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Itália sob pressão

Órgão executivo da União Europeia recomenda a abertura de procedimento por deficit excessivo contra governo de coalizão, ao desrespeitar o limite da dívida pública, de 132,2% do PIB. Premiê não descarta renúncia, e ministro do Interior desafia bloco

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 06/06/2019 04:05
Matteo Salvini, ministro do Interior da Itália
Com 62,2 milhões de habitantes e um governo eurocético e nacional-populista, a Itália detém a terceira maior economia da zona do Euro e uma dívida pública que levou a Comissão Europeia ; órgão executivo da União Europeia (UE) ; a recomendar a abertura de um processo de infração contra Roma. Enquanto o nível da divida italiana em 2018 atingiu 132,2% do Produto Interno Bruto (PIB), o patamar fixado pelas regras europeias é de 60%. De acordo com o jornal La Repubblica, a dívida italiana equivale a 38.400 euros (cerca de R$ 167 mil) por cidadão, além de mil euros para cada um, a título de refinanciamento. ;A Comissão Europeia concluiu que a Itália não respeita o critério da dívida e que um procedimento por deficit excessivo é justificado;, declarou Pierre Moscovici, comissário europeu para Assuntos Econômicos. ;Cabe agora aos Estados-membros se expressarem. É claro que estaremos sempre dispostos a levar em consideração novos dados. Minha porta sempre fica aberta;, acrescentou.

A decisão da UE intensifica a pressão sobre o governo de coalizão formado pela Liga; do ministro do Interior, Matteo Salvini; e do vice-premiê e líder do Movimento Cinco Estrelas (M5S), Luigi Di Maio. De orientação eurocética, a Liga pode dificultar um acordo com a UE para o pagamento e a redução da dívida. O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, não descarta renunciar caso a polêmica se estenda.

Por sua vez, Salvini indicou exatamente o contrário, minando as esperanças de uma solução a curto prazo. Na semana passada, ele desafiou a UE, ao questionar ;quem é mais obstinado;, caso Bruxelas coloque em xeque suas políticas econômicas. ;Os cortes, as sanções e a austeridade aumentaram a dívida, a pobreza, a precariedade e o desemprego. Devemos fazer o oposto;, defendeu o ministro do Interior e homem forte do governo de coalizão. Segundo ele, a redução da dívida equivale a ;diminuir impostos;.

Em entrevista ao Correio, o italiano Flavio Chiapponi ; cientista político especialista em populismo e professor da Universidade de Pavia ; disse acreditar que a União Europeia alertou corretamente a Itália sobre a dívida nacional. ;Isso vai desencadear nova arma polêmica nas mãos da Liga, que tecerá novamente a narrativa dos pobres italianos acorrentados e escravizados pelos burocratas de Bruxelas;, afirmou. ;Dessa vez, as coisas são muito sérias, e talvez possam danificar o governo de coalizão com o M5S (do comediante Beppe Grillo). Mas isso pode ser usado em um tipo de espetáculo da Liga. O tempo dirá.;

Para Chiapponi, apesar de a Liga ser contrária à UE, uma solução é crucial para o impasse entre Roma e o bloco. ;Lembre-se de que os políticos e as bases da Liga são pragmáticos e não muito distantes do compromisso político, a fim de preservarem os seus postos no governo;, comentou. Moscovici advertiu que, ;em vez de ser reduzida, a dívida pública da Itália, que representa um fardo para a economia, aumentou ainda mais em 2018;. A Comissão Europeia para Assuntos Econômicos não descarta que a dívida, hoje em 132,2% do PIB, suba para 133,7% até o fim deste ano e alcance os 135,7% em 2020. Os ministros das Finanças da UE devem decidir sobre iniciar o procedimento por deficit excessivo. Em longo prazo, isso pode implicar sanções de até 0,2% do PIB, ou 3,5 bilhões de euros (em torno de R$ 15 bilhões).

Caso os ministros acatem a recomendação, a Comissão Europeia e a Itália deverão encampar um diálogo complexo. Luigi Di Maio, vice-premiê e líder do M5S, espera um debate com ;responsabilidade;, apesar de reclamar que ;todos os dias há um novo motivo para falar mal da Itália;. O chefe do Partido Democrata (oposição), Nicola Zingaretti, colocou lenha na fogueira. ;A Europa confirma o que sabíamos: em 12 meses, a dívida aumentou, o crescimento diminuiu, e os italianos estão em perigo, uma obra-prima.;


"Os cortes, as sanções e a austeridade aumentaram a dívida,
a pobreza, a precariedade e o desemprego. Devemos fazer o oposto;

Matteo Salvini, ministro do Interior da Itália



Eu acho...

;As coisas estavam ruins antes mesmo das eleições para o Parlamento Europeu e o sucesso da Liga no pleito. Agora, ficaram piores, pois a Itália se coloca sozinha contra uma União Europeia impulsionada por Alemanha e França.;

Flavio Chiapponi, cientista político especialista em populismo e professor da Universidade de Pavia

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