nicolás Maduro que, por sua vez, pediu que se mantenham unidos e leais.
"Força Armada, recupera a tua dignidade", "Maduro usurpador", "Só quero que você vá embora, Nicolás", "Não %2b ditadura" diziam cartazes exibidos por centenas de pessoas em vários pontos do país, tocando cornetas, apitos e panelas.
Levando uma bandeira venezuelana, na Praça Altamira, em Chacao (leste), Jaime Regalado pediu aos militares "que deixem entrar a ajuda humanitária e se coloquem ao lado do povo".
Antes da mobilização deste meio-dia, Guaidó, líder do Parlamento de maioria opositora, recebeu um telefonema do presidente americano, Donald Trump, que lhe expressou "completo apoio", disse o líder opositor.
Na primeira hora, Maduro comandou manobras militares no Forte Tiuna, maior complexo militar em Caracas, onde denunciou que "mercenários desertores" buscam fissurar a Força Armada a partir da Colômbia.
"Unidade monolítica! Moral máxima! Chamo a Força Armada (...) a uma grande renovação, uma grande revolução militar da moral", disse Maduro a cerca de 2.500 soldados.
Embora a cúpula militar a tenha qualificado como um engano, o líder opositor insiste em oferecer anistia aos militares que colaborem com uma transição, buscando romper o apoio de Maduro, a Força Armada.
Carlos Vecchio, encarregado de negócios da Venezuela nos Estados Unidos, nomeado por Guaidó, disse nesta quarta-feira, em Washington, que a anistia aprovada pelo Parlamento venezuelano não pode incluir crimes contra a humanidade.
Washington, que não descarta uma ação armada na Venezuela, convocou os militares a apoiarem a transição.
Nesta queda de braço, Maduro encabeça vários atos oficiais. "Vocês querem no governo um marionete dos gringos na Venezuela?", perguntou a jovens em um comício. "Nãaaaaaaooo", responderam.
;Estamos morrendo;
Guaidó também convocou a mobilização em apoio à entrada da ajuda humanitária, o que o governo considera uma porta a uma intervenção militar americana.
Washington disse ter prontos 20 milhões de dólares para enviar em alimentos e remédios, cuja escassez severa angustia os venezuelanos e fez disparar a migração, contabilizada em 2,3 milhões de pessoas desde 2015, segundo a ONU.
"Tenho uma bactéria e não encontro os medicamentos. Precisamos da ajuda humanitária, nós, venezuelanos, estamos morrendo", disse Javier, de 22 anos, que participava de um panelaço durante protesto nos arredores de um hospital no centro de Caracas.
Maduro atribui o desabastecimento a sanções dos Estados Unidos. Para Guaidó, este é o momento em que os militares terão "a decisão em suas mãos para permitir ou não a entrada" da ajuda.
"A Venezuela precisa de ajuda, há fome, não há remédios, nossas crianças estão morrendo", disse uma mulher nos arredores do hospital infantil, no centro de Caracas.
O medo da violência ressurge a cada manifestação. Distúrbios que estouraram em 21 de janeiro deixaram 40 mortos e mais de 850 detidos, segundo a ONU. Duas ondas de protestos contra Maduro, em 2014 e 2017, deixaram 200 mortos.
;Mais sanções;
Em entrevista à agência de notícias russa RIA Novosti, Maduro agradeceu o apoio do presidente Vladimir Putin e destacou que "a cada mês" a Venezuela recebe armamento russo, "o mais moderno do mundo".
O autoproclamado presidente da Venezuela, Juan Guaidó, por sua vez, deu uma entrevista ao jornal alemão Bild, na qual pediu afirmou que a Venezuela está "em uma ditadura" e que "deve haver pressão".
"Precisamos de mais sanções por parte da União Europeia, como decidiu o governo dos Estados Unidos", declarou o presidente do Parlamento venezuelano, que considera o regime "absolutamente corrupto".
Os Estados Unidos aprovaram sanções contra a estatal petroleira PDVSA - fonte de 96% da receita do país - e congelou contas e ativos venezuelanos, cujo controle entregou a Guaidó. Diante da tensão na Venezuela, os preços do petróleo subiam nesta quarta-feira.
Maduro contra-atacou no campo judiciário. O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), de orientação governista, proibiu Guaidó de deixar o país e congelou suas contas, a pedido do procurador-geral, o chavista Tarek William Saab.
Diante disso, John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional do presidente Donald Trump, reiterou que qualquer tentativa de causar danos a Guaidó acarretará "sérias consequências".
Presidenciais não, parlamentares sim
A ofensiva de Guaidó prosseguirá com uma grande manifestação no sábado, quando se completam 20 anos da "revolução bolivariana" fundada pelo falecido líder socialista Hugo Chávez (1999-2013).
Essa mobilização apoiará, segundo Guaidó, o prazo de oito dias - que vence no domingo - dado a Maduro por Espanha, França, Alemanha, Reino Unido, Holanda e Portugal para que aceite "eleições livres" sob pena de reconhecer o opositor como presidente encarregado.
O chanceler francês, Jean-Yves Le Drian, destacou que ministros das Relações Exteriores do bloco vão se reunir na quinta-feira em Bucareste "para falar sobre os passos seguintes a dar diante da não resposta de Maduro".
Maduro disse à RIA Novosti não estar disposto a convocar eleições presidenciais, mas afirmou que uma antecipação das parlamentares - agendadas para 2020 - sim "seria uma boa solução" para a crise "através do voto popular".
Guaidó se autoproclamou depois que o Congresso declarou Maduro "usurpador" por assumir em 10 de janeiro um segundo mandato que considera ilegítimo - assim como grande parte da comunidade internacional - por ser resultado de eleições "fraudulentas".
Embora suas decisões sejam consideradas nulas pelo TSJ, que o declarou em desacato, o Congresso nomeou nesta terça-feira "representantes diplomáticos" em uma dezena de países que reconheceram Guaidó como presidente interino.
Maduro se diz disposto a discutir "pessoalmente" com Guaidó e inclusive com Trump. Mas Guaidó reiterou que não se prestará a "diálogos falsos".