postado em 18/07/2019 04:05
Donald Trump nada parece intimidado com a aprovação, por parte da Câmara dos Representantes, de uma resolução condenando sua ofensiva contra quatro deputadas congressistas de ascendência estrangeira. O presidente norte-americano prosseguiu com a tempestade de tuítes racistas direcionados a Alexandria Ocasio-Cortez (AOC, de Nova York), Ilhan Omar (Minnesota), Rashida Tlaib (Michigan) e Ayanna Pressley (Massachusetts). ;Na América, se você odeia seu país, você é livre para partir. O simples fato é que as quatro congressistas pensam que a América é malvada em suas origens, pensam que a América é ainda mais perversa agora, que somos todos racistas e maus;, escreveu, horas antes de retomar a campanha rumo à reeleição, durante discurso em Greenville, na Carolina do Norte.
Ele acusou o quarteto de mover o Partido Democrata ;substancialmente; para a esquerda e de destruí-lo. Apesar da resolução votada na véspera, a Câmara rejeitou, ontem, iniciar um processo de impeachment contra o magnata. Especialistas consultados pelo Correio admitem que os ataques de Trump são uma estratégia arriscada para conquistar votos de parte dos eleitores da oposição em 2020 e para lançar os democratas em uma armadilha política.
;Os tuítes de Trump sugerindo às quatro congressistas progressistas e de minorias que retornem para os países de onde vieram foram desenhados para mobilizar a base republicana, enquanto ele planeja a reeleição;, disse Cal Jillson, professor de ciência política da Universidade Metodista do Sul (em Dallas). Segundo ele, o apelo racista de Trump é uma faca de dois gumes: ele tanto pode contribuir para sua vitória nas urnas como pode fazer com que os eleitores fiquem enojados e rejeitem um novo mandato. ;Se isso ocorrer, os republicanos sabem que todo o partido cairá;, advertiu. Ao nutrir tensões raciais e ideológicas, ele apela somente para a mobilização do eleitorado branco.
Jillson lembrou que, enquanto os republicanos seguem a direita e são esmagadoramente brancos, os democratas têm espectro da esquerda e são mais diversos. Ao comentar a resolução aprovada na noite de terça-feira pelos democratas, o estudioso defende que a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, tire o foco das ofensas de Trump ; ;onde o presidente prospera ; e retome temas importantes, como a assistência à saúde, o qual ajudou os democratas a reconquistarem a maioria na Casa, no ano passado.
Relações
Professor de gestão política da Universidade George Washington, na capital dos EUA, Michael Cornfield explicou que Trump busca deteriorar a relação entre a ala institucional moderada e a esquerda ideológica do Partido Democrata. ;Seus comentários também refletem uma estratégia eleitoral. No entanto, tal artimanha ajuda mais à figura de Trup do que aos republicanos. Isso porque os tuítes também prejudicam a interação com os supremacistas brancos representados pelo presidente, os empresários e os políticos conservadores;, comentou. ;No entanto, vejo uma terceira motivação, além da busca pela reeleição: Trump pretende afastar as atenções da nuvem de escândalos que enfrenta.;
Cornfield entende a política americana como ;um jogo de contrastes;. De acordo com ele, Trump se beneficia quando transmite a ideia de que a face do Partido Democrata é AOC e suas colegas. ;O presidente pode ampliar as arrecadações, aumentar a própria popularidade e continuar a prosperar nas mídias sociais e na TV Fox News. No entanto, com a escolha do candidato democrata, esse benefício tende a desaparecer, e Trump começará a falar sobre temas para acentuar a divisão política;, explicou.
Por sua vez, Joshua Sandman ; especialista em Presidência dos EUA pela Universidade de New Haven (em Connecticut) ; aponta uma armadilha na postura de Trump. ;Quando os democratas defendem o quarteto de congressistas ofendidas por Trump, são vistos abraçando a agenda progressista de esquerda, representada por elas;, disse. Para ele, os democratas têm de criticar o comportamento ;não presidencial; de Trump, ;que tem desonrado a si mesmo, ao gabinete, ao partido e à nação;. ;Os opositores precisam utilizar isso como uma oportunidade de atingir a base eleitoral de Trump, mas têm fracassado nisso.;
Pontos de vista
Por Cal Jillson
Foco nas
eleições
;O presidente Trump pretende transformar as quatro mulheres calouras do Congresso na face do Partido Democrata, ao argumentar que elas são estrangeiras, socialistas e odeiam a América. Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes, a face real do Partido Democrata, deseja que as próximas eleições sejam sobre saúde, educação e infraestrutura, questões reais ; e não sobre quem é mais americano ou quem mais ama a América.;
Professor de ciência política da Universidade Metodista do Sul (em Dallas)
Por Michael Cornfield
Tensão
permanente
;Os partidos estão sempre lutando para conciliar suas alas e sempre há tensão no sistema americano entre o Congresso e a Casa Branca. Então, armadilhas e oportunidades existem para todos. Assim são o nosso sistema político e nossa cultura. Os democratas levam em conta as próprias opiniões, sua relação com a presidência da Câmara dos Deputados (Nancy Pelosi) e suas necessidades eleitorais. Não existe uma solução que sirva para todos.;
Professor de gestão política da Universidade George Washington (em Washington D.C
Por Joshua Sandman
Armadilha
do magnata
;Os tuítes são uma armadilha de Trump. Os democratas devem reagir e deixar claro que estão ofendidos pelos ataques do presidente às colegas. No entanto, também têm de deixar claro que isso não significa que apoiem as opiniões políticas das quatro congressistas. Os democratas precisam atrair os holofotes e declarar: ;Nós discordamos das opiniões políticas delas, mas as defenderemos contra os ataques hostis e vis de Donald Trump;.;
Especialista em Presidência dos Estados Unidos pela Universidade de New Haven (em Connecticut)
Por Ross Baker
Risco para
a oposição
;O democrata que receber a indicação para ser o candidato em 2020 precisará tomar posições populares entre os eleitores mais jovens, porém, impopulares entre os mais velhos, com maior probabilidade de saírem às urnas. Esse candidato terá de manobrar Trump, que continuará a definir armadilhas para os democratas. Trump é um homem cruel e falso, mas é esperto, e conta com apoio sólido de 40% dos eleitores. O apoio crescerá se os democratas tomarem ações imprudentes.;
Cientista político da Universidade Rutgers (em Nova Jersey)