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Irã derruba drone dos EUA e eleva tensão

Trump aponta "erro imenso" de Teerã e duvida de ato intencional, horas após aeronave não tripulada ser atingida sobre o Estreito de Ormuz. Teerã denuncia na ONU "ação provocadora" contra integridade territorial e promete reagir a qualquer invasão

postado em 21/06/2019 04:17
Trump com Mike Pompeo (C) e John Bolton (D), defensores de ação militar para derrubar a República Islâmica


Exatamente uma semana depois de ser acusado de atacar dois petroleiros no Mar de Omã, o Irã elevou a tensão no Oriente Médio ao anunciar a derrubada de um drone dos Estados Unidos. ;A violação das fronteiras iranianas é a linha vermelha que não deve ser ultrapassada. Nossa reação é e será categórica e absoluta;, advertiu o general de divisão Hosein Salami, comandante em chefe dos Guardiões da Revolução, o exército ideológico iraniano. Teerã insiste que o avião não tripulado RQ-4A Global Hawk (veja arte), avaliado em US$ 110 milhões, invadiu o seu espaço aéreo e denunciou nas Nações Unidas uma ;ação provocadora; e ;muito perigosa; contra a sua integridade territorial.

Em carta enviada ao Conselho de Segurança, o embaixador iraniano Majid Takht Ravanchi afirmou que o drone estava em ;clara operação de espionagem;. ;Embora a República Islâmica do Irã não busque a guerra, reserva seu direito inerente (...) de tomar todas as medidas que sejam necessárias contra qualquer ato hostil de violação de seu território.;

Quase 11 horas depois do ataque, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tuitou: ;O Irã cometeu um erro imenso!” Mais tarde, ao receber na Casa Branca o premiê canadense, Justin Trudeau, o magnata foi questionado sobre como responderia à agressão. ;Vocês descobrirão em breve;, respondeu. Mas, amenizou a retórica, ao atribuir a derrubada do drone a ;um erro;. ;Acho dificil acreditar que tenha sido intencional. Eu acho que o Irã, provavelmente, cometeu um erro. Eu imaginaria que foi um general ou alguém que cometeu um erro ao abater o drone. Pode ter sido alguém burro ou que agiu por conta própria;, opinou, ao qualificar o incidente de ;uma nova rusga, uma nova mosca na sopa;.

Trump manteve reuniões com o vice, Mike Pence; o secretário de Estado, Mike Pompeo; e o conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton. Alguns assessores recomendaram contenção, enquanto outros defenderam que os EUA deveriam infligir uma ;dor severa; a Teerã. O presidente enviou representantes ao Congresso para atualizarem as lideranças republicanas e democratas. Há temor no Capitólio sobre uma ação militar unilateral. O acirramento da crise ocorreu 48 horas após Trump lançar a campanha à reeleição.

Dissuasão

;Os iranianos enviaram uma mensagem poderosa de dissuasão aos Estados Unidos, e isso estará nas mentes dos generais e dos congressistas americanos, ao examinarem possível retaliação;, explicou ao Correio Ali Mourad, pesquisador libanês especialista em assuntos do Golfo Pérsico. Apesar de achar pouco plausível, ele não descarta que Washington avise ao Irã sobre os alvos antes de um bombardeio. ;Depois que os iranianos divulgaram vídeo mostrando o momento em que o míssil atingia o drone, os americanos foram informados de que o sistema de defesa usado não foi o russo S-300. Os EUA e Israel estavam preocupados com a posse de tecnologia militar avançada por parte do Irã, capaz de derrubar aeronaves muito caras.;

O iraniano Alex Vatanka, especialista do Middle East Institute (em Washington), questiona se a política da Casa Branca em relação ao Irã estaria devotada a alcançar uma meta principal, como a mudança de regime em Teerã. ;Temos visto etapas desarticuladas e que, provavelmente, vão contra objetivos geopolíticos mais amplos. A mudança das prioridades geopolíticas dos EUA, com a ascensão da China e seus impactos nos interesses de Washington no Oriente Médio, contribui para uma posição hesitante de Trump em termos de ações contra o Irã.;

Vatanka lembra que Pompeo e Bolton defendem a derrubada da República Islâmica. ;O cisma no gabinete de Trump não foi testado, mas sinais de profunda divergência se recusam a sumir.; Para o iraniano, Trump é politicamente orientado. ;A popularidade eleitoral a curto prazo e o apoio dos doadores republicanos são mais importantes do que avançar nos interesses de segurança nacional.;


;Acho difícil acreditar que tenha sido intencional. Eu acho que o Irã provalmente cometeu um erro. Eu imaginaria que foi um general ou alguém que cometeu um erro ao abater o drone. Pode ter sido alguém burro ou que agiu por conta própria;
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos


;A violação das fronteiras iranianas é a linha vermelha que não deve ser ultrapassada. Nossa reação é e será categórica e absoluta;
General de divisão Hosein Salami, comandante em chefe dos Guardiões da Revolução Iraniana


Petróleo dispara
O acirramento das tensões entre Irã e EUA levou aumento do preço do petróleo nas principais bolsas. O valor da commodity encerrou o pregão com o maior valor desde 30 de maio. Em Nova York, o preço do barril avançou 5,38%, fechando a US$ 56,65. Em Londres, subiu a 4,66%, totalizando US$ 64,69. A situação despertou temores sobre a oferta de petróleo. Isso porque cerca de 20% do óleo consumido no mundo passa pelo Estreito de Ormuz e o Irã ameaça bloquear a rota dos exportadores árabes.


Pontos de vista

Por Rockford Weitz

Planejamento
para a guerra


;Trump deu espaço para evitar uma escalada militar, ao atribuir o disparo contra o drone a um erro cometido por algum iraniano. Os militares americanos conduziram um amplo planejamento para se preparar ante qualquer tipo de conflito bélico com o Irã. É muito prematuro prevermos que tipo de retaliação militar poderia ocorrer. No entanto, qualquer confronto armado maior causaria mais instabilidade no mercado do petróleo, nas bolsas de valores regionais e nas relações diplomáticas.;

Diretor de Estudos Marítimos da Universidade de Tufts, em Massachusetts (EUA)


Por Alex Vatanka

Articulação
incoerente


;Embora estivesse claro, desde o início, que a questão do Irã seria um teste central da política externa de seu governo, Donald Trump ainda precisa articular plenamente uma estratégia confiável e coerente. O presidente republicano se opõe a uma guerra contra o Irã e está disposto a se reunir com autoridades de Teerã. A Casa Branca pediu à Embaixada da Suiça, em Teerã, o repasse aos iranianos dos números de telefone diretos de contato com Trump para o lançamento de negociações.;

Especialista em segurança no Oriente Médio e em Irã do Middle East Institute (em Washington)


Por Ali Mourad

Armadilha
calculada


;Parece que os iranianos conseguiram empurrar Trump para a armadilha da incapacidade de agir contra o Irã. Ao derrubar o drone, o Irã estaria indo ao extremo, sabendo que Trump não está em posição de confrontá-lo militarmente. A tensão está em alto nível, mas esses incidentes talvez sejam o primeiro passo rumo a um compromisso. O Irã sabe exatamente o que machuca Trump e até onde o americano pode ir com a reação. Não há guerra no horizonte, mas a duração da escalada de tensão é desconhecida.;

Pesquisador freelancer libanês especialista em assuntos do Golfo Pérsico




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