Agência Estado
postado em 18/06/2019 11:03
O Irã deu um ultimato para voltar a enriquecer urânio acima do teor estipulado pelo acordo nuclear de 2015, rompido pelos EUA no ano passado, mas honrado por potências europeias. O país tem aumentado o enriquecimento de urânio a 3,67% para produzir energia elétrica e quer elevar o patamar para 20%, um passo que o coloca mais perto da fabricação de uma bomba. A ameaça é uma tentativa de forçar a Europa a evitar as sanções impostas ao país pelos americanos, mas analistas afirmam que a estratégia é arriscada."O estoque de urânio enriquecido do Irã ultrapassará, no dia 27, o limite estabelecido pelo acordo nuclear assinado com as principais potências globais em 2015", disse Behrouz Kamalvandi, porta-voz da Organização Iraniana de Energia Atômica. "Ainda há tempo de os países europeus agirem. Se eles cumprirem seu compromisso, as coisas voltarão à situação original."
O acordo nuclear obriga Teerã a manter no máximo 300 quilos de urânio enriquecido a 3,67% e a vender o excedente para que não possa construir uma arma nuclear. O urânio pouco enriquecido serve para geração de energia e em 20% para uso medicinal. Para fins bélicos, o urânio precisa ser altamente enriquecido, acima de 90%.
Depois que os EUA abandonaram o acordo, reimplementaram as sanções e impediram a Europa de negociar com o Irã e Teerã mudou sua estratégia. O anúncio ocorre em um momento de extrema tensão entre EUA e Irã, depois que o governo de Donald Trump acusou Teerã de atacar dois petroleiros no Estreito de Ormuz, região por onde passa 20% de todo o petróleo comercializado no mundo. Teerã nega envolvimento nos ataques.
Ao reagir ao anúncio, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, Garret Marquis, acusou Teerã de "chantagem nuclear". "Os planos de enriquecimento do Irã só são possíveis porque o acordo nuclear o deixou com as capacidades intactas", disse Marquis. "Trump deixou claro que nunca permitirá que o Irã desenvolva armas atômicas. França e Alemanha lamentaram nesta segunda-feira, 17, a decisão iraniana e disseram que o acordo ainda pode ser salvo.
Para analistas, as medidas anunciadas por Teerã podem não ter o efeito esperado. "As nações europeias que participam do acordo, Reino Unido, França e Alemanha, já estavam buscando estratégias para negociar com o Irã, como a criação de um sistema de trocas comerciais, para evitar o sistema financeiro americano", afirmou Ali Vaez, diretor do projeto do Irã do International Crisis Group.
"O Irã pode ser um país poderoso no Oriente Médio, mas suas opções para pressionar os EUA e seus aliados europeus são poucas. Suas duas melhores opções são deixar de cumprir os termos do acordo e ameaçar interromper o comércio global de energia fechando o Estreito de Ormuz", afirmou Olli Heinonen, da Escola Kennedy de Governança, em Harvard, e ex-chefe de inspeção da Agência Internacional de Energia Atômica. "Eles estão usando os recursos que têm para promover seu poder de negociação. Mas o tiro pode sair pela culatra, com mais sanções e um conflito."
A pressão econômica sobre Teerã aumentou com as sanções de Trump. As exportações de petróleo do Irã caíram de 2,5 milhões de barris por dia, em abril de 2018, para 400 mil barris por dia, em maio deste ano. Um efeito colateral das pressões foi exatamente a incapacidade de cumprir alguns pontos do acordo.
Até agora, os iranianos enviaram a maior parte do urânio de baixo enriquecimento que produz para fora do país, trocando-o por urânio natural. Isso permite que eles produzam quantidades de combustível nuclear sem obter um estoque que possa ser usado em um programa de armas. "O Irã estava realmente revendendo o urânio enriquecido que dispunha e trocando por urânio natural, sem fabricar uma arma. Agora, está mais difícil fazer isso", disse Heinonen.
Segundo ele, o Irã poderia enriquecer urânio suficiente para uma arma nuclear entre seis e oito meses, se acelerar seu programa, pois a fase crítica da obtenção de urânio para armas nucleares já foi superada. "A pressão máxima de Trump obrigou os iranianos a partirem para o ataque. Eles têm a tecnologia de enriquecimento e podem criar mais centrífugas. Provavelmente, serão capazes de resistir a muitas sanções."