postado em 10/06/2019 04:05
Durante meses, a expectativa dos observadores do cenário político europeu foi por uma forte arrancada dos populistas de direita, ultranacionalistas e eurocéticos nas eleições para renovação do Parlamento Europeu, encerradas no último domingo de maio. Mas, abertas as urnas, a imagem que ganhou as telas e os telões, nos comitês de campanha, foi a de uma maré verde. As listas, movimentos e partidos do campo ecologista saíram-se melhor que o esperado em alguns dos principais 28 países-membros da União Europeia (UE). Na Alemanha, seu ;quartel-general;, ficaram em segundo lugar, não muito atrás da democracia cristã. Mas, mesmo no Reino Unido, onde o vencedor foi o novo Partido do Brexit, a surpresa ficou por conta dos verdes, que superaram o Partido Conservador, da premiê Theresa May ; e, por muito pouco, deixaram de tomar dos trabalhistas a terceira colocação.
;Seis meses ou um ano atrás, a projeção era de que nós perderíamos cadeiras;, comemorou, em Dublin, o recém-eleito eurodeputado Ciarán Cuffe, o primeiro parlamentar enviado a Estrasburgo pela capital irlandesa em duas décadas. Ele se confessou ;comovido; pela resposta dos eleitores ao tema das mudanças climáticas, que ganharam forte espaço na mídia europeia e mobilizaram, principalmente, o eleitorado jovem.
Cuffe identifica nessa faixa etária não apenas o grande reservatório direto de votos para a coalizão verde europeia, mas também a força motriz de uma campanha capilarizada e silenciosa, feita à base do antigo ;boca a boca; entre grupos sociais determinados. ;Nas últimas semanas, muita gente me contou, em pessoa, que votaria nos nossos candidatos, porque os filhos tinham pedido. Isso é algo que eu nunca tinha visto antes;, admira-se o novo parlamentar do bloco continental.
Com um total de 69 cadeiras, entre as 751 que compõem o Parlamento Europeu, os verdes chegam a Estrasburgo para a nova legislatura, no mês que vem, com a quinta maior bancada. Mas a nota para os próximos quatro anos será a fragmentação. Os partidos de centro-direita e centro-esquerda, que dominam há décadas o Legislativo da UE, em uma espécie de condomínio, perderam a maioria. Terão de procurar alianças para aprovar propostas e, mais importante, as indicações-chaves para o comando da UE: as presidências da Comissão Europeia (CE, braço executivo do bloco), do Conselho Europeu e do Banco Central Europeu.
Os dois grupos vistos como prioritários para negociações são os liberais e os ecologistas, cujo contingente é pouco menor que o dos populistas e eurocéticos, porém mais coeso e focado na própria agenda. ;Os verdes podem se tornar o fiel da balança nesse processo;, comenta Agata Gostynska-Jakubowska, analista sênior do Centro Europeu para a Reforma. De início, apresentarão para a CE o nome da sua candidata principal, Ska Keller, embora sem a expectativa de emplacar. ;Mas vamos ver muito candidato (aos cargos em aberto) se mostrando cada vez mais ecológico;, ironiza.
Encruzilhada
O sucesso inesperado nas eleições europeias traz embutido para o grupo parlamentar ecologista o desafio de administrar a euforia e o dilema de participar da política efetiva ; algo novo para a maior parte das legendas nacionais que integram o bloco. ;Estamos muito felizes, mas isso nos traz responsabilidades: as pessoas não votaram em nós apenas como protesto;, ponderava o eurodeputado alemão Terry Reintke, no embalo dos 20,5% conquistados no país, um recorde para os Verdes (o nome oficial do partido) em uma votação de escala nacional. A legenda foi a mais votada nas grandes cidades, como Berlim, Hamburgo, Colônia, Stuttgart e Munique, mas manteve o padrão de resultados bem inferiores nas cidades menores e nos estados do leste, que penderam para a direita populista.
;Os Verdes dominam uma parte da sociedade;, analisa uma reportagem do Tagesspiegel, jornal da capital alemã, onde a legenda chegou perto de 28%. ;Eles são o partido de quem tem formação mais elevada e renda mais alta nas cidades grandes e nos centros universitários;, prossegue o texto. ;Mas dois terços dos alemães vivem em cidades pequenas e médias, com menos de 100 mil habitantes.;
A distribuição geográfica da bancada verde no Parlamento Europeu (veja mapa) expõe outra fragilidade. ;Eles foram bem na Europa Ocidental, principalmente na Alemanha, na França, no Reino Unido e na Irlanda;, aponta Sara Hobolt, professora de política europeia na prestigiada London School of Economics. ;Mas não chegam a ser um fenômeno continental, como os populistas, e praticamente não existem na Europa Central e Oriental.;
;Nós temos partidos nacionais na maioria dos países-membros (da UE), mas no leste eles não conseguem a votação necessária para eleger parlamentares;, admite o eurodeputado alemão Reintke. ;Nos próximos anos, precisamos pensar em como fortalecer essa área.;