Agência Estado
postado em 07/02/2019 08:33
Enquanto a oposição venezuelana acertava com aliados internacionais a entrega de ajuda humanitária na Venezuela para pressionar as Forças Armadas a romper com o presidente Nicolás Maduro, o chavismo reforçou nesta quarta-feira, 6, a segurança em pelo menos um posto de fronteira no Estado de Táchira, na fronteira com a Colômbia.
Segundo analistas de dentro e de fora da Venezuela, a iniciativa é a segunda etapa da estratégia da oposição, articulada com os Estados Unidos, para provocar cisões entre os militares chavistas e derrubar o presidente Maduro.
"A primeira etapa dessa estratégia foi asfixiar as importações venezuelanas com as sanções ao petróleo, que atingem os negócios dos generais", diz o professor de relações internacionais da ESPM Leonardo Trevisan. "Na segunda etapa, os militares, que controlam a fronteira e não participam dos negócios da cúpula, olham para situação e pensam: 'vamos deixar entrar remédios.'"
Ao longo de seu governo, Maduro hipotecou áreas do governo e de empresas estatais para os generais. Hoje, o Exército controla a distribuição de alimentos importados dentro do país e chefia a estatal perolífera PDVSA, responsável por 96% da receita em dólares do Estado venezuelano, além de denúncias de envolvimento com narcotráfico e contrabando.
Com isso, a cúpula militar segue fiel a Maduro, apesar de relatos de insatisfação, principalmente entre o baixo oficialato, que sofre mais com a hiperinflação e a escassez. São os soldados que trabalham na fronteira que são o alvo das investidas do líder opositor, Juan Guaidó, que se declarou presidente interino no mês passado após a Assembleia Nacional, de maioria opositora, considerar a eleição que reelegeu Maduro fraudulenta.
"Uma nova ordem às Forças Armadas: que permitam o ingresso de ajuda humanitária para atender a suas famílias que certamente precisam de alimentos e remédios", afirmou Guaidó.
O impasse é agravado pelo fato de a oposição não controlar nenhuma parte do território venezuelano. "A abordagem da oposição e dos EUA é uma estratégia intervencionista, que fere princípios de direito internacional", acrescenta Trevisan.
"A Guerra dos Bálcãs e a da Síria deixaram isso claro: é muito difícil fazer a distinção entre um corredor humanitário e uma intervenção militar. E, quando o corredor é utilizado, há uma tendência de que isso ocorra sob a égide da ONU."
Ainda não está claro, no entanto, o nível de coesão das Forças Armadas, nem seu grau de lealdade a Maduro. Apenas um general e um coronel romperam publicamente com o governo nos últimos dias.
"O problema é que o Exército é uma caixa-preta. Ninguém sabe o que acontece lá dentro", avalia Luis Vicente León, do Instituto Datanálisis, sobre as chances de cisão militar. "A oposição tenta com as sanções e com a oferta de ajuda provocar o governo: ou aceita a ajuda ou impede à força sua entrada, provocando os Estados Unidos."
Para o coordenador da área internacional do partido de oposição Voluntad Popular, Manuel Avendaño, a entrada de ajuda servirá para medir o grau de lealdade dos generais a Maduro. A resposta, disse ele ao jornal O Estado de S. Paulo, virá ainda esta semana.
Nesta quarta, militares fecharam a passagem na ponte de Tienditas, que liga as cidades de Cúcuta, na Colômbia, e Ureña, na Venezuela, com o auxílio de uma cerca improvisada e de carrocerias de caminhões. Maduro nega a possibilidade de aceitar ajuda internacional, considerando-a uma "desculpa" para iniciar uma intervenção militar.
Entidades de ajuda humanitária, como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, pediram nesta quarta que a entrega de alimentos e remédios não seja politizada pelos envolvidos na crise. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.