A revelação de que o presidente norte-americano, Donald Trump, ordenou um ataque retaliatório ao Irã e abortou a operação, 10 minutos antes de seu início, foi recebida com ceticismo e com desconfiança, tanto por especialistas quanto pelos conselheiros do republicano. Em uma série de quatro tuítes publicados por volta das 9h de ontem (10h em Brasília), Trump causou surpresa ao comentar a derrubada do drone RQ-4A Global Hawk, na madrugada de quinta-feira. ;Eles abateram um drone não tripulado sobrevoando águas internacionais. Nós engatilhamos e nos carregamos (de armamentos) para retaliar na última noite, em três pontos, quando perguntei quantos morreriam. ;150 pessoas, senhor;, foi a resposta de um general. Dez minutos antes do ataque eu o abortei;, escreveu. Segundo Trump, o bombardeio não seria ;proporcional; à derrubada de uma aeronave não tripulada. ;Não tenho pressa, nosso Exército está reconstruído, novo e pronto para agir, de longe o melhor do mundo. As sanções são mais mordazes e adicionamos outras na noite passada;, completou. Segundo o jornal The New York Times, os alvos dos EUA seriam ;radares e baterias de mísseis;.
Mais tarde, em entrevista à emissora NBC News, o presidente mudou a versão sobre o bombardeio iminente e disse que não tinha dado a aprovação final. ;Não havia luz verde até o fim, porque as coisas mudam;, explicou. Os ruídos de informação causaram incômodo no Congresso, tanto que a presidente da Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, negou ter recebido qualquer aviso sobre uma suposta operação militar, que deveria necessariamente passar pelo crivo do Capitólio. ;Nós estamos em uma situação extremamente perigosa e sensível com o Irã. Nós devemos calibrar a resposta que reduza (a tensão) e avance os interesses americanos, e devemos saber com clareza sobre quais são esses interesses;, declarou. ;Os líderes democratas enfatizaram que hostilidades não devem ser iniciadas sem a aprovação do Congresso.; A Casa Branca solicitou ao Conselho de Segurança da ONU uma reunião a portas fechadas para debater a crise com o Irã. O encontro deve ocorrer na segunda-feira.
A menção à imposição de novas sanções no tuíte de Trump também causou estranheza. O Departamento do Tesouro dos EUA não mencionou qualquer nova penalidade contra Teerã. Ontem, o regime iraniano divulgou imagens dos supostos destroços do drone, avaliado em US$ 110 milhões (ou R$ 422 milhões). ;Os destroços flutuantes foram recuperados pelas forças navais e transferidos para Teerã;, comentou o general de brigada Amirali Hajizadeh, chefe da força aeroespacial da Guarda Revolucionária. De acordo com ele, foram emitidos dois sinais de advertência, que teriam sido ignorados pelo drone antes do disparo do míssil ;3-Khordad;, a partir de uma bateria móvel. Hajizadeh relatou que um avião militar norte-americano P-8 Poseidon, com 35 tripulantes a bordo, estava na mesma região e poderia ter sido atingido.
Confusão
Para o iraquiano Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York e especialista sobre Oriente Médio, a sequência de eventos descrita por Trump nos tuítes não é passível de credibilidade. ;Trump não tinha a intenção real de atacar o Irã. Sugerir que ele mudou de ideia apenas 10 minutos antes de o ataque ocorrer é algo sem sentido. Trump é um mestre na arte de enviar mensagens confusas, e esta é uma delas;, disse ao Correio.
Por sua vez, o pesquisador freelancer libanês Ali Mourad, também expert em temas do Golfo Pérsico, apontou falta de credibilidade na história contada pelo republicano. ;Ela ignora o funcionamento da inteligência militar. A informação de um ataque iminente deveria ter sido incluída nos relatórios da Agência de Inteligência de Defesa (DIA) e repassada posteriormente ao Pentágono, antes da tomada de decisão sobre o início de uma campanha militar. Não se sabe como a Casa Branca tomou conhecimento, antes mesmo de decidir pelo ataque a instalações militares, que 150 pessoas morreriam.; Diretor do Projeto Irã do International Crisis Group (ICG), em Washington, Ali Vaez afirmou crer que Trump deseja evitar o ;tropeço de uma guerra sem sentido no Oriente Médio;. ;Os conselheiros do presidente têm gradualmente o incitado na direção do confronto;, advertiu.
Eu acho...
;Essa história de um bombardeio abortado em apenas 10 minutos foi vazada para a imprensa com o proprósito de reduzir a indignação dos norte-americanos. Isso porque o prestígio militar dos Estados Unidos foi humilhado, ante o fato de que o presidente Donald Trump está impossibilitado de retaliar, por temer uma dramática escalada de tensão em uma guerra contra o Irã.;
Ali Mourad, pesquisador freelancer libanês especialista em assuntos do Golfo Pérsico
TUITADAS
;Eles abateram um drone não tripulado sobrevoando águas internacionais. Nós engatilhamos e carregamos para retaliar na última noite, em três pontos, quando perguntei quantos morreriam. ;150 pessoas, senhor;, foi a resposta de um general. Dez minutos antes do ataque eu o abortei.;
;Não seria algo proporcional à derrubada de um drone não tripulado. Não tenho pressa, nosso Exército está reconstruído, novo e pronto para agir, de longe o melhor do mundo. As sanções são mais mordazes e adicionamos outras na noite passada. O Irã nunca pode ter armas nucleares, não contra os EUA, e não contra o mundo!”
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos
Diplomacia e tensão
Conversa com o príncipe saudita
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohamed bin Salman (foto), conversaram ontem sobre a ;ameaça; representada pelo Irã, informou a Casa Branca. ;Os dois líderes discutiram o papel crucial da Arábia Saudita em garantir a estabilidade no Oriente Médio e no mercado petroleiro mundial. Também debateram a ameaça representada pelo comportamento do regime iraniano;. Na quarta-feira, Agnes Callamard ; relatora especial da Organização das Nações Unidas para assassinatos extrajudiciais, sumários ou arbitrários ; admitiu evidências críveis do envolvimento de Bin Salman no assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi, em 2 de outubro, dentro do consulado do reino em Istambul.
Companhias aéreas mudam rotas
A Emirates Airlines decidiu, ontem, redirecionar todos os voos para longe de ;áreas de possível conflito;. Na noite de quinta-feira, a Administração Federal de Aviação dos Estados Unidos também tinha criado uma zona de exclusão aérea ao longo do Golfo Pérsico, do Estreito de Ormuz e do Mar de Omã, próximo à costa do Irã. A United Airlines suspendeu a rota entre Newark (Nova Jersey) e Mumbai (Índia). A alemã Lufthansa deixará de sobrevoar partes do Irã. A Malaysia Airlines evitará o espaço aéreo sobre o Estreito de Omã em seus voos entre Londres, Jidá e Medina. Outras companhias aéreas, como a holandesa KLM, a australiana Qantas e a British Airways, anunciaram medidas em suas operações ante a ameaça de mísseis.
Protesto por mudança de regime
Iranianos radicados nos EUA participaram de marcha, em Washington, na qual pediram a Trump o ;reconhecimento do direito do povo do Irã à mudança de regime; em Teerã. Os ativistas carregaram balões amarelos, a bandeira do Irã, fotos de prisioneiros políticos e cartazes nas quais expuseram outras demandas. ;Designem o Ministério de Inteligência do Irã como uma organização terrorista; e ;Reconheçam o Conselho Nacional de Resistência do Irã como a alternativa ao regime;, afirmavam os textos em alguns dos cartazes. A manifestação teve o ponto alto diante da Casa Branca (foto).
Índia envia navios de guerra
A Marinha da Índia decidiu enviar ao Mar de Omã dois navios de guerra que terão o objetivo de proteger as embarcações do país na região. O destroier INS Chennai e o barco de patrulha INS Sunayna ;foram despachados para o Golfo de Omã e o Golfo Pérsico para realizar operações de segurança marítimas;, explicou um comunicado. A operação ganhou o nome de Sankalp (;Determinação;, em hindi). Com 7.500t, o INS Chenai é um dos mais novos e poderosos navios da Marinha indiana, e carrega mísseis terra-terra e terra-ar, além de lança-foguetes e torpedos.