A União Europeia teme que a estratégia do governo americano de reconhecer o líder opositor venezuelano Juan Guaidó como presidente, mesmo sem controlar de fato o território e as instituições do país, abra um precedente perigoso no direito internacional. A opinião é de Rubens Barbosa, ex-embaixador brasileiro nos EUA.
O que representa a decisão de países europeus de reconhecer Juan Guaidó como presidente interino?
Não foi unânime e tem uma série de implicações. Alguns países não quiseram reconhecê-lo porque seria uma interferência interna. Os europeus criaram um grupo de contato internacional e farão uma reunião no dia 7, no Uruguai, com países que não estão de acordo com o reconhecimento de um Estado paralelo. Reconheceram Guaidó como presidente autoproclamado, mas não endossaram nenhuma sanção. O que está por trás dessa decisão é que eles não querem estabelecer precedentes. Itália e Espanha têm movimentos independentistas e eles não querem que outros países reconheçam qualquer governo paralelo. Além disso, a crise da Venezuela se internacionalizou. EUA, Rússia, UE e China, pela primeira vez, estão envolvidos numa questão latino-americana, marginalizando países importantes, até mesmo o Brasil. Países da região poderiam ter tido papel importante para solucionar essa crise.
A UE pediu a Maduro que conduza a Venezuela a novas eleições. Os EUA querem derrubar Maduro. É um detalhe, mas é uma diferença relevante. E o Grupo de Lima endossou a posição americana.
Essa diferença política entre EUA e UE se reflete também no campo econômico?
Os EUA impuseram sanções, mas os europeus ainda não se pronunciaram sobre isso. Há precedentes de direito internacional muito complicados. O fato de você reconhecer um governo - o que a Europa não fez, mas os Estados Unidos, sim - quebra um princípio de direito internacional que diz que um governo só pode ser reconhecido com controle do território. Os EUA querem pagar o petróleo a Guaidó. É um precedente que a Europa está vendo com preocupação. Se isso prevalece, daqui a pouco pagam o governo dos bascos, por exemplo. É uma coisa delicada que os EUA estão fazendo, porque coloca em risco a segurança jurídica internacional.
A pressão internacional sozinha pode surtir efeito?
Até agora, essa pressão não cindiu nem as Forças Armadas nem as milícias. Só um general rompeu com o governo. E tem mais de 20 mil agentes cubanos aconselhando Maduro sobre segurança interna. Isso é muito grave. Sem uma reação interna muito forte, vai ser muito difícil a elite política chavista se virar contra Maduro.
Existe um paralelo entre essa crise e outros casos nos quais a entrada de ajuda humanitária foi combinada com algum tipo de intervenção, como na Líbia ou nos Bálcãs?
Não, mas fico me perguntando como essa entrega vai ser feita. Os remédios serão colocados na fronteira? Se Maduro não permitir, como ela vai entrar? Mas é importante ressaltar que, tirando os EUA, nenhum país da região cogita uma intervenção militar. O vice-presidente (do Brasil) Mourão, descartou isso publicamente.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.